I- Claire

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Escuridão. É tudo que eu consigo ver. É como se ela tomasse conta de tudo ao meu redor e até de mim. Tento andar, mas como sequer enxergo o que está bem na minha frente prefiro não arriscar a dar mais um passo e acabar caindo em um buraco ou dar de cara com algo ainda pior. Não me lembro de como cheguei aqui. Escuto um ruído vindo de trás de mim e me viro rapidamente para ver o que é. Claramente uma tentativa em vão, já que a única coisa na minha frente é mais breu.

Ouço passos se aproximando e junto com eles um gemido. Droga. Preciso correr. Eu quero correr. Pelo visto meu corpo não. Uma sensação horrível me percorre. Não sinto frio, fome e nem cansaço, o que é estranho considerando minha situação.

Sinto medo. A pior de todas as sensações. É quando você percebe que não é nenhum super-herói ou então algum personagem corajoso e incrível que você inventava quando era criança. É quando você percebe que aquela proteção que estava sempre com você, que te dava conforto não existe mais e que sem ela você é apenas uma pessoa fraca e insignificante.

Os passos ficam mais altos e o que quer que esteja vindo em minha direção está agora correndo. Sem que eu perceba meu corpo começa a correr também. Não faço a menor ideia de como consigo fazer quando o que visão alcança parece mais uma tela pintada com o tom mais escuro de preto, se é que isso é possível.

Sinto um calafrio. A coisa está perto. Meus pés se prendem em algo e em poucos segundos estou no chão. Minhas mãos tocam a superfície fria, mas não sinto a dor do impacto. Não escuto mais nada. Olho em volta e somente então pequeno clarão se destaca na imensidão umbrosa. Meus olhos param em algo perto dos meus pés. Me aproximo dela cuidadosamente.

Quando finalmente consigo ver o que é sinto meus olhos se encherem de água e meu coração apertar. A face dela está branca e posso ver machucados horríveis em toda sua pele. Seus olhos arregalados encaram o nada e tem sangue em todo lugar. Tenho vontade de chorar e gritar, mas não consigo. É difícil encará-la, ver seu corpo nesse estado.

Com cuidado, aproximo minhas mãos de seu rosto para percorrer seus longos cabelos, mas antes que eu possa toca-lá, sua mão gélida segura meu pulso. A mulher me encara e se levanta aproximando seu rosto do meu. Então ela grita:

— É tudo culpa sua!

Acordo assustada. Sinto meu coração acelerado e percebo que estou suando. Fico sentada no chão e fecho os olhos. A escuridão volta novamente. Talvez é assim que devesse ficar. Coloco minhas mãos no rosto e percebo que elas estão tremendo. O pesadelo que tive retorna à minha mente. "É tudo culpa sua". É só o que consigo escutar na minha cabeça. E é assim que vem sendo desde vinte e oito meses atrás. Vinte e oito meses. Nem sei porque ainda conto. Uma parte de mim ainda espera que tudo isso acabe e volte a ser com era antes. Bom, espero que essa parte desapareça logo ou tudo que vai sobrar para mim são mais decepções.

Abro os olhos lentamente e observo o local onde eu estou. Pelo menos dessa vez eu me lembro como cheguei aqui. Vejo as pilastras que sobraram do prédio destruído. Pedras e mais pedras me cercam. Na noite passada esse lugar me parecia seguro. Agora percebo que só não morri por sorte. Se é que isso ainda existe. Me levanto sem fazer muito barulho para evitar atrair algum errante que esteja próximo.

Olhando ao redor, não vejo nenhum movimento. Os raios solares entram pelas frestas deixadas pelos escombros do prédio e sem perder mais tempo, pego minha mochila no chão e minha arma que está ao lado dela. Se eu não achar mais munição ou outra arma poderei me considerar uma mulher morta em cinco dias. Ou menos. Sem falar da comida. Esperava encontrar alguma coisa em uma cidade um pouco maior, mas parece que tudo que eu consegui foi perder balas e água. Tem mais errantes aqui do que eu esperava e os carros e tanques com pessoas daquele organização idiota passam pelas ruas a cada minuto. Minha última esperança é conseguir alguma coisa em uma loja de conveniência que fica um pouco afastada da cidade.

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