"Eclipse em um Lampejo de Luz" *XueXiao*

~72~

Os ventos se tornaram agressivos e mais pesados conforme a noite foi correndo. Em uma tenda dois corpos emaranhados caíram em pouso, agora o ser em vestes brancas se encontrava nos braços de Xue Yang, a cabeça em seu peito e os braços ao redor da cintura fina. Ambos estavam em paz, nem mesmo um único pensamento sombrio assolou Duas Faces em Sangue e a sensação de estar protegido contra o mundo dominou Xiao Xingchen.

Mas enquanto todos dormiam, Lan Xichen observou quando uma ave partiu do aposento de Jiang Cheng e disparou em direção aos céus levando alguma mensagem para algum lugar.

Sua cabeça parece pensar por muito tempo antes de qualquer movimento ser feito, parecia claro que o líder Jiang ainda estava desperto, talvez ele simplesmente não consiga dormir tão facilmente com o uivar do vento estando tão agitado, mesmo Lan Xichen despertou com o mesmo. Seus dedos passam por seu robe sem dobra alguma antes de sair da entrada de sua própria tenda, os passos leves não fazem nem mesmo as folhas do chão se mexerem, sendo silenciosos e sutis, mas ainda assim facilmente perceptíveis para Jiang Cheng que quase que no mesmo instante encara a entrada de sua tenda esperando a figura de ombros largos surgir em meio a escuridão.

"Já passou de seu horário de dormir" Ele diz em tom de provocação "Lan Huan sendo um mau exemplo de conduta impecável."

Lan Xichen sorri ao entrar no local "Desconfio que já não exista mais tantas pessoas que são verdadeiramente impecáveis, estamos suscetíveis as curvas das falhas."

Jiang Cheng assente "O vento não me deixou dormir."

Lan Xichen se aproxima da cama a qual o belo cultivador está sentado neste momento, com apenas os dois faróis de seus olhos brilhando na quase penumbra, o acolchoado se abaixa quando o peso se torna maior.

"Eu imaginei que ainda não suporta o vento sussurrando para você o tempo todo."

"Não mesmo... prefiro ouvir sua flauta ou sua voz do que o vento, sinto que meu corpo está cansado mas nestas circunstâncias não conseguirei dormir."

"Não posso tocar uma melodia para você agora... mas posso ficar aqui ao seu lado."

Jiang Cheng sorri "Isso seria bom."

Com um sorriso contido Lan Xichen deita ao lado de Jiang Cheng que faz o mesmo, ambos próximos mas sem encostarem verdadeiramente um no outro "Está preocupado com Jin Ling?"

Jiang Cheng olha para o mesmo "Quer saber sobre a mensagem que a ave levou?"

As orelhas de Lan Xichen ficam ruborizadas, ele não tem o direito de querer saber tanto sobre a vida do outro, afinal, apesar da proximidade ambos possuem vidas distintas e consequentemente com suas ações que não são facilmente expostas...

"Não, eu apenas quis saber se está mais tranquilo em deixá-lo sozinho em Yunmeng."

"Ainda me preocupo com ele, mas acho que ele não fará nada muito errado. Não é você que vive me dizendo que ele não é mais uma simples criança imprudente que não sabia sequer manejar uma espada direito?"

Lan Xichen assente apesar de saber que por dentro do peito do líder Jiang, uma apreensão se formava. Jin Ling em breve deveria assumir a Seita LanlingJin oficialmente, pois a mesma sofria suas influências mas a maior parte do tempo, Jiang Cheng fora responsável pelas duas potencias, mas com o nível de seu sobrinho crescendo, era inevitável o dia em que o filho de Jin ZiXuan assumiria o lugar que deveria ter sido de seu pai. Mas o Jianghu é um lugar sombrio, estar à frente de uma grande seita é perigoso, pois sempre haverá pessoas tentando apagar a sua marca, algo que preocupava muito Jiang Cheng, a chegada do dia em que ele não poderia mais proteger totalmente Jin Ling.

Um suspiro sai de seus lábios no exato momento em que Lan Xichen se levanta, se sentando na cama.

"Achei que ficaria."

Ele sorri e derrepente o local é preenchido por uma energia azul clara, a redoma envolve toda a tenda em questões de instantes, os dedos longos claros como um cristal límpido se move até sua cintura, retirando a flauta de jade da mesma, seus olhos se voltam para Jiang Cheng que tenta disfarçar um sorriso nos lábios.

"O que é isso agora?"

"Uma redoma que impede o som de sair deste lugar, desta forma a música não incomodará o sono de ninguém, mas ainda assim poderia tocar para que você descanse um pouco."

"E você?"

Ele dá de ombros "Eu estarei aqui."

Após as últimas palavras serem proferidas a flauta de jade encontra os lábios avermelhados, as primeiras notas recaem pelo ambiente fazendo com que tudo e todos em seu interior fossem preenchidos por uma sensação de paz e leveza... Jiang Cheng pousa sua cabeça novamente, os olhos sempre em Lan Xichen que apesar de fechar os olhos vez ou outra sempre o observava, com um brilho incomum brilhando na escuridão de suas pupilas dilatadas.

As vestes roxas de tecido fino escorrem pelo corpo bem estruturado de Jiang Cheng a cada movimento do mesmo, quando ele se gira um pouco uma simples fenda do robe interno revela a lateral de sua perna direita, os contornos à meia luz que faria os deuses duvidarem se seus poderosos palácios eram verdadeiramente algo belo. Por um segundo a melodia se cessa fazendo Jiang Cheng rir, meio entorpecido pelas notas, uma partitura usada para trazer paz para as mentes mais perturbadas.

"A-Huan esqueceu a partitura?"

Lan Xichen tira a flauta dos lábios e observa a figura tão leve na cama, com os olhos finos e um brilho presente no interior destes, com os lábios entreabertos e o rosto calmo... tão diferente do imponente Jiang Cheng que despertaria ao nascer do sol.

"Apenas me distrai por um instante."

"Se distraiu com o quê?"

Lan Xichen sorri e não responde, logo ele volta a tocar, e observa quando os olhos do ser deitado se fecham lentamente, quando julgou que o mesmo já havia dormido e a música parou, um sussurro leve surge em meio ao silêncio.

"A-Huan... quando você está comigo não me sinto sozinho."

O coração de Lan Xichen parece ter escorregado por entre seus dedos, incapaz de conter seus desejos ele se aproxima se abaixando lentamente até que seus lábios encontrem a testa do outro, uma lágrima solitária parecia querer descer neste momento.

■ ■ ■

Sob as notas de uma doce flauta, um sentimento profundo se estendia
O poderoso raio roxo que trazia imponência
Se transformava em nuvens suaves com o cair do dia,
Em meio ao desamparo a semente floresceu de um amor que marcava sua permanência

Havia dor em corações partidos,
Que encontraram sorrisos em uma tarde de primavera,
Quando as pétalas delicadas despencavam em busca de abrigo,
Cobrindo os caminhos em que a neve estivera

Sobre as linhas tecidas nas estrelas,
Um jade límpido passava a desenhar,
Linhas que ligavam seu destino com aquele que em páginas amarelas viria lhe encontrar

A flor roxa despenca do céu,
Encontrando novamente o intenso vermelho sangue,
As nuvens claras ainda a desejava nos instantes de sol e na solidão do breu,
Palavras incertas escrevem o futuro de três seres distantes.