capítulo 21

5 3 0
                                    

        Vesti o suéter vermelho que Ethan me deu no natal passado

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

        Vesti o suéter vermelho que Ethan me deu no natal passado. Espalhei o meu perfume favorito pelo corpo e desci as escadas bem cedo, antes que Tobias acordasse ou qualquer outro que não usasse um relógio pontual naquela casa.

– O que está fazendo aqui? – Ethan perguntou ao sair do banho que sempre era concluído às seis. Ele arrumava a blusa social, deu um tempo para o colete.

– Estava no banheiro de cima. – dei um sorriso que dizia: "Eu venci".

– Achei que fosse correr por aí.

– Não. Porque hoje – eu segurei a ponta do seu queixo, ele sempre ficava nervoso com aquilo. – vamos tomar café juntos. – o beijei devagar e sorri quando suas bochechas ficaram coradas.

– Calel, não pode simplesmente achar que vou aceitar isso tão fácil. – ele cruzou os braços em frente ao peito.

Ethan desviou de mim rumo a sala.

– Quero o meu café forte. – e foi pegar algo para ler.

Quando começamos a comer, Ethan ficou calado. Bebericava o café e mordia uma fatia de pão com manteiga derretida em um círculo bem no meio porque ele preferia as bordas mais crocantes. Ele segurava um livro com capa de couro, Eeth gostava tanto dos seus livros que pedia para um encadernador proteger todas as capas com novas roupagens de couro.

– O que está lendo? – perguntei.

– 1984. – falou ainda degustando cada palavra com atenção.

– Já não leu esse? – mordi mais uma fatia de pão.

– Sim. Oito vezes ano passado. – ele me olhou rapidamente por entre as páginas. – Quem sabe o prazo do autor tenha se estendido.

Eu mordi o lábio em um sorriso, finalmente ele estava falando.

– Até Nebel?

– Até nós dois. – ele deu de ombros.

Aquilo me fez parar por um tempo. O sorriso sumiu e eu só pensava naquele livro idiota que Ethan segurava com tanto cuidado.

– Podemos dormir no mesmo quarto sem problemas. – tentei fazê-lo rir, mas vi a sua boca se comprimir em sinal de aborrecimento. – E eu não vou começar a idolatrar o Constâncio.

– Por quanto tempo? – falou baixo. – Até termos que voltar para a cidade e o soberano perdoar todos nós outra vez apenas porque você precisa virar um líder, ou até ele fazer você se casar com a minha irmã para mostrar o comprometimento do meu clã? – sua expressão endurecida não se desviava da minha.

O livro continuava aberto um pouco mais da metade porque Ethan lia as partes mais importantes, ele sabia exatamente onde elas estavam, página e parágrafo. Pensei em quando o meu objetivo de ser o melhor sucessor para o meu povo tinha mudado para ser o melhor para Ethan? Eu não sabia ao certo. Talvez tivesse sido há quatro anos quando ele foi obrigado a me dar aulas de biologia e Tobias ficou zuando isso por um mês inteiro, ou naquele verão dos jogos escolares, um semestre depois, onde ele ficou na arquibancada, ausentado pela enfermaria, e de repente aquilo o deixou mil vezes mais intrigante. Claro que não era por Ethan ser avesso à esportes, mas por ele usar qualquer diagnóstico para livrá-lo de ter que correr em círculos pelo campo ou de usar camiseta e shorts. Eu consegui um diagnóstico e fiquei sentado ao seu lado, exatamente meio metro de distância, observando ele estudar história e comer biscoitos de chocolates caseiros.

– Tem um abismo de coisas que podem acontecer durante o ciclo, mas essas eu não vou deixar acontecer. – falei com tanta certeza que fiquei com medo de ter que mudar a minha palavra depois. – Vou tirar a gente daqui, Eeth, só preciso pensar mais.

Meus olhos não se desviavam dos seus. Eeth segurou a minha mão, os dedos quentes por estarem segurando a xícara de café.

– Então me conta no que está pensando. – falou calmamente. – Já faz dias, Calel. Não precisa ficar sozinho circulando pela grama lá fora. Sabe que eu posso ajudar, eu não sou burro.

Aquelas últimas palavras me fizeram sorrir. Ethan era o mais novo, o mais esperto, o protegido. Ele até evitava as transformações porque, pelos seus cálculos, aquilo o faria perder a noção de humanidade, o deixaria raivoso ou movido pelos próprios instintos e não estava errado.

Seus olhos azuis pediam uma garantia. No que eu estava pensando? Se eu falasse, aquilo soaria tão egoísta até para Ethan? Eu não conseguiria guardar por muito tempo, uma hora ele saberia mesmo antes de eu falar, então respirei fundo.

– Vou trocar a peeira pela nossa liberdade e o mestiço vai ser o meu cão de guarda, Eeth. Não tem outro jeito. – fiz com que cada palavra fosse entendida.

Ele abaixou a cabeça como se estivesse lendo, mas os olhos vagavam como quando se faz uma multiplicação de cabeça. Quando ele voltou a me encarar, já parecia cansado demais.

– Isso seria justo se você fosse o seu pai.

Aquelas poucas palavras me tiraram a fome.

Ficamos em silêncio. Ethan apenas continuou tomando o seu café da manhã, e quando o prato ficou vazio e Ully saiu com os fones de ouvido para jogar as suas latas de energético na lixeira, Ethan se levantou de volta para o quarto.

Amarras de Prata Rubra | PresaOnde histórias criam vida. Descubra agora