PLANTADO NA LIXEIRA

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Meu avô, Geraldo Corneteiro, sempre fez de um tudo na vida, e com habilidade de um profissional.

Daí, com certa frequência, costumava ser chamado para construir muros de adobe e cercas de bambu na vizinhança. Essas cercas de taquara e muros de adobe não separavam as pessoas, mas nossos animais de criação.

Naquela época, era muito comum as famílias das pequenas cidades cuidarem da engorda de porcos, da criação de galinhas e do trato de patos e codornas no quintal. Morávamos numa cidade histórica, mas nosso dia-a-dia era de uma zona rural qualquer. E a exemplo do povo da roça, tínhamos carinho, respeito e muito cuidado pelos nossos parentes, amigos e vizinhos.

Até então, antes de ir para a escola, não sabia que muros e cercas separavam e dividiam as pessoas. E muito menos, que a cor da pele poderia erguer paredes e barreiras enormes entre elas. Soube disso aos 7 anos de idade. Quando no grupo escolar a diretora, em resposta à minha natureza violenta, ordenou que eu, o pardinho, ficasse atrás da porta, até o final da aula.

Em silêncio, as crianças carregavam um sorriso plantado no olhar. Quase todas queriam me ver pelas costas. Fosse eu um inseto, seria pisado e abatido, ali mesmo, sem piedade. A professora nada pode dizer em minha defesa. A diretora não daria ouvidos. Aliás, em nome "da lei e da ordem", não caberia argumentos.

E assim, vivendo naquele país "incrível", de "gente que se agigantava e andava pra frente", me colocaram num cantinho da parede, plantado na lixeira, atrás da porta.

Mas não fui eu quem deu início a tudo aquilo, não. Fui provocado a fazer o que não devia.

E fiz.

NARCISO CEGOOnde histórias criam vida. Descubra agora