ENTENDENDO A DEPENDÊNCIA AFETIVA

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"O amor não é apenas um sentimento. É também uma arte."

Balzac

     Sobre alguns inconvenientes da dependência afetiva: esclarecimentos e mal entendidos

A DEPENDÊNCIA AFETIVA É UM VÍCIO DEPENDER DA PESSOA QUE SE AMA É UMA MANEIRA DE SE ENTERRAR EM VIDA, UM ATO DE AUTOMUTILAÇÃO PSICOLÓGICA EM QUE O AMOR- PRÓPRIO, O AUTO-RESPEITO E A NOSSA ESSÊNCIA SÃO OFERECIDOS E PRESENTEADOS IRRACIONALMENTE. QUANDO A DEPENDÊNCIA ESTÁ PRESENTE, ENTREGAR-SE, MAIS DO QUE UM ATO DE CARINHO DESINTERESSADO E GENEROSO, É UMA FORMA DE CAPITULAÇÃO, UMA RENDIÇÃO CONDUZIDA PELO MEDO COM A FINALIDADE DE PRESERVAR AS COISAS BOAS QUE A RELAÇÃO OFERECE. SOB O DISFARCE DE AMOR ROMÂNTICO, A PESSOA DEPENDENTE AFETIVA COMEÇA A SOFRER UMA DESPERSONALIZAÇÃO LENTA E IMPLACÁVEL ATÉ SE TRANSFORMAR NUM ANEXO DA PESSOA "AMADA", UM SIMPLES APÊNDICE. QUANDO A DEPENDÊNCIA É MÚTUA, O ENREDO É FUNESTO E TRAGICÔMICO: SE UM ESPIRRA, O OUTRO ASSOA O NARIZ. OU, NUMA DESCRIÇÃO IGUALMENTE DOENTIA: SE UM SENTE FRIO, O OUTRO COLOCA O CASACO.


"Minha existência não tem sentido sem ela"; "Vivo por ele e para ele"; "Ela é tudo para mim"; "Ele é a coisa mais importante da minha vida"; "Não sei o que faria sem ela"; "Se ele me faltasse, eu me mataria"; "Eu venero você"; "Preciso de você"; enfim, a lista desse tipo de expressões e "declarações de amor" é interminável e bastante conhecida. Em mais de uma oportunidade, as recitamos, as cantamos embaixo de uma janela, as escrevemos ou, simplesmente, elas brotam sem nenhum pudor de um coração palpitante e desejoso de transmitir afeto. Pensamos que essas afirmações são demonstrações de amor, representações verdadeiras e confiáveis do mais puro e incondicional dos sentimentos. De forma contraditória, a tradição tentou incutir em nós um paradigma distorcido e pessimista: o amor autêntico, irremediavelmente, deve estar infectado de dependência. Um absurdo total. Não importa como se queira argumentar, a obediência devida, a adesão e a subordinação que caracterizam o estilo dependente não são recomendáveis.


A epidemiologia do apego irracional é preocupante. Segundo os especialistas, metade das consultas psicológicas se deve a problemas ocasionados ou relacionados com a dependência patológica interpessoal. Em muitos casos, não importa o quão nociva for a relação, as pessoas são incapazes de colocar um fim nela. Em outros, a dificuldade reside numa incompetência total para resolver o abandono ou a perda afetiva. Ou seja: ou não se conformam com o rompimento ou permanecem, inexplicável e obstinadamente, numa relação que não tem pé nem cabeça.

Uma das minhas pacientes fazia a seguinte descrição da sua "relação amorosa": "Faz doze anos que namoro, mas estou começando a me cansar... O problema não é o tempo, mas o tratamento que recebo... Não, ele não me bate, mas me trata muito mal... Diz que sou feia, que tem nojo de mim, sobretudo dos meus dentes, que meu hálito cheira a... (choro), dói dizer isso: cheira a podre. Quando estamos num lugar público, faz com que eu caminhe na frente para que ninguém o veja comigo, porque ele sente vergonha. Quando lhe dou um agrado, se não gosta, grita que sou boba ou retardada, estraga o presente e o atira no lixo, morto de raiva... Sou sempre eu quem paga. Outro dia, levei um pedaço de torta para ele e, como ele o achou pequeno, atirou no chão e o esmagou com o pé... Eu comecei a chorar. Ele me ofendeu e me disse para sair da casa dele, que se eu não era capaz de comprar uma mísera torta não servia para mais nada. Mas o pior é quando estamos na cama. Ele se aborrece com meus carinhos ou abraços, isso sem falar dos beijos. Depois de se satisfazer sexualmente, se levanta em seguida e vai se lavar (choro)... Diz que periga eu contaminá-lo com alguma doença, que o pior que pode acontecer a ele é levar algum pedaço meu grudado no seu corpo... Ele me proíbe de sair e de ter amigas, mas tem muitas. Se eu faço alguma cobrança sobre o fato de ele sair com mulheres, me diz para terminarmos, que não vai agüentar uma namorada insuportável como eu".

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