Revelações em cadeia

20 3 0
                                    

- Nem Cromo nem tu pertencem ali. São melhores que isso. - ele encara-me, massageando o meu queixo, de forma suave e detalhada. Eu coro mas isso não faz com que a minha curiosidade se desvaneça. 

- Então porque estávamos lá? - eu questiono.

- Eles estão a usar elementos para experimentar o processo de conversão. Foi por muitos séculos estudado, mas só agora é que está a dar "frutos". Pelo menos a nível teórico, alguns loucos acreditam que é possível mudar a força a que um elemento pertence.

- Loucos como tu? - eu intercalo-o. Agora faz sentido o porquê de tantos elementos estarem a desaparecer nestes últimos tempos. Eu lembro-me repentinamente de Cobalto. Dói como uma flecha no peito. Ele abre a boca para falar mas eu impeço-o de o fazer. - Foi isso que aconteceu a Cobalto?

O meu olhar muda e ele consegue perceber isso instantaneamente. Provavelmente ele capta a raiva que passa pelos meus átomos, à medida que cerro os punhos. Sou incrivelmente bom a esconder emoções... Principalmente quando estou perante ele.

- Bem... ela foi um completo sucesso. Para a comunidade científica matemática, claro. Rumores por aí dizem que ela foi a primeira a ser convertida de força. Mas também dizem que lhe mudou completamente a personalidade. Não sei se é verdade ou não, mas isto foi o que ouvi. Acredito, no entanto, que possa ter acontecido. Infelizmente não estava lá para ver...- ele solta um riso cínico e eu fico perplexo. Reviro os olhos e tento afastá-lo do caminho, mas não consigo porque ele me empurra de volta. Então eu simplesmente ignoro-o, não conseguindo sequer olhar para ele.

Arsénio repara claramente na minha mudança de humor e agarra-me no braço, puxando-me para ele. Não o encaro. Como é que lhe pode faltar tanta empatia? Ainda por cima para com uma amiga minha. E ele sabe disso. Mesmo que fosse uma brincadeira, isto é um assunto sério. Sinceramente, há limites.

- Ei, Níquel. Está tudo bem. Eu só disse isso porque eu não gostava dela. Achas que eu não reparei na vossa proximidade? Ainda há uns meses estavas caidinho por ela. Eu reparei na forma que olhavas para ela. Ainda bem que isso mudou ultimamente. Já tinha planos para me livrar dela, se isso continuasse. Assim, da forma que ela ficou, nunca voltarás a olhar para ela da mesma maneira...e isso é um alívio.

Eu suspiro gravemente. Eu percebo a intenção dele, pois não posso ser tão hipócrita a nível de não me pôr no lugar dele. Seja como for, é meio estranho da parte de Arsénio admitir isto tudo tão facilmente. Para além disso não é essa a questão que se coloca aqui.

-Ela era minha amiga, seu... - Eu olho-o enraivecido, não querendo dizer nada que não me venha a arrepender mais tarde. A este ponto, já sei minimamente do quê que ele é capaz de fazer. Ele sorri e eu desvio o olhar, tentando me acalmar. - Ela é minha amiga e namorada do Cromo, nada mais. Eu tenho o direito de me preocupar com ela e isso não é da tua conta. 

- A partir do momento que alguma situação te incomoda, é da minha conta sim. Aliás, tudo o que te diz respeito diz-me respeito a mim também. Eu vou mostrar-te isso daqui para a frente. - ele parece mais distante e magoado, dizendo esta última parte. Eu sinto-me mal instantaneamente. Odeio este ambiente e só quero resolver as coisas. Ele até pode ser um "monstro", mas eu não consigo evitar de me sentir mal se o magoar. Ser tão sensível... é o meu maior dom mas também a minha maior vulnerabilidade. 

- Desculpa, não queria falar assim. Vê, não te quero magoar. Eu sei pelo que passaste e perdoou-te pelo que me fizeste. Mas por favor da próxima não me ocultes tanta coisa... eu quero estar informado e poder ajudar-te, assim como atuar se for preciso. - as minhas palavras têm rapidamente efeito nele, visto que um sorriso fofo e inocente se vai expandido através dos seus lábios. Eu sorrio de volta e abraço-o. Inesperadamente, ele começa a soluçar no meu ombro e eu sinto compaixão por ele. Afinal, será que no seu lugar, eu seria melhor? Penso que não. Ele já passou por muita coisa.

- Está tudo bem, podes chorar à vontade. Eu vou estar sempre aqui para ti. - finalmente me sinto tranquilo enquanto ele me abraça de volta, fortemente. 

Passado uns momentos, o abraço finalmente acaba e nos separamos lentamente. Ficamos a olhar um para o outro durante algum tempo e questiono-me se perdi finalmente o juízo. A ajudar um elemento destes... por que motivo o faço? Eu sei os riscos que estou a correr. Não pode ser só a minha empatia a falar... será que há algo mais?

- Arsénio... Eles iam-nos converter, a mim e a Cromo. Isso significa que ambos pertencemos a outra força sem ser Matemática... Podes me dizer qual é? E já agora, a de Cobalto também. Eu estou a morrer de curiosidade. Eu quero saber sobre as outras forças. - eu declaro e ele desvia o olhar, embaraçado.

- Ah, bem, desculpa... tinha-me esquecido desse pormenor. Enfim, eu... acho que posso. Já deves ter reparado que ambos, Cobalto e Cromo, são ligeiramente azulados. Sim, isso tem alguma coisa a ver, antes que perguntes. A cor da força "química" é essencialmente o azul, e todos os seus tons. Não me perguntes porquê, tem a ver com factos históricos, penso eu. Seja como for, há elementos que são azuis e não servem esta força. Mas quando estes elementos são monocromáticos e azulados fisicamente, o mais provável é serem desta força. Por acaso estes elementos são usualmente mais difíceis de converter, segundo as previsões teóricas e a lógica. Por isso é que consideraram Cobalto um sucesso tão grande. Mas também há teorias que dizem que ela está simplesmente a fingir. Quem sabe? - ele admite, desviando um pouco o tópico da conversa, na esperança que eu o siga.

- Acho que ela não faria isso... Mas eu quero saber sobre mim também. Eu não sou azul. E não sou monocromático. Qual é a minha força?- eu questiono-lhe diretamente. Ele surpreende-se com a minha forma astuta de perguntar mas sorri, pensativamente. Ainda leva alguns segundos para me responder.

- Bem, Níquel, pode parecer estranho, mas tu és de física. És como eu. Aqueles que podem ser tão fiéis quanto traidores. Os mestres da ocultação, da intriga e da ambição. Aqueles que todos invejam e anseiam. O universo pertence-nos, e possuímos inteligência à mesma medida que loucura, o equilíbrio perfeito para criar o caos perfeito: a conquista de tudo e de todos.

Eu coro. Não acho que me enquadre perfeitamente naquela ideologia, mas também não discordo totalmente. A fala dele deixou-me confuso e não sei realmente se acreditar naquilo.

- Arsénio, os nossos poderes são meio diferentes. - eu coço a nuca, finalmente tendo arranjando alguma desculpa racional o suficiente para o contrariar. Sei que se fosse pelo lado emocional, ia acabar por me perder.

- Eu sei, mas é porque eles devem estar descalibrados. Como os descobriste há pouco tempo, é normal que aconteça. Os meus poderes nem sempre foram assim. E já reparaste que ambos temos os olhos de diferentes cores, assim como a cor de pele e o cabelo são diferentes? Há preceitos que dizem que tu nasceste para ser meu assistente principal, enquanto dominamos todas as galáxias. E eu sei que isso irá acontecer.

Eu estou indeciso. É verdade o que ele disse, mas também é verdade que existem vários elementos por aí que são policromáticos. A proposta indireta dele é tentadora, e mostra um futuro brilhante e de sonho. O que mais poderia eu pedir? 

Mas será que eu realmente me enquadro nessa pintura?... Será que eu seria capaz de abandonar tudo e todos para ir com ele, numa vida de sonho desmedido?

Será que eu nasci para servir esta mesma força?

...


Se não acreditas naquilo que Arsénio te falou, segue para o capítulo seguinte.

Se, por outro lado, achas que Arsénio disse a verdade, vai para o capítulo 11.

A Ciência Aproximou-nos [2]Onde histórias criam vida. Descubra agora