__ Ele é igualzinho a mim__ disse o tal alguém que olhava o corpo falecido de Charlie deitado na impressora humana.
__ Qual é a última coisa de que se lembra, Charlie?
Charlie não tirou os olhos de Charlie. Ele tinha olhos sonolentos como se estivesse acabado de acordar (e de certa forma tinha mesmo), tinha a pele mais conservada que seu eu-original, no entanto as diferenças eram ínfimas. O clone tocou com sua unha na pele do cadáver com tamanha força e pressão que a pele tornou a sangrar.
__ Ele é igual a mim e ele sangra__ não conseguia tirar os olhos do defunto__ É tão real...
__ Charlie, meu filho, está tudo bem?
Enfim o rapaz olhou para o seu tio:
__ Eu acabei de acordar com um cadáver igual a mim, num lugar desconhecido...__ olhou ao redor__ tem uma mulher caída no chão, por quê? Quem é esse velho mendigo? Que máquinas são essas que eu acordei? E... e... esse corpo idêntico a mim e... e... __ olhou para Elliot e Alter-Elliot__ Eu ainda estou bêbado? Por que eu vejo dois Elliots?__ disse com um olhar perdido e confuso.
__ Qual é a última coisa de que se lembra? Se quer que as suas perguntas sejam respondidas precisa refazer seus passos__ disse Clóvis pacientemente.
__ A gente explica tudo, é uma longa história__ disse Charles__ Que tal um cuscuz?__ e tocou no seu ombro.
Charlie o afastou.
__ Sem cuscuz, quero respostas. Eu me lembro... me lembro de... eu estava tomando cerveja com um deles__ disse apontando para os Elliots__ Elliot não bebeu porque ia dirigir. Eu... lembro de ter puxado o saco dele pra dirigir... depois eu estava dirigindo e depois... saímos da estrada, lembro de... de...__ sua face estava marcado por sofrimento__ dói... dói... minha cabeça dói... eu bati... nós batemos, lembro de uma árvore, estávamos bem rápido e a última coisa que me lembro é... da árvore__ e começou a gemer__ minha cabeça... cabeça... dói... porque dói... ?
Charles ficou preocupado, olhou para Clóvis procurando respostas. Clóvis levantou-se, cedeu-lhe a cadeira e disse:
__ Venha, sente-se. O que você sente é normal.
__ Que dor é essa? Por que eu sinto isso? E quem é você?
__ Bom, apesar da aparência de mendigo, sou um cientista.
__ Não é o mais higiênico pelo visto.
__ Quer ajuda ou vai continuar me insultando? Essa dor que você sente... você sente porque...
__ Tome muito cuidado com a língua, velho...__ advertiu-o Charles.
Alter-Elliot olhou para Clóvis com um olhar ameaçador, Charlie reparou.
__ Eu quero respostas, por que estão olhando esquisito pra ele? Eu quero respostas...__ e começou a ficar nervoso após olhar mais uma vez para seu defunto__ quero respostas, quero respostas, quero respostas, quero respostas!!!__ disse colérico.
Clóvis não respondeu, ficou cabisbaixo.
__ Por favor, senhor...__ disse Charlie com um olhar aflito.
__ Você morreu__ disse Elliot.
Alter-Elliot e Charles o olharam surpresos.
__ Por que estão me olhando assim? Não dá pra esconder mais esse "elefante", você morreu, Charlie.
__ Como... mas se eu morri, como eu estou... como eu... ?__ indagou perplexo.
__ Isso é verdade, você morreu__ disse Diana levantando-se lentamente.
__ E quem é você?
__ Sou a terapeuta do Elliot.
__ E como sabe tanto de gente morta? Se eu estou morto, quem é esse cadáver? Eu sou um fantasma? Isso é alguma espécie de céu? Ou inferno?
__ Não é o inferno, mas é quase__ disse Diana sarcástica.
__ Você é um clone, está no meu laboratório que fica dentro da minha casa e aqui é um porão__ disse Clóvis.
__ Não, ele não é um clone. Não acredite nele, Charlie.
Charlie ignorou seu tio e fitou Elliot, aquele que tinha lhe respondido:
__ Isso é verdade? Meu tio já mentiu antes pra não me magoar, mas você... você nunca mentiu pra mim na vida, eu sou um clone?
Elliot não respondeu, pois estava reflexivo. Aquele clone parecia tão real, tinha a voz de Charlie, o corpo de Charlie, a personalidade de Charlie, embora soubesse que era um clone, não tinha certeza disso, pois ele era tão "igualzinho a mim"; recordou das palavras do clone. "Até o nariz de tucano é igual!; pensou ele. Era a mesma altura, embora estivesse mais magro, tinha o cabelo louro, embora estivesse mais comprido. __ Você não é um clone__ disse Alter-Elliot__ Não espere que ele fale a verdade, ele é o clone, eu sou real. Eu.. e o defunto na maca é...
__ Não, você não é o de verdade. Você é a cópia, pode falar como o Elliot, olhar como o Elliot, mas não é o Elliot, o verdadeiro Elliot nunca ia ameaçar um idoso__ depois olhou para Elliot novamente__ Então Elliot, eu sou um clone?
__ É sim.
__ Por que eu tô aqui?
__ Isso eu não sei responder.
__ Cê tá aqui porque eu te queria de volta e quando eu tive a chance de fazer isso... eu agarrei essa chance e fiz__ disse Charles com a voz embargada.
__ Queria reviver o Elliot também? __ disse Charlie ao seu tio.
__ Não, isso foi ideia do seu amigo...
__ É só você que tá morto, cara...
__ Como eu... digo, o Charlie morreu?
__ Naquela vez que dirigiu... você dirigiu, estava bêbado, saímos da estrada e bateu numa árvore... eu sobrevivi, mas você...
__ Por que fez um clone seu?
Elliot não respondeu.
__ É uma pergunta simples, Elliot.
__ Que tal conversamos lá em cima, filho__ disse Charles, que tocou no ombro do rapaz que reagiu o empurrando com força para longe.
Alter-Charlie, com uma força descomunal, fez seu tio cair para trás do outro lado da sala, ele gemeu de dor.
__ Calma, Charlie__ disse Elliot.
__ Calma? Calma? Ele mentiu pra mim, ia fazer eu acreditar que sou aquilo que eu não era, e meu nome não é Charlie... o Charlie morreu... morreu! Ele morreu e o que sobrou?__ disse com revolta__ Tudo o que me lembro... é de mentira, minhas memórias são coisas que eu não vivi, tudo mentira, eu sou uma mentira.
__ Não, não é__ disse Clóvis__ Seu nome é Alter-Charlie, é o nome de todos os clones do projeto.
__ Um projeto que clona defunto?
__ Não se esqueça de que seu amigo tá vivo!__ disse Diana
__ Se eu não sou o Charlie quem sou eu, hein Elliot?
__ É um clone, um clone igualzinho a mim, mas você foi criado a partir do DNA do Charlie, uma parte sua é o Charlie. Assim como uma parte do Elliot vive em mim... isso ficou esquisito, mas você me entendeu. Você é um clone, mas não é só uma cópia, uma parte sua é Charlie e a outra... você decide, cara__ disse Walter e tentou tocar em seu ombro.
Charlie reagiu com um soco no queixo.
__ Não sou igual a você, aberração. Nem faz 5 minutos que te conheço, mas já te odeio...
__ Relaxa, cara. Vai ficar tudo bem__ disse Elliot.
__ Relaxar? Tudo bem? Como vou explicar isso para os meus pais, hein? E os meus amigos, colegas de escola? Se eu fingir que sou um Charlie, como explicar que voltei dos mortos? Já pensou como reagiriam? Aliás, seus pais sabem que tem um clone? Responde, Elliot!
__ Não.
__ E por que não conta?
__ Isso não vem ao caso.
__ Claro que tem. Eu preciso sair daqui, preciso... preciso... dor... essa dor infernal na cabeça... eu sinto de novo... é esse lugar, é esse lugar que tá fazendo isso comigo, preciso sair__ e apressadamente virou-se para trás em direção a escada.
__ Ei, espera__ e pegou-o pelo pulso.
Charlie reagiu instintivamente com um soco. Elliot caiu de joelho, Charlie lamentou-se, pediu desculpas, até que Walter apontou a arma de dardos para ele. Charlie ferozmente pulou contra ele, segurando a arma, tentando tirá-la a força, ambos entraram em luta corporal, até que Charlie dá uma cabeçada em Walter e corre velozmente.
Clóvis tenta adverti-lo a não ir a distância, Diana vai atrás do garoto, Charlie consegue subir as escadas, Diana o persegue, Charlie consegue chegar ao topo da escada. Diana consegue o alcançar agarrando-o pelo braço pedindo para que esperasse, Charlie a empurra e ela cai escada abaixo. Charlie sai sem olhar para trás.
Walter avança em disparada, ignorando o corpo de Diana inconsciente no chão do porão, ele sobe a escadas com a arma de fogo, pois a arma de dardos estava com Charlie.
Charles conseguiu levantar-se com esforço, no entanto ele não esperava que Clóvis estivesse com sua espingarda mirando direto nele com um olhar rancoroso.
Elliot procurou socorrer Diana e estava posicionado entre Clóvis e Charles.
__ Eu só queria meu sobrinho de volta, por favor, me deixe ir__ disse Charles tristemente.
__ Eu só queria paz, e eu só queria Diana viva__ Clóvis destravou a arma.
__ Eu tenho as chaves das algemas, se me deixar ir eu posso te dar elas.
__ Ou eu posso te matar e ficar com as chaves, só vejo vantagem. Você precisa de mim pra ficar vivo e eu não preciso de você pra nada, seu imprestável!__ disse com um olhar rancoroso.
__ Não faz isso, doutor. Por favor, a Diana precisa de você__ disse Elliot ainda agachado no chão com ela.
__ Eu vou ser rápido, Elliot, fique tranquilo.
__ Não, por favor, pare__ Elliot levantou-se e ficou entre os dois.
__ Saia da frente, Elliot__ disse Clóvis.
__ Não saio daqui até abaixar essa arma__ retrucou ele.
__ Saia da frente ou eu atiro nos dois.
__ Você não tá pensando direito, doutor.
__ Não estou pensando? O que mais fiz por aqui foi pensar, pensar e pensar... fui aprisionado dentro da minha própria casa, tive que pensar o tempo todo em como fugir da minha própria casa sem prejudicar a Diana! E ao mesmo tempo tive que pensar em como satisfazer as necessidades do seu clone doentio e desse jumento que não sabe pensar por conta própria e fiz isso pensando em quem? Em não ferir a Diana! E o que aconteceu? Pensei tanto e ela saiu ferida! Ferida, Elliot! Eu fiz tudo o que eles pediram e mesmo assim feriram ela! Chega de pensar!__ gritou colérico.
__ Tudo bem, mas esse não é o jeito certo de resolver as coisas.
__ Por que tá defendendo ele? Ele quase te matou!
__ Isso por que ele foi enganado, enganado assim como eu!
__ Ele não é vítima aqui, ele me torturou, me bateu, me sequestrou, me manteve preso na minha própria casa e ameaçou...__ interrompeu-se com a visão de Charles aproximando-se de fininho pelas escadas e atirou.
Elliot o agarrou, o que fez errar o tiro e fez Charles sair correndo assustado.
__ Não! Ele tá fugindo, me solte! Me solte! Me solta seu moleque idiota, ele tá escapando, ele não pode se safar! Não pode...
Interrompeu-se quando ouviu um som metálico caindo no chão, parecia ter vindo do teto, Clóvis e o garoto olharam ao longe e viram um objeto metálico, não, vários objetos... várias chaves.
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Alter-ego
RomansaElliot e Charlie eram amigos inseparáveis, até que uma infeliz tragédia leva a morte de Charlie. Enlutado, Elliot procura ajuda por meio de uma terapeuta para poder seguir em frente. A terapeuta lhe sugere o projeto Alter-ego, um projeto que tem o o...