Prólogo

1K 105 9
                                    


Os ventos solitários do equinócio faziam tremer a superfície da água gélida do Rio do Esquecimento, em seu fluxo interminável que nunca parecia se abater pelos lamentos e gemidos sôfregos das pobres almas que esperam por seu julgamento, e o fluxo jamais se abatia pelos sons agoniantes e repetitivos que soavam por trás dos muros que guardavam a Cidade Fantasma.

Um dos fantasmas cadavéricos que guardam de prontidão os vastos portões da cidade moribunda, reclama do tempo árido, mesmo que no Reino Inferior muitos perdem a noção do passar das estações, a vida se fora à  muito tempo e com ela as sensações e sentimentos.

Do outro lado dos portões, para além das paisagens grotescas e negras, o Ceifador sentado no centro de um conselho circular, segura uma balança em sua mão, pronta para proclamar o destino do cultivador preso em correntes grossas.

"Sua linha karmica trás más previsões... se sua alma queimar pela eternidade ou sofrer intensas torturas por inúmeros milênios, ainda assim você teria uma reencarnação marcada por uma vida infeliz, mas viveria o bastante em agonia para pagar por seus crimes."

O cultivador manchado de sangue solta uma risada que ecoa por todo o Palácio, as correntes tremem nas mãos do pobre guarda que o segurava, se ele ainda tivesse um coração, certamente teria parado de medo.

"Acha engraçado os infortúnios que lhe esperam?" um dos grandes nomes do conselho faz a estrutura tremer com sua voz de trovão.

O cultivador levanta o rosto, um sorriso manchado do mais puro sangue está desenhado em sua face.

"Parece divertido."

Quando o agente da justiça eterna estava pronto para punir a presunçosa alma, suas mãos são paradas por uma rajada de vento saída das mangas do Ceifador, que pela primeira vez tira seu rosto da penumbra, revelando uma máscara fria como jade. Sem expressão.

"Xue Yang, responsável pela liquidação de um clã inteiro, não poupando uma única vida, mesmo de inocentes" a pausa parece durar uma breve eternidade. "Levou um cultivador justo com um futuro promissor a tirar a própria vida, tendo sua alma dissipada como poeira. O caminho de sangue é marcado por impiedade e sadismo... Como se declara?"

"Culpado" um sorriso permanente está em seus lábios, como se nada pudesse levá-lo a sentir medo "Creio que o Ceifador se esqueceu de adicionar minha conspiração ao caminho impuro."

"Sinta-se tranquilo pois não terá falhas em sua punição... por unanimidade o condeno a dez mil anos de tortura em seu limbo de dor e após o fim da sentença sua alma será dissipada e nunca mais poderá voltar ao mundo mortal."

Por detrás da máscara de jade, os olhos do Ceifador brilham em chamas translúcidas, sua sentença trouxe um grande falatório nos lugares ocupados na bancada. Xue Yang ainda preso em correntes, não diz nada, nem mesmo um murmuro saí de seus lábios metálicos.

"O que é isso?" a voz do guarda soa e seus longos dedos apontam para o ciclo de vida e morte de Xue Yang.

Os olhares ávidos se voltam para sua linha, e algo nunca antes presenciado parece se formar.

Uma ramificação levada por uma tribulação em sua linha de vida e morte, transforma a sentença proferida em algo incerto. Como se os deuses em seus palácios de jade e ascensão imortal fossem contra a dissipação da alma maligna presente.

Os Céus, possuem seus preferidos, aqueles escolhidos e tecidos pelo destino para serem grandes heróis com um nome que irá persistir pela eternidade, o caminho justo os levaria a verdade do Dao, tendo a divindade como inevitável destino.

Quem poderia saber que aquele que fora enganado e levado ao mais puro desespero por Xue Yang seria um querido pelos céus. Xiao Xingchen teve seu destino interrompido e cortado sem nenhum aviso premeditado, e sua alma se dissiparia ao ponto de jamais poder se juntar novamente, desaparecendo por completo de todos os reinos e camadas do tempo.

"Eclipse em um Lampejo de Luz" *XueXiao* Onde histórias criam vida. Descubra agora