VIII- Uma nova saída

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Claire

Um, dois, três, quatro... quatro errantes passam pela porta do galpão enquanto observo de uma pequena janela o lugar ao redor. Já era o sexto grupo que passava por ali naquela noite. Desço do banco no qual estou de pé e me dirijo para onde o garoto estava sentado, ainda encarando o carro na sua frente. Ando de um lado para o outro pensado no que fazer.

— Será que dá pra parar com isso? — o garoto diz depois de quase uma hora de silêncio, o que era um milagre para ele.

— Parar com o que? — respondo o encarando.

— De andar de um lado para o outro. Decida logo o que vai fazer comigo e vamos sair daqui antes que mais daqueles homens cheguem. Acredite em mim, pensar demais nunca é a solução.

— Não estou pensando demais. Estou buscando uma decisão sensata.

— Então pense mais rápido.

Abro a boca para dar a ele uma resposta grossa, mas escuto barulhos do lado de fora. Mais errantes passam pelo galpão seguindo para não sei onde. Os errantes só estão aumentando, o que significa que há muitos nessa região. Fico em silêncio até eles passarem. Quando percebo que estão distantes, respiro fundo e me viro para o garoto o encarando por alguns segundos. Não seria inteligente sair nesse lugar no meio da noite. Pelo contrário. Seria pura estupidez.

— Está certo. Vamos passar a noite aqui. Amanhã cedo saímos e você me leva até a OISH.

— Como quiser —  ele responde e olha para o outro lado.

Olho mais uma vez para porta do galpão e volto meu olhar para o garoto que já recostava sua cabeça na pilastra na qual ele estava amarrado. Ando até um dos carros que estava atrás de mim e entro nele me sentando no banco da frente. Prefiro deixar o banco em pé ao invés de inclina-lo de modo que eu consiga ficar de olho no garoto. Minha cabeça ainda lateja. Uma luta entre fechar os olhos ou não se instala dentro de mim. Tento ao máximo não cair no sono, mas havia dias que eu não dormia direito e aquele banco, o silêncio e a suposta segurança do lugar era um convite para que eu tirasse ao menos um cochilo. Não não posso. Era o que eu continuava falando na minha cabeça. E aos poucos meus olhos foram se fechando até que tudo ao meu redor e na minha cabeça não fosse nada além de um completo silêncio.

                                       ...

Tec, tec. BAM! Meus olhos se abrem em um salto só ao escutar o estrondo no galpão. Olho pelo pára-brisa do carro e não vejo nada. Saio do carro e fico de pé ao seu lado, olhando ao redor até meus olhos avistarem uma grande estrutura de metal no chão, uma estrutura que não estava lá antes. Olho para cima e avisto o lugar de onde ela caiu. Merda. Merda. Merda. Aquela estrutura provavelmente já estava corroída a muito tempo e acabou se soltando com a ajuda do vento forte que soprava naquela noite.

Isso não é nada bom. Tento fazer com que meus olhos se acostumem a escuridão que toma conta do lugar e quando eles o fazem consigo avistar o homem amarrado que também tinha acordado e agora estava com os olhos arregalados trocando a atenção entre mim e a estrutura em pedaços no chão. Com a respiração ofegante caminho até ele, mas paro ao escutar um barulho na porta da frente. Ouço os grunhidos seguidos das batidas no metal. Errantes. Muitos deles.

— Isso não é nada bom — escuto o homem falar enquanto encara a porta.

Permaneço parada olhando para a tranca balançando na porta, esperando para ver se ela iria se soltar.

— O que está esperando? Me tira daqui! — o homem fala impaciente e ofegante.

Tiro minha atenção de onde ela se encontrava e corro de volta na direção do carro pegando uma arma maior que eu havia deixado no banco ao meu lado. Procuro a mesa na qual eu havia deixado as mochilas e vou até ela colocando as mochilas nas costas. Olho mais uma vez para a porta que estava quase cedendo. Não tínhamos muito tempo. Rapidamente começo a desatar os nós que eu havia dado na corda em torno do corpo do homem e assim que eu retiro toda a corda que o havia amarrado me coloco ao seu lado tentado levantá-lo. O garoto geme assim que eu forço seu corpo para cima. Olho para sua perna que ainda possuía uma mancha de sangue na coxa. Ele não vai conseguir correr. Viro meu rosto para o portão do galpão e percebo que a tranca está por um fio de se soltar. Não vou conseguir. Não com ele. Olho para baixo pensando no que acabei de perceber. Me preparo para me levantar e correr sem o garoto.

— Não, não. O que está fazendo? Não pode me deixar aqui! — o garoto grita espavorido.

Encaro os olhos suplicantes do garoto na minha frente. Aqui estou eu, prestes a deixar possivelmente a única chance que terei de encontrar Sam. Uma hesitação misturada a indecisão toma conta de mim. Se eu decidisse levá-lo comigo correria o risco de não conseguir correr e acabar morrendo. Mas se não o levasse poderia nunca encontrar Sam. A porta atrás de mim começa a se abrir. Não tenho mais tempo. É agora ou nunca. Fecho meus olhos me arrependendo da minha decisão.

— Droga — falo enquanto seguro o tronco do garoto e o levanto passando seus braços pelo meu pescoço.

Ele olha pra trás enquanto corremos em direção a saída de trás. Consigo ouvir a porta se romper pouco tempo depois. Não ouso olhar para trás, então apenas continuo com meu passo acelerado. Não tenho condições de atirar se um deles nós alcançar já que a arma está pendurada no meu pescoço e meus braços estão ocupados evitando que o garoto caia.

— Mais rápido, mais rápido, mais rápido! — ele grita nos meus ouvidos.

— Cala a boca! — respondo fatigada.

Minha cabeça começa a doer e sinto meu corpo ficar tonto. Não posso parar agora. Não posso. Alcançamos a porta em alguns segundos. Escuto um errante na nossa cola e abro a porta rapidamente. Escuto o errante bater seu corpo quando fecho-a atrás de nós.

— Conseguimos — o garoto fala ao encarar a porta fechada.

Então eu os vejo. Três errantes. Não, quatro. Quatro errantes correndo em nossa direção do lado de fora do galpão.

— Merda — digo olhando ao redor procurando o melhor lugar para correr.

— Muito cedo para falar — o garoto diz enquanto aceleramos o passo na direção de outro prédio ao nosso lado.

Não podemos ir pela floresta. Os errantes vieram de lá. Faço uma força enorme para continuarmos correndo e minha cabeça começa a latejar. Avisto uma porta na nossa frente e tento correr mais rápido para conseguirmos chegar nela, mas por algum motivo meu corpo não consegue se mover mais rápido. Meu passo diminui e eu fico com dificuldade para respirar.

— Ei, ei, ei. O que está fazendo? — o garoto diz com um tom apavorado.

— Eu não... — tento dizer aturdida.

E então eu sinto quando um errante pula em nossa direção e nos acerta, nos jogando no chão. Me apoio no antebraço vendo o errante se levantar novamente e correr para nos pegar. Levo minha mão até o pescoço para pegar a arma e... a arma! Ela não está mais aqui! Olho para o lado para procurar por ela, mas não a encontro. O errante pula em cima de mim e eu o seguro pelos ombros enquanto o mesmo tenta me morder. Pego a faca que estava na minha calça e cravo ela na cabeça o errante. Sinto seu sangue espirrar na minha cara.

Escuto uma briga ao meu lado, porém não tenho tempo de vê-la, pois em poucos segundos outro errante me acerta. Dessa vez não consigo acertar sua cabeça com a faca, pois ele impede que meu braço se levante e minha outra mão está ocupada tentado afastar seu corpo do meu. A boca dele está a centímetros de distância do meu rosto e sinto a pele de seu ombro na qual minha mão estava começar a se desmanchar, aproximando o errante ainda mais de mim. Arquejo colocando o resto de minhas forças focadas em segurar o errante. Infelizmente isso não está funcionando. O ombro do errante quebra e sua pele e carne se desmancham. Consigo ver seu rosto se aproximar do meu e me preparo para a mordida. Então um tiro ecoa. Fecho meus olhos e sinto mais sangue se espalhar pelo meu rosto. O corpo do errante cai em cima de mim e só então eu abro meus olhos. Ele está morto. Olho para o lado a tempo de ver o garoto apontando a arma para a cabeça do errante. Seus olhos vidrados e seu rosto também cheio de sangue.

— Odeio esses filhos da puta — ele diz enfim.

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