Rumo ofuscante

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Eu aceno rapidamente a Nitrogénio, para esta escapar dali, enquanto confronto Cobalto. Ela olha para mim por uns instantes e então obedece. Cobalto tenta impedi-la mas eu faço um escudo que protege Nitrogénio de todos os ataques iminentes.

Suspiro quando a porta se fecha automaticamente. Agora não me posso desconcentrar. Esta batalha ainda não acabou. Cobalto ordena ao seu ajudante para me atacar por trás, mas eu percebo logo o esquema , me desviando por cima dele. Entretanto crio uma jaula de lianas fortes para o poder deter, para que este não perturbe a conversa que tenho de ter com Cobalto. Ela está fora do seu juízo.

- Cobalto, ouve-me, não te lembras de mim? Eu sou teu amigo, o Níquel! Como é que podes ter te esquecido? - questiono-lhe, indignado enquanto a seguro para esta não me poder atacar. Ela parece-me encarar por uns momentos, confusa, mas depois abana a cabeça em negação, levemente irritada.

- A matemática está onde não a podes ver. Ninguém a pode impedir. - ela declara, e subitamente sinto uma espécie de forças invisíveis a empurrarem-me contra a parede, pressionando-me contra a mesma, fazendo com que eu não me consiga mexer. Começo a desesperar. Ela realmente não se lembra?

- Cobalto, como é que achas que sei o teu nome? E sei muito mais do que isso. Sê razoável. Ouve o teu interior e não apenas as vozes na tua cabeça. Eu sei que farias isso por mim. E pelo Cromo. Não te lembras dele? - eu interrogo-a, tendo quase a certeza que ela se lembraria se tocasse no nome dele.

Ela engole em seco mas rapidamente me responde, não da forma que eu estava à espera: com um soco na cara. Acho que aquilo magoa mais o meu ego do que realmente me magoou fisicamente. Cuspo sangue. Tenho de continuar a lutar, apesar de Nitrogénio já estar a salvo, eu sei que ninguém me vem salvar a mim. 

- Porquê que nem sequer me dás uma chance para te convencer? Eles realmente fizeram-te uma lavagem cerebral, não foi? Eu não sei quem são "eles" ao certo, mas odeio-os agora mais do que nunca. Sabes? Eu realmente adorava-te, eras uma amiga especial para mim. - eu declaro, ofegante devido a estar-me a desviar simultaneamente dos ataques dela. Sinto as lágrimas a distorcerem-me a visão... não posso enfraquecer agora. Se for necessário, acabarei com isto tudo, mas não vou deixar Cobalto desta forma.

- E nós odiamos-te a ti, por isso acho que é justo. - ela afirma e eu sinto algo dentro de mim a partir. É demasiada carga emocional para eu aguentar... as lágrimas começam a derramar. Um facto sobre mim é que não consigo lidar com a raiva e tristeza simultaneamente de forma saudável.

Eu olho para Cobalto e para o estúpido assistente, claramente irritado. Fecho os olhos e cerro os punhos. Nunca antes na minha vida tive esta sensação: de querer tanto demonstrar a maneira como me sinto aos outros, sem pensar nas consequências.

Sinto o chão tremer, tanto que já nem sei se é da minha imaginação... assumo que esteja a enlouquecer. Mesmo assim, não consigo ter a coragem de abrir os olhos. A situação está caótica, dentro de mim. A minha cabeça está a matar-me agora. Talvez seja ainda devido à pancada que dei contra a porta. Sinto a ferida abrir-se novamente, aos poucos. Será este o final?

O sítio desmorona-se de forma brusca mas previsível, pelo menos para mim. Eu abro os olhos, por fim, gradualmente e lentamente. Tudo o que consigo ver é caos e destruição, e sinto-me gravemente culpado. Eu não queria isto. Só queria que tudo fosse como antes era.

De repente, perco a consciência.

Horas passam-se. Imóvel, sucumbido, sozinho: como todos acabam no final, só pensei que o meu não fosse tão cedo. Nada se passa, de nada tenho perceção. Como será que eles ficarão sem mim? Será que faço diferença alguma? A única família que sempre tive fazia-me sentir incrivelmente inútil.

A luz. Sinto a luz raiar sobre a minha pele, iluminando-me a cara de forma quase ofuscante. Mantenho os olhos fechados. Alguém me toca. Quem se ousa a perturbar o meu descanso eterno? (ler com voz interna dramática)

Ouço uma voz, suave, mas preocupada, chamar pelo meu nome, sussurrando ao meu ouvido. A dor está presente na mesma, de uma forma crescentemente agravada. Sinto-a a se aproximar, o que me dá arrepios. Depois umas mãos, grandes e seguras de si, abanam-me, fortemente. Estarei a sonhar? Não é só um ser. Não pode ser. 

Recupero a minha visão, lentamente. A luz do sol fere-me um bocado os olhos, por isso tento evitá-la ao máximo. Por esta ser tão forte, julgo ser ainda de tarde. Parecia ter passado muito mais tempo, desde que tudo acontecera. Finalmente reparo nos responsáveis pela interrupção do meu sono. Nitrogénio e Arsénio. Quem mais seria? Eu suspiro, e mesmo um tão simples gesto demonstra-me o quão fraco estou. As dores físicas são imensas. Atordoado, sento-me e observo o meu redor. Nitrogénio salta para cima de mim, abraçando-me. Eu gemo de dor, baixinho, e ela rapidamente se desculpa. Arsénio sorri para mim. 

- Ainda bem que estás acordado! Eu,... quer dizer, nós, estávamos tão preocupados! Ainda tentei falar com Arsénio para ver se ele sabia o que aconteceu, e sobre esta história toda, mas ele está tão confuso quanto eu. Decerto é um mistério! Mas ainda bem que estás bem! - ela diz, entusiasmada, enquanto me faz festinhas no cabelo. 

Eu encaro Arsénio e ele encara-me de volta, sem dizer uma palavra. Acho que ambos sabemos naquilo que o outro está a pensar. Não sei se Nitrogénio realmente é tão inocente assim, pois confiar em alguém neste momento está a tornar-se complicado para mim. Seja como for, não posso evitar de me sentir culpado, de certa forma, pelo que aconteceu aqui. 

Tudo está em ruínas e a única coisa que resta fazer é sair daqui. Espero não ter ferido ninguém gravemente, pelo menos não mais do que me feri a mim próprio. Com o apoio dos meus...amigos, levanto-me, e eles praticamente "arrastam-me" aos poucos para um táxi que Arsénio chamara entretanto. 

Nitrogénio ainda me agradece pelo que eu fiz por ela, sussurrando-me ao ouvido. Não tenho forças para lhe responder, mas desejando que as tivesse, fico a pensar para mim mesmo que "não fiz mais que o meu dever, sabendo que eu tinha o poder de tudo isto ter evitado em primeiro lugar". A estrada pela qual me arrasto parece mais longa do que qualquer outra estrada que eu atravessei antes na vida. Dirigindo-me para o táxi, pergunto-me, que mentira dissimulada todos irão inventar para explicar o caos que acontecera neste sítio tão desprezado da cidade.

Fica atento, pois a história terá continuação no próximo volume...

A Ciência Aproximou-nos [2]Onde histórias criam vida. Descubra agora