2018 - ABU DHABI - CLASSIFICAÇÃO

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Circuito de Yas Marina, Novembro de 2018

POV Daniel Ricciardo

Foi uma classificação razoável para ambos.

Eu cruzei a linha de chegada, melhorando o tempo na última volta. Com os dois carros entre os 10 primeiros davam a esperança de que teríamos uma boa corrida, mesmo em uma pista que não permitia tantas ultrapassagens assim. Fazendo boas largadas e estratégias, tudo poderia acontecer amanhã.

- Ok Daniel, finalizamos em P5. Então P5. Uma posição sólida, acredito que temos tudo para ter uma boa corrida amanhã - meu engenheiro disse pelo rádio, ao final do Q3.

- Ok, entendido. Vamos pegar eles amanhã.

Ao sair do carro, vi Max um pouco frustrado do outro lado da garagem. Eu encontrei seus olhos por alguns segundos e existia raiva ali. Se ele deixar esse bicho raivoso que mora no seu peito consumi-lo, nunca vai ser o campeão que eu sei que ele já é. Max tem espírito e a garra que um vencedor exige. Queria poder acalmá-lo, mas eu não o fiz. Já tinha imposto as regras entre nós, ele podia lidar com isso com sua equipe. E eu não podia deixar o dia anterior me abalar mais ainda.

Fui muito requisitado nas entrevistas pós classificação. Era a última corrida pela RedBull e nenhum veículo queria ficar sem a cobertura do fato. Perguntavam minhas expectativas para a corrida, para o ano seguinte, comentavam o desempenho da Renault e o que eu esperava.

Retornando ao motorhome, parei por alguns minutos diante dele. Era a última noite antes da última corrida e agora, olhando ele assim já sem a correria pós-classificação, trazia certa paz. Meu lar por cinco anos, quantas coisas vivi aqui. Olhava as linhas duras em um misto de cinza, azul e vermelho que culminavam no logo da RedBull, bem na entrada. Quantas felicidades e frustrações, companheiros e ensinamentos. A equipe que acreditou em mim desde a academia de pilotos. Sempre achei que estaria mais que preparado para esses momentos finais, não fosse uma única pessoa.

Eu me apoiei na parede daquela pequena varanda de entrada, colocando a garrafa de isotônico entre as pernas. Com a mão direita, enfiei dois dedos na abertura do pulso da minha vestimenta, desgrudando um papel dobrado, agora colado em minha pele. Abri com cuidado, revelando aquela mesma foto que ele tinha deixado ontem para mim, com sua rosa final. Max. Eu não sei porque fiz isso, mas eu o levei para dirigir comigo nessa classificação. Não sei se era a saudade de dirigir despretensiosamente com ele, vento no rosto e muita música. Não sei se era a lembrança daquela noite brasileira, de fogo e descobertas. Não sei se eram as muitas questões que essa despedida trazia de volta à tona. Eu alisava seu rosto naquela foto, pensando naqueles três anos com ele aqui, lado a lado nos carros com touros vermelhos. Mas eu tomei uma decisão, e eu preciso ser firme. Por mim. Por nós.

Foi Michael quem me trouxe de volta a realidade. Não o vi quando retornava para buscar mais coisas que seriam levadas ao hotel e agora estava diante de mim. Eu entreguei a foto a ele, sem dizer nada a respeito. Disse que só trocaria de roupa e poderíamos ir descansar, ao qual meu coach assentiu. Eu voltei minha atenção ao motorhome e entrei, sendo recebido com muitos parabéns e sorrisos. Havia muita gente agradável ali e isso também seria uma saudade. Meu engenheiro de corrida acenou de longe para mim. Também estava de saída da equipe e celebrava em uma mini festa com seus colegas. Christian também surgiu, tentando engatar uma conversa comigo, mas consegui desviar, alegando pressa para o hotel. Isso era uma das coisas que eu sabia que não sentiria tanta falta.

Segui pelos poucos e curtos corredores, ansioso para me trocar e ter uma noite tranquila, para uma ótima corrida, quem sabe até um pódio. Mas nada parecia colaborar para que o assunto fosse outro em meu íntimo no dia de hoje. Respirei fundo e tive que colocar aquela máscara de seriedade novamente.

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