GAIA

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Rígida, estável, austera, Tiana era conhecida por todos na vila como a mais bela, porém mais severa dama, diziam que apesar de estar sempre enfeitada de flores, parecia-se mesmo com a Terra, seus olhos tão castanhos quanto o mais puro cacau, sua pele tão escura quanto o mais fértil solo já visto, diziam até que tivera sido abençoada por Gaia, corpulenta e muito bela, dispertava atenção dos rapazes, mas quem haveria de conquistar o coração de uma dama com tamanha severidade?

Apesar de tudo o que ja houvera passado, jamais havia tido a necessidade de pedir comida, ou mesmo dinheiro, era como se a abundância estivesse sempre ao seu lado e Tiana era grata por isso, tão grata que, em todo solstício ou equinócio a dama ia celebrar e agradecer a Gaia, fazendo-lhe ofertas de frutas, ervas e orações, por muitas luas, nada havia ocorrido a Tiana, ninguém sabia de seus ritos, até aquela Era chegar, a Era das trevas, onde a Deusa foi dada como podre, malévola e perversa, e sobrou somente Deus, foram épocas sombrias àquelas.
Tiana sabia que não deveria mais se expor, mesmo que ninguém à houvesse incomodado até o momento, era acima de tudo racional, preferiu manter a Deusa somente dentro de casa, em lugares ocultos, fazendo-lhe ainda ofertas e orações, mas nada dura para sempre, os guardas chegaram, derrubaram a porta, vasculharam tudo.

- Como pode uma mulher dessas estar só?

- Provavelmente é bruxa.

- Sim! Bruxa! PEGUEM A BRUXA! VAMOS QUEIMA-LA JA!

Tudo piorou quando descobriram as imagens da Deusa dentro de seus aposentos, rasgada, humilhada, estilhaçada, sem nada mais a restando, ainda tinha os belos olhos castanho cacau, sôfregos agora, e quando arrastaram-na para fora de sua casa, quando puseram-na de joelhos, ela soube, e aceitou seu fim, orgulhosa e confortada em saber que a Terra a receberia em seu ventre, fechou os olhos e deixou-se partir, seu sangue gotejou no solo, apenas duas gotas foram o suficiente, Tiana não mais existia na forma física, a Deusa cuidou para que não sentisse nada, mas aqueles homens, aqueles seres imundos aos quais a Deusa havia dado a luz, eles sentiriam a fúria de uma mãe vingativa, o solo começou a tremer, os guardas cederam, o chão se abriu e engoliu um por um, espinhos por todos os lados arranharam suas peles, ervas daninhas causaram alergias horrendas e, pouco a pouco, o solo os sufocou, fechando-se sob seus corpos, o julgamento havia ocorrido e àqueles homens, culpados por ferirem a Gaia viva, sucumbiram ao poder da Terra.

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