parte II

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Futuro

Peter

O som agonizante dos pneus acelerando na rua me deixam acuado perante toda aquela situação. O vermelho do sangue embaça minha visão, a manga do meu casaco não é suficiente para limpar meu rosto porque ela está ainda mais molhada de sangue. Pisco os olhos com agilidade para tentar fazer com que as lágrimas limpem mais rapidamente o sangue.

Laurel me acorda do estado de pânico com um aviso.

- Não podemos ir para sua casa, vamos para minha... sua mãe deve estar lá e nós temos que ter uma historia para contar à policia.

De onde ela conseguia tirar tanta frieza nesse momento? Acompanhei sua orientação levando o veiculo para a direita e seguindo o caminho da casa de Laurel. Assim que estaciono o carro em frente a sua garagem eu caminho em passos rápidos para o gramado e vomito. A bile se mistura ao sangue do Asher, meu corpo ainda elétrico está disparando adrenalina demais e eu não consigo conter. Laurel abre a garagem e joga para mim uma garrafa de agua sanitária e um pano branco.

- Limpa o carro, maçanetas, banco, volante... tudo onde tenha sangue...

Nesse instante ela tira a roupa dela na garagem, ficando apenas de calcinha e sutiã e jogando tudo dentro do cesto de lixo...

- Anda Peter... que demora!

Eu não sabia exatamente oque fazer agora mas segui sua instrução. Limpei a boca com a mão e senti mais sangue ser espalhado pelo meu rosto e mãos. Depositei agua sanitária no pedaço de tecido e comecei a esfregar o carro. Maçanetas, bancos, volante, piso... todos os lugares em que eu enxergava sangue.

Laurel voltou de cabelo molhado e com uma roupa nova, estendeu a mão e pegou os produtos da minha mão.

- Você sabe onde fica o chuveiro, pega as roupas do meu pai.

Eu não conseguia sair do lugar. Os flashes do capacete dele nas minhas mãos retorciam minha mente.

- Oque você fez com o capacete?

- Dei meu jeito...

Meu coração estava acelerado, meus dedos tremiam e eu tentava limpar o sangue seco que sobreviveu nas mangas do meu casaco.

- Anda Peter!! Daqui a pouco os vizinhos chegam....

- Onde estão seus pais?

- E por acaso você não os conhece?

Segui em direção a garagem e fiquei somente de cueca. Não sei oque Laurel vai fazer com a roupa que está no cesto, mas é demais para mim pensar nisso agora.


Agora.

- Eu não vou vestir isso aqui Estela... não insista. - Joguei no chão do banheiro a peça que Estela escolheu para mim. Eu me nego a vestir qualquer uma das ideias malucas dela. -  Quem sabe o Asher vista isso... espera, não... ele despreza cada uma de suas tentativas...

Falei isso percorrendo o corredor enquanto meus olhos fitavam os seus. Fechei a porta do quarto e vesti minhas roupas. Hoje seria um dia diferente para nós dois e eu não queria extravagancias. Finalizei com um perfume e desci com a mochila nas costas.

- Está pronta irmã?

Peguei da geladeira uma garrafa de iogurte para levar.

- Eu estava esperando a mamãe acordar para tomarmos café juntos, antes de irmos...

- A mamãe já foi... ela precisava acertar a faixa para a inauguração...

Estela demorava para prestar atenção em algumas coisas quando estava nervosa. Hoje temos uma tarefa difícil para ela e isso deve estar tirando ela do ar.

- Ótimo, então vamos - Ela fechou o rosto, pegou a bolsa da mesa e saiu atrás de mim.

Entramos no carro e o silêncio me fez afirmar.

- Vai ficar tudo bem Estel... é só mais uma cerimonia idiota...

Dirigi até a escola e assim que deixamos o estacionamento pudemos ouvir o som da aglomeração em frente ao novo prédio. Eu e Estela caminhamos juntos e procuramos por Laurel, pertinho da arquibancada.

- Oi... - fraca e reprimida.

- Não me vem com "Oi..." é só um dia normal.... ele já se foi faz tempo e ninguém mais aqui está triste com isso...

Com certeza a intenção de Laurel era ser compassiva com a gente, respeitar a nossa dor, mas não era necessário, pelo menos não para mim.

Laurel abraçou Estela que se depositou em seus braços com um carinho apertado. Estela estava sofrendo com aquilo.

- Obrigada amiga... - Laurel olhou para mim como quem diz: está vendo? ela precisa de amor...

Revirei os olhos e me sentei ao lado delas. Estela se apoiou ao seu ombro e juntos olhamos o novo prédio da biblioteca.

Um prédio imponente, clássico, pesado, igual ao papai. Uma placa de bronze enferrujada e iluminada contrastava com as paredes com o nome do meu pai em letras graúdas.

Biblioteca Estadual Senador Filip Hawnkov

Um misto de sentimentos negativos percorreu todos os meus órgãos ao terminar de ler aquilo, tudo que fui capaz de fazer foi pegar o celular, me apoiar entre as pernas e curtir publicações no Instagram.

Minha atenção era dividida, um pouco no discurso da diretora, outro pouco nas memorias de meu pai comigo dentro do prédio. Pequenos desembaraços de memorias me faziam voltar para a realidade do desconforto com aquilo. Pressionei os lábios ao escutar meu nome mais uma vez no microfone e ver dezenas de rostos virados para mim e minha irmã.

Estela já estava descendo os degraus quando eu tive coragem de ir atrás dela até a frente.

Um púlpito, a diretora, uma fita vermelha de veludo, minha mãe, antigos colegas de gabinete do meu pai, Asher caminhando para se grudar em Estela e Sophie em minha direção. Senti suas mãos se entrelaçando as minhas e aos poucos as afastei.

-...tenho certeza que o Senador Hawnkov está orgulhoso de ver oque fizemos aqui em sua homenagem, onde quer que ele esteja... - tomara Deus que no inferno.

E a diretora seguia, várias palavras, alguns nada cordiais elogios ao senado e a politica local pelos "incentivos" financeiros no colégio, outros convites para eventos, nada interessante. Me movi ao ser puxado pela mão de mamãe para cortarmos a fita de veludo, os três.

-... assim, declaramos aberta a nova biblioteca da escola, em homenagem ao trabalho excepcional que o Senador Hawnkov fez em vida...

Uma salva de palmas, flashes dos jornalistas locais, fita no chão e um intenso nó no meu estomago.

Laurel se aproximou da gente e graças a ela eu e Estela fomos afastados das perguntas dos fofoqueiros que leem jornal.

- Onde a gente pega o horário mesmo?

- Está aqui o seu querido... - Sophie entrega o meu se agarrando na minha cintura.

- Obrigado...

Ela se aperta ao meu redor e eu não consigo mais.

- Eu já falei que eu não gosto disso Sophie... - falei firme em seu ouvido e a soltei de minha cintura.

Quando observei Asher tinha carregado minha irmã com ele e ficamos eu, Laurel e Sophie.

- Ele pelo menos mandou lembranças ? - Ironizei para Laurel

- Não para você... - Ela entrou na onda e os três seguimos para dentro do prédio escolar.

Destroyed SecretsOnde histórias criam vida. Descubra agora