24

465 20 2
                                    

11:00

- Doutora, tem boas notícias?

Antes de entrar para a sala de internamento, virei-me para trás e encontrei os quatro novos donos do animal em recuperação, acabados de entrar na clínica.

Voltei a encostar a porta, aproximando-me dos familiares preocupados e ansiosos.

Mostrei um sorriso de imediato.

- Bom dia. Tenho boas notícias, sim. - Os olhos iluminaram-se instantaneamente. - Recuperou a temperatura e está a comer por iniciativa. No entanto, o nosso especialista de Ortopedia está neste momento com ele.

- Tão bom. - A mãe, Sra. Ana Isabel, deixou transparecer o seu alívio. - Vão sentar-se com o pai um bocadinho, está bem?

As meninas fizeram exatamente o que lhes foi pedido, assim como José. Era evidente que não estavam recuperadas do trauma e que nao foi a melhor noite para os quatro. Podia ver o peso e o impacto do acidente.

Pelos olhos preocupados da mãe, apercebi-me que queria fazer-me perguntas e saber o que se passava realmente com o Pintarolas. O facto de ter afastado as meninas, foi uma manobra para obter a realidade nua e crua, sem as perturbar, mais do que já estavam.

- Elas não foram para a escola. Choraram a noite toda com imagens do acidente. Doutora é possível que ele sobreviva?

- Sim, claro que sim. Ele tem um ligeiro edema pulmonar, que tem diminuído a cada sessão de oxigénio que fazemos. Em relação á pata, tanto eu como o doutor Guilherme achamos que não vai ter salvação.

- Uma amputação, portanto. - Balancei a cabeça, afirmando. - Com a idade dele... Depois do acidente levar uma anestesia, não é perigoso para ele?

- É um gato saudável. A idade é um factor muito positivo, porque consegue regenerar-se e habituar-se a uma vida sem uma pata com uma maior facilidade. Vai ser um processo delicado, claro, mas vai correr tudo bem.

- Podemos vê-lo?

- Assim que o doutor terminar de o examinar, prometo que vos deixo á vontade para namorar o novo membro da família.

Trocamos sorrisos e Ana Isabel levou a notícia até á sua família ansiosa.

14:45

Terminava de almoçar, após uma longa conversa com doutor Guilherme e a família que irá acolher permanentemente o bebé. Mesmo a recorrer a vários exames, não havia uma opção, solução ou tentativa diferente.

Iria ser amputado na próxima segunda-feira e transferido para o hospital veterinário. Mesmo entristecidos com a noticia, o facto de levarem, durante o fim de semana, o animal para a casa, deixou-as muito mais animadas. Não podia ter o Pintarolas fechado durante dois dias, então o acordo chegou entre todos.

Iriam levá-lo para casa, conhecê-lo e ambienta-lo ás suas novas instalações. Expliquei como as medicações funcionavam e também entreguei o cartão com os meus contactos.

Ainda iria ficar na clínica até ao fecho.

Com o telemóvel nas mãos, olhava para a mensagem que tinha acabado de escrever. Não sabia se devia ou não envia-la. Sentia que era a nova entrada para um labirinto confuso e com o final trágico já conhecido.

HURRICANE  ➛  ANDRE SILVA Onde histórias criam vida. Descubra agora