O universo - como você pretende jogar esse jogo?

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Há uns 10 mil anos, não se compreendia praticamente nada sobre o universo e sobre o que poderia haver além dele. Nada. Desconhecimento total.

Foi assim que os deuses conseguiram fincar seus cajados na Terra e ganhar adeptos. Ora, senão conseguíamos explicar nada, só havia uma resposta: Deus. Ou deuses, variava de local para local.

Cometa? Deus. Eclipse? Deus. Dia, noite? Deus. Fogo? Presente dos deuses?

Felizmente, alguns de nós, reles, não se contentaram com essas respostas. A curiosidade é de nossas qualidades uma das mais importantes. Dessa maneira, conseguimos sair de dentro das cavernas, pois aquilo que fora delas se encontrava começava a causar menos medo.

De sair do breu das cavernas a pisar na lua, e hoje ter uma sonda ultrapassando a fronteira de nosso sistema solar, foi por conta da curiosidade que nos impulsionou. A curiosidade e a capacidade de reconhecer padrões tiraram Deus – ou deuses – da equação. Se ele continuasse lá, monopolizando as respostas, seríamos ainda reféns das trevas. Ou não?

A dúvida e a inquietação se espalharam por muitos de nós, permitindo avanços tecnológicos, científicos, artísticos e humanos incríveis. Mas Deus – ou deuses – também sobreviveu.

A diferença é: enquanto o primeiro grupo, dos curiosos, avança, desconstruindo crenças à base de provas, o segundo teima em empurrar Deus como explicação, sem cálculos, análises ou comparações, a cada degrau superado. Em suma, se a gravidade deixou de ser Deus, então Deus a comanda.

Atualmente, estima-se que se entenda apenas 4% do universo, ao menos foi o que disse em uma entrevista o famoso astrofísico Neil deGrasse Tyson. Parece pouca coisa, mas imagine que, até pouco tempo atrás, acreditava-se que o Universo era infinito. Não é mais assim e já existem teorias que preveem um "multiverso". Ou seja, nosso universo seria mera bolha de sabão em um mar de outras bolhas.

Durma-se com esse barulho.

E nem falarei das possíveis 11 dimensões em teoria física, que daí é de fundir a cachola de vez.

Aí vem um fiel seguidor de crença qualquer e diz: "Bom, se os cientistas só entendem 4% do universo (aquele que provavelmente nem é mais o único), então os demais 96% são Deus.".

Como diria o mesmo astrofísico, na tal entrevista, "Você tem certeza de que é dessa maneira que pretende jogar esse jogo?".

Senão, vejamos, os 4% entendidos pelos cientistas são baseados em evidências, em estudos, em incansáveis pesquisas. Pautados em teorias prévias, foram explicados, provados e comprovados. Os 96% do outro lado... Fé.

De novo, tem certeza de que quer jogar esse jogo desse modo?

"Mas e a parte que os cientistas não entendem (ainda), como explicar?", poderia perguntar outro. Bom, como sempre foi feito desde que se tem registro: com ciência e sem medo de contradizer a autoridade. Dessa forma se elucida o que não se entende. Da mesma maneira que Giordano Bruno, Galileu, Newton, Einstein e tantos outros um dia explicaram coisas que, até então, eram Deus.

Não compreender é um combustível de um lado e uma sedação do outro.

Há uma lista de coisas que os físicos, químicos, astrônomos não entendiam no passado. Uma enorme lista. Há 200 anos, o movimento dos planetas era Deus. Qualquer criança hoje em dia apresenta explicação bem melhor em uma feira de ciências, com isopores pintados pendurados por barbantes.

Portanto, se alguém pretende continuar a explicar Deus sendo a parte que não se conhece, então Deus está ficando menor ano a ano.

E é bom se estar preparado quando a balança empatar, afinal, ficará difícil defender o argumento do "Deus das Lacunas" quando elas forem em número menor ao que se entenderá.

Por fim, a questão nem é mais o esclarecimento ou não dos eventos hoje ainda incompreensíveis, como a "matéria escura", por exemplo. O problema é haver aqueles que se satisfazem com a pura resposta, "Deus assim o fez", matarem em si a curiosidade, eliminarem a busca pelo aprendizado e ainda tentarem proibir outros de fazê-lo, com ameaças, incutindo medo. Qual a serventia de tais para a sociedade?

Por isso, a conta precisa estar sempre a favor dos que buscam respostas, não dos que as preferem manter embaixo de pedras, de altares. Felizmente, a força das evidências é tamanha que por vezes um único indivíduo subverte toda uma ordem estabelecida. Afinal, foi Newton e seus seguidores que nos levaram à Lua e não milhões de pessoas orando para ascender aos céus.

O riso, o raso e a rezaOnde histórias criam vida. Descubra agora