Cartas que eu desejaria te entregar

Carta 5, 21/11/2014

Querida Cristine,

Novamente estamos em um dia nublado e um pouco frio aqui em Curitiba, mesmo sendo verão o clima está fechado, como em mim continuamente há um mês. Como notou, as cartas estão sendo em datas um pouco mais distantes das outras com o passar do tempo, eu sei que não gosta tanto assim de ler e os dias são bem repetitivos, confesso.

Está lendo isso e consegue lembrar do quão meloso eu posso ser? Nunca enjoou disso? Tenho tantas perguntas para fazer assim que você despertar, tem muitas interrogações em sua mente agora?

Não se preocupe com essas cartas, são apenas memorias doces e sentimentos profundos de uma das pessoas que mais te amam no mundo enquanto está se recuperando de um grave acidente, eu sou uma dessas pessoas. Seu namorado, pessoa que diariamente há quatro anos imagina cada mero momento da vida ao seu lado, seja em momentos bons ou ruins, esse sou eu, Júlio Morais de Barros, ou apenas Juju.

Hoje faz um mês desde que tudo aconteceu, para mim, parece que faz um ano. Você permanece dormindo, e hoje bem cedo o médico falou que precisará fazer outra cirurgia, pois seu fígado tornou a ter um sangramento inesperado, os médicos dizem que ainda não entendem por que isso está acontecendo, estou sentado na sala que antecede o centro cirúrgico, você já foi levada e sinto meu coração doer.

Seus pais, seu irmão, a bel e eu estamos aqui a espera de notícias, esperamos ansiosos por notícias boas, mas já sabíamos desde o começo que sua situação é crítica, mas nenhum de nós consegue perder a esperança.

A justiça começou a ser feita quando muitas pessoas protestaram nas ruas por isso, está uma comoção gigante em todos os locais e meios de comunicação, ontem a reportagem veio ao hospital e retrataram mais uma morte e algumas pessoas que seguem se recuperando em. A perícia está trabalhando firme para trazer à tona os reais motivos da tragédia e culpar quem merece ser culpado mesmo que ninguém tenha feito algo intencional ou nos contar que não houve motivos e apenas aconteceu, minha alma pede respostas.

Seus pais seguem tentando ser firmes, mas sua mãe desaba em choro várias vezes ao dia e a ajudamos, já eu estou tentando não chorar como antes, pois sempre me atraia pensamentos negativos, ontem recebemos conselhos de algumas enfermeiras que nos veem diariamente por aqui dormindo ao seu lado, elas nos falaram que seria melhor por nossa saúde se dormíssemos em casa, pois todos sabemos que não a momento certo para você retornar para nós.

Sabe o gatinho? Compre coisas para ele, o mesmo ainda segue sob os cuidados da sua melhor amiga e logo estará ao nosso lado.

Cris, não sei se consigo me afastar e dormir em casa todas as noites, tudo ainda é muito pesado. Seus pais estão sendo mais presentes do que os meus, como sempre. Seu pai faz elogios a nossa casa e diz que morarmos juntos, no fim das contas o deixou mais aliviado do que quando morava sozinha.

Sua mãe faz comidas muito boas para todos nós, lembra a hora dos meus remédios que sempre esqueço e cuida de mim como cuida do seu irmão, ela está esperançosa mesmo com notícias difíceis como a da cirurgia. Tudo isso nos pegou de surpresa como qualquer acidente, e creio que todos tem tantas coisas para te falar...

Lembra quando seus pais completaram vinte anos de casados e decidiram dá um jantar de bodas de porcelana, bem quando chegou do Canadá? Você não ia para sua cidade há meses e havia discutido feio com seus pais que não aceitaram tão bem morarmos juntos sem casar, isso te deixou tão brava...

S2

Cris é de uma cidade no interior do Paraná e se mudou para a capital há alguns anos para seguir seus sonhos, seus pais já me conhecem a um tempo, mas de cara não aceitaram muito bem quando contamos por chamada de vídeo que havíamos decidido morar juntos, eu até entendi a opinião deles como pessoas mais velhas e conservadoras, mas ainda sim, minha namorada tinha um gênio um pouco mais forte e por pouco não recusou o convite para a festa.