As Canções da Guerra: GARDÊNIA | LIVRO 01

Capítulo - 24- "VIRANDO O JOGO"

— SENHORA? — A VOZ A CHAMOU POR de trás da porta de seus aposentos.

Quando Verídia deu por si acordada de seus pesadelos, encontrou o soldado a postos em frente sua cama. Sem ruído algum ele havia adentrado e lhe preparado os equipamentos. Uma adaga de aço estava ao seu lado, juntamente de uma placa peitoral e um elmo meio amassado. É aqui onde tudo termina e recomeça. Uma pequena lembrança de quando era criança lhe passou pela cabeça naquele instante que segurava a adaga em mãos.

A mulher sonhara noites e noites o mesmo sonho, algo que perfurava suas memórias e a atraia para longe. O cheiro de sangue e os gritos de seus colegas ressoava em sua mente como algo nunca antes enjoativo. Dizia para si mesma que tinha de ajuda-los, mas de nada poderia ser feito, era apenas uma garotinha. Quando conseguiu sair da toca, a guerra havia levado a todos. Agora, o mesmo gosto e cheiro lhe vinha como um soco na alma. Sangue, sinto cheiro de sangue. Entretanto, a guerra ainda não havia começado.

O soldado a levou pelos corredores até uma sala privada onde mais soldados se encontravam a postos. Dentro da sala, Endryus encontrava-se ao lado de Merlara e Tavos. Vohrus estava diante da mesa onde vinho era servido. Tinha um rosto amargo pelo tempo e cicatrizes que nunca se curaram. Quando olhou de relance para Verídia, pôde-se notar um meio-sorriso maldoso. Ele é tão perigoso quanto Elena.

Naquela noite, a rainha estava se preparando para encontrar-se com Grégory e discutir sobre assuntos da colônia e o futuro de suas casas. Elena precisava se casar com alguém de sangue gardês o quanto antes para apaziguar os senhores das demais colônias, e até o momento, Grégory fora o único rapaz adequado a ser encontrado para ela. O que Elena queria? Afinal, os demais gardeses foram mortos. A invasão à colônia custou a vida de muitos homens, grandes ou pequenos que poderiam dar um consorte bom para a rainha, e agora, o rapaz seria a presa certa para a garota, até onde ela sabia. Grégory era jovem, sim, e belo, por outro lado ele tinha estigmas em sua vida ao que parecia. Quando chegou à colônia, como um estranho desesperado e perdido, pareceu não reconhecer Verídia a princípio, muito menos o local onde morara sua vida inteira.

Enquanto se sentava para parlamentar com os demais, a conselheira da rainha teve um belo deslumbre de Endryus a encarando da mesma forma como sempre a encarava. O filho de Vohrus trazia a espada desta vez nas costas, usava luvas negras e botas de cano alto.

— É um prazer ter a senhora conosco, Verídia. — Vohrus mantinha um lugar reservado para ela em sua mesa.

Homens que ele comandava estavam reunidos ali também, alguns sentavam-se juntos, outros esperavam em pé e alguns observavam da porta.

— Onde está a rainha?

— Você sabe onde está a rainha — o comandante respondeu. — Foi você mesma quem trouxe a ideia do casamento.

Aquilo a deixou desconfortável. Tavos a olhou de relance e Merlara seguiu os olhares do marido. Sua barriga se tornara enorme desde a última vez que vira a mulher, e agora ela se mostrava mais deslumbrante e bela do que antes.

— Certamente que sim. — Quando pegou sua taça de vinho, Tavos se remexeu na cadeira. — Elena está com seu futuro marido.

— Desde quando uma filha se casa sem a permissão do pai? — Tavos olhava sempre diretamente para Vohrus e depois para Verídia.

— Desde que ela se tornou rainha — ele respondera, calmo e suavemente. — Elena é a rainha.

— Por hora. — Tavos voltou a se encostar-se na cadeira, enquanto Merlara segurava em sua mão direita.

— Sim, por hora. — Verídia reparou no jeito como as palavras eram jogadas naquele banquete, como se um jogo maior rolasse de um lado para o outro, sem que alguém visse. Mas certamente todos estavam de olho, todos viam os interesses serem postos em frente de qualquer coisa. E Gardênia estava ali, diante de todos aqueles jogadores impetuosos. — É de poder que estamos falando, e é por Elena que estamos reunidos aqui, acredito eu.