Futuro incerto

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Escolheste: Acreditar naquilo que Arsénio te disse.

Passado uns minutos pensativos, acabo por perceber que não tenho nenhum argumento contra aquilo que Arsénio declarou, aquele astuto elemento que se encontra à minha frente, parado, à espera de uma resposta da minha parte. Até diria que é xeque-mate para mim, mas, nesta situação, acho que é mais uma vitória para ambos os lados. Não me importo do que tenha de fazer, quero ser imortal e memorável por todos, sempre foi o que ambicionei. E agora está aqui a minha grande oportunidade, não a posso deixar escapar. Para além disso, irei conseguir desenvolver e evoluir muito mais os meus poderes com a ajuda dele, o que provavelmente não aconteceria se o tentasse fazer sozinho. Isto tudo ao lado dele, o único ser que me fez sentir esperança após tanto tempo na minha vida. Ele fez-me sentir amado, e eu, como grato que sou, tenho a obrigação de retribuir-lhe o favor, ou pelo menos tentar. Não me importa se seja para o resto das nossas eternidades. Eu quero estar do lado dele, e ajudar-lhe em todas as situações, mesmo que isso custe o resto da minha existência.

- Tens razão. - eu aceno-lhe finalmente e ele encara-me expectante. - Tocas-me como nunca ninguém me tocou antes, e isso é algo incrível. Eu acredito ter potencial como tu... só tenho de treinar mais. Ao teu lado sei que seremos capaz de conquistar tudo o que quisermos... só não podemos nos separar em chance alguma. Prometes isso? - eu encaro-o de volta, timidamente, oferecendo-lhe a minha mão.

Ele suspira e sorri, fazendo com que toda a tensão que se encontrava no espaço desabasse e evaporasse numa questão de segundos. Arsénio coloca a sua mão na minha, e o meu corpo recebe choques só pelo contacto físico que estamos a partilhar. Ele então puxa-me e aproxima-me para me abraçar fortemente. Eu abraço-o de volta, reconfortado pelo seu carinho. Sinto a respiração dele por todo o meu corpo e para mim este é um momento indescritivelmente íntimo. Não quero sair nunca daqui. Este elemento transmite-me confiança, tranquilidade e não sei como mas também segurança, algo que eu nunca senti com ninguém. Pelo menos não de forma tão intensa. Apesar de tudo o que já aconteceu entre nós, eu só quero estar perto dele. Sei que com ele recebo a energia necessária para enfrentar qualquer obstáculo que possa eventualmente aparecer entre nós.

Sinto a minha pele queimar, e então abro os olhos. A minha pele e a dele estão a brilhar. Ele encara-me de volta, será que é aquilo que eu estou a pensar? Fusão, a ligação mais profunda que pode ocorrer entre dois elementos para que se forme uma molécula. Uma conexão inquebrável, pelo menos até onde os elementos a quiserem levar. O calor dentro de mim, não, dentro de nós, começa-se a alastrar por todo o lado. A luz torna-se tão ofuscante que sou obrigado a fechar os olhos, embora quisesse ver o que ia acontecer. É a minha primeira vez numa situação destas. Será que as nossas emoções estão finalmente interligadas?

Quando reabro os olhos, já não sou eu. Somos nós. Os nossos pensamentos estão ligados, e são tão confusos que não dão para sequer descrever. Deambulo até ao espelho do hall de entrada. Uma figura estranha aparece refletida do outro lado do espelho. Sorrio sem motivo e fico a apreciá-la por uns minutos. 

Um olho verde e outro vermelho brilham intensamente no vidro do espelho. O meu cabelo é vermelho metálico, com algumas madeixas de um cinzento vivaz. Manchas de um amarelo queimado sobressaem na minha pele levemente esverdeada. A intensidade das cores contrastam com a madeira apodrecida que emoldura aquele velho espelho. A sensação de um poder maior alastra-se pelos meus átomos à medida que inspiro. É algo novo e incrível. Nenhum de nós fala nada. Não há necessidade para isso, agora que temos a completa perceção daquilo que o outro pensa. 

...


Uns anos mais tarde


Dia 1617

Estamos longe de estar sequer a meio da nossa jornada intergaláctica. Este é um dos excertos da reportagem diária que decidi realizar, enquanto estivermos a bordo na nave AFLP-57.

O dia não começa bem. Houve um problema remoto com o motor inferior da nave. A azafama iniciou-se logo, isto eram 12h37. Fui imediatamente procurar o comandante, para receber informações e ordens. Arsénio exigiu que o mecânico presente a bordo fosse contactado nesse preciso momento, e foi o que fiz. Eu fiquei lá para ajudar o mecânico, visto que já me encontro na tripulação há mais tempo do que qualquer outro, e conheço melhor as instalações. Para além disso, sou o braço direito do comandante. O calor lá era ofegante, tanto que me fez suar. Acabou por ser algo bem mais simples do que inicialmente pensado, pois foi apenas necessário a troca de umas peças. 

Após horas parados, o nosso rumo a novos planetas teve a sua continuação. Com 264 planetas dominados, isso fez-nos subir no ranking, para a segunda Força com mais planetas. É um marco importante para a Física, que nunca possuiu tantas conquistas antes como neste momento. Glorifico muito o meu mestre e estou completamente grato por poder estar presente em cada um dos momentos mais especiais da sua vida. Palavras nunca seriam capazes de descrever a minha lealdade por ele. Estou feliz por estarmos cada vez mais próximos. Também já sei controlar os meus poderes, embora hajam vários rumores na tripulação que eu sou estranho e que eu não pertenço aqui, devido aos meus poderes serem ligeiramente diferente dos demais. Por exemplo, eu consigo controlar material orgânico, coisa que eles não conseguem e suponho que seja por isso que me invejam tanto. Ou então é pela minha relação com o chefe.

Todos já repararam na proximidade que tenho com ele. Eu não teria coragem de avançar e fazer algo louco, não por enquanto, pelo menos. Mas cada vez que alguém se tenta aproximar dele nesse sentido eu faço de tudo para os impedir. Não quero que Arsénio perceba isso, no entanto. Não sei o que aconteceria. Não sei se ele me dispensaria. Penso que não, devido à nossa ligação, mas tudo é incerto. Uns dias ele parece tão próximo, e noutros, tão distante. Seja como for, estou feliz por estar aqui e prestar-lhe os meus serviços. A felicidade dele é o que mais importa para mim. Tenho a certeza que ficaremos juntos, mais cedo ou mais tarde. E ele também sabe disso. 

São aproximadamente 17h23 quando chegamos a solo desconhecido. Cromo, o nerd a bordo, calmamente aparece na cabine e informa que planeta é aquele, olhando para o seu ecrã portátil. Eu estou ao lado direito de Arsénio, parado, de pé, como todas as vezes em que isto acontece. O meu senhor então levanta-se para ir ter com ele. Uma ponta de raiva acerta-me no peito, como sempre. Mas eu sei que Cromo é essencial ali, e também sei que eles não partilham nenhuma conexão mais profunda. Eu mantenho-me no meu sítio, à espera que Arsénio se dirija a mim, para eu chamar as tropas. Ele dispensa Cromo e então aproxima-se de mim, fazendo o meu núcleo acelerar. Eu tento não transparecer as emoções, pois tenho de manter o profissionalismo. Mesmo assim acho que ele consegue ver através de mim. Contudo, dá-me a mesma ordem de sempre: «Contacta todos os setores, vamos batalhar para ganhar.»

No entanto, quando me afasto para o fazer, ele agarra o meu braço e puxa-me na sua direção, fazendo com que me vire. Ele olha para mim e eu coro instantaneamente. Agora isto eu tenho a certeza que não consigo ocultar dele. Arsénio sussurra-me: «Eu aprecio muito o teu trabalho aqui. Obrigado por tudo. Ainda te amo como no primeiro dia...» , beijando-me suavemente de seguida.



A tua história termina por aqui.

A Ciência Aproximou-nos [2]Onde histórias criam vida. Descubra agora