Dois

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Entro em casa e vou direto para a cozinha; está tudo escuro, mas não me preocupo em acender a luz, ando até a pia e abro a porta do armário logo acima dela e pego um pacote plástico sem olhar o que é, vou até a geladeira e pego a jarra de chá gelado. Me sento no banquinho em frente ao balcão e abro o pacote ainda sem olhar o que é e então pego meu telefone. 

Seguro o telefone com a mão direita enquanto entro em meu perfil no Facebook e com a esquerda pego o conteúdo do pacote que está sobre o balcão sem sentir o gosto. Enquanto desso o Feed de Notícias pego o chá gelado e bebo da jarra. Alguns minutos depois coloco a mão dentro do saco plástico e sinto que está vazio, o ilumino com a luz da tela do telefone e vejo que comi um pacote inteiro de batata palha. Ótimo. Jogo o plástico na lixeira e coloco a jarra vazia dentro da pia. 

Subo devagar a escada e quando viro no corredor indo em direção ao meu quarto quase esbarro em meu pai. 

-Onde você estava? - Ele pergunta fingindo preocupação. 

-Na cozinha - digo como se isso fosse óbvio. 

-Tanto faz - ele diz. - Preciso te pedir um favor, Thomás... 

-Pode falar - digo de forma irônica. 

-Amanhã nós receberemos visita; Frederico Lourenço virá para resolvermos alguns assuntos da construção de um novo shopping... Bem, ele chegará amanhã e virá acompanhado do sobrinho dele. 

-E você quer que eu faça companhia para o garoto. 

-Sim, eles ficarão alguns dias. O garoto tem a mesma idade que você, então não será nenhum sacrifício. 

-Tudo bem - digo passando por ele. - Mas não prometo que não irei corrompê-lo. - Entro no meu quarto rindo porque sei que consegui irritá-lo. 

Vou para o banheiro e tomo um banho demorado, logo depois deito e tento dormir. 



Eu amo correr; amo sentir o corpo em movimento, o coração acelerado e o vento no rosto, amo me sentir livre... 

Eu levantei à sete da manhã (não consegui dormir), calcei o tênis de corrida e vim para a pista de corrida na propriedade no fundo de casa. 

Corro até a grama no meio da pista e paro onde deixei uma garrafinha com água, bebo metade dela e depois me deito e fico olhando para o céu - inevitavelmente pensando em minha mãe. 

Alguns minutos depois pego meu telefone, agora são 8hrs16min, e tem quatro chamadas perdidas do meu pai. Me levanto e vou andando na direção da minha casa. 



Entro em casa e vou andando pelo hall, passo em frente ao escritório do meu pai e vejo que ele está conversando com um homem de pele clara e cabelo castanho encaracolado; me apresso e vou em direção à escada antes que me vejam. Subo devagar e vou em direção à biblioteca, me assusto ao entrar e ver um garoto de cabelo castanho encaracolado (ele se parece com o homem que está no escritório com meu pai) Sentado em uma poltrona no canto da biblioteca lendo um livro. 

-Olá - digo pois ele não notou que eu entrei. 

-Ah, oi! - Ele marca o livro na página que estava lendo, se levanta e vem andando em minha direção. - Eu sou o João... João Lourenço - ele estende a mão para mim. 

-Sou o Thomás - aperto sua mão rapidamente... - Espera um pouco, seu nome não pode ser João Lourenço. 

-Posso te mostrar minha Carteira de Identidade. 

A Inútil Capacidade de Ser ReceosoOnde histórias criam vida. Descubra agora