Tormento sem fim

6 1 0
                                    

Acordado ele estava. Mas só para ter certeza ele se beliscou. Rangeu os dentes. Agora, ele estava acordado. Puxou o ar com força passando os olhos ao redor do quarto. As quatro paredes eram preenchidas por tijolos grandes bem alinhados e pintados com uma cor dourada âmbar, e o teto ficava bem distante do chão. O cômodo não era muito grande, mas isso não fazia diferença, pois dormia sozinho e passava a maior parte do tempo fora. Porém, tinha todos os móveis necessários: um armário preenchido com suas roupas habituais, uma penteadeira com espelho, uma cama macia com lençóis claros de um tom beje, um criado-mudo de cada lado da cama e velas espalhadas pelo cômodo. À frente da cama, um pouco à direita, havia a porta de entrada e saída do quarto. À direita, do lado do armário, localizava-se a porta para o lavatório; e à esquerda, do lado da parede onde estavam guardadas as suas armas, a varanda, que ficava de frente para o sul.

Constatando que estava, de fato, no quarto que arrumaram especialmente para o Príncipe de Eryn Lasgalen em Ithilien, Legolas soltou o ar e se levantou. Na verdade, ele tinha sonhos como aquele que tivera quase todas as noites. Surpreendia-se por ainda não ter se acostumado, pois tinha-os desde que vira as gaivotas brancas planando por sobre Minas Tirith, antes de o Um Anel ser destruído. E, dessa forma, lembrava-se sempre da mensagem que Gandalf, o Branco, lhe enviou da Senhora Galadriel:

Legolas Verdefolha, o bosque é teu lar!
Alegre viveste. Cuidado com o Mar!
Se na praia gaivotas gritarem por ti,
Descanso jamais acharás por aqui.

Sabia que as aves que vira o chamaram para o Mar, para o Oeste, para as Terras Imortais. Todavia, não queria ir ainda, não queria deixar seus amigos tão cedo. Porém, seu povo partia, e isso o entristecia. Seu coração desejava partir, porém sua razão pedia para que esperasse mais um pouco, até porque uma vez indo para lá jamais poderia retornar.

Legolas lavou o rosto, com o intuito de afastar esses pensamentos, pediu que trouxessem água gelada para um banho e sua refeição matinal. A água chegou primeiro, e ele logo se enfiou na banheira. Seu pelo se arrepiou, mas era justamente essa a intenção. Não queria relaxar e permitir que os pensamentos o atormentassem de novo. A todo momento, tentava escapar de pensar. Ele pensava demais! E apenas concluía que sua vida ali era um completo desperdício. Não se lembrava dos primeiros dez anos de existência, seu pai não o amava, não tinha alguém para amar..., sua vida parecia não ter sentido. Bufou frustrado: mais uma vez seus pensamentos o venciam.

Terminado seu banho, constatou que o café da manhã já estava postado na bandeja, prontinho para ser devorado. Porém, Legolas não tinha fome, e acabava deixando metade para trás. Seus sonhos, muitas vezes, não faziam sentido, pois neles via coisas que nunca imaginara. Via fumaças negras estranhas, e sempre alguns nomes lhe vinham no sonho: ora Mormeril, ora Pitya, ora Elenna. Não sabia de quem se tratavam, talvez esses nomes tivessem feito parte da vida que esquecera, mas não podia confirmar tal teoria. Aquilo era cansativo, acordava soando como se tivesse corrido uma maratona, às vezes chorando, outras sem ar. Aquilo não poderia ser normal. Ou seria? Por fim, Legolas queria acreditar que era por causa do anseio pelo Mar, no entanto sua razão o fazia pensar, pensar e pensar, até não chegar a conclusão alguma.

E, assim, os seus dias em Ithilien se passavam.

Aquele já era o quarto ano da Quarta Era, Aragorn já tinha dois filhos, um menino e uma menina. Eldarion e Haleth eram seus nomes, com apenas dois anos de diferença. E Legolas soube que Arwen queria mais filhos. O príncipe conhecera os principezinhos. Eldarion era uma criança de quase três anos adorável, tinha puxado os traços do pai com seus olhos azuis esverdeados e o cabelo castanho, além do rosto impassível, porém era doce como a mãe. Já Haleth era uma bebê com fios de cabelo pretos finos que, mais tarde, tornar-se-iam densos como os da mãe, e tinha aqueles olhos azuis enormes que pareciam ver a sua alma. Legolas não tinha muita "habilidade", como Aragorn gostava de caçoar do loiro, com crianças, porém tentava se enturmar com elas quando para a Cidade Branca frequentava.

As Asas do Poder - O Diamante da Morte - Vol. 2Onde histórias criam vida. Descubra agora