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Na manhã seguinte, Willett recebeu um bilhete do pai dizendo que Charles continuava ausente. O sr. Ward mencionava que o dr. Allen lhe telefonara para dizer que o filho permaneceria em Pawtuxet por algum tempo e não deveria ser incomodado. Isto se fazia necessário, porque o próprio Allen soube, de repente, que teria de se ausentar por um período indefinido e deixar as pesquisas, as quais precisavam da constante supervisão do colega mais jovem. Charles enviava saudações e lamentava qualquer aborrecimento que sua abrupta mudança de planos talvez tenha causado. Ao prestar atenção à mensagem, o sr. Ward ouviu pela primeira vez a voz do dr. Allen que lhe pareceu suscitar alguma vaga e fugidia lembrança que não conseguiu situar, mas que o perturbou a ponto de fazê-lo sentir pavor.

Diante desses relatos desconcertantes e contraditórios, o dr. Willett ficou francamente sem saber o que fazer. Embora não desse para negar a desesperada sinceridade da carta de Charles, que se poderia pensar do imediato descumprimento de seu próprio plano de ação proposto? O jovem Ward escrevera que suas pesquisas se haviam tornado sacrílegas e ameaçadoras, e que elas e seu colega barbudo deviam ser eliminados a qualquer custo e que ele próprio jamais voltaria àquele bangalô; entretanto, segundo as últimas notícias, esquecera-se de tudo e retornara ao âmago do mistério. O bom-senso o mandava deixar o jovem sozinho com suas excentricidades; contudo, um instinto mais profundo não permitia que a impressão provocada por aquela frenética carta se extinguisse. Willett mais uma vez a releu por inteiro e não conseguia considerar a essência tão vazia e insana quanto a verbosidade bombástica e a falta de dados concretos pareciam indicar. O terror era demasiado profundo e real e, unido ao que o médico já sabia, evocava indícios de monstruosidades vívidas demais além do tempo e do espaço para permitir uma explicação cínica. Horrores inomináveis deviam existir naquele bangalô, e embora ele não tivesse meios de intervir, precisava ficar preparado para qualquer tipo de ação a qualquer momento.

Durante mais de uma semana, o dr. Willett ponderou sobre o dilema que parecia lhe ter sido empurrado e começou a se sentir cada vez mais inclinado a fazer uma visita a Charles no bangalô de Pawtuxet. Nenhum amigo do jovem jamais se aventurara a atacar esse retiro proibido, e mesmo o pai só conhecia seu interior pelas descrições que ele escolhia dar, mas Willett julgava necessária uma conversa direta com seu paciente. O sr. Ward vinha recebendo bilhetes datilografados breves e evasivos do filho e disse que a senhora Ward, em seu retiro em Atlantic City, não recebera notícias mais abrangentes. Assim, o médico acabou por decidir-se a agir, e apesar de uma estranha sensação inspirada pelas antigas lendas sobre Joseph Curwen e as revelações e advertências mais recentes de Charles Ward, partiu destemido para o bangalô no penhasco rio acima.

Willett visitara o local antes por pura curiosidade, embora, é claro, jamais houvesse entrado na casa nem anunciado a presença; por isso, sabia o caminho exato a tomar. Ao conduzir seu pequeno carro pela Broad Street no início de uma tarde em fins de fevereiro, pensou no sinistro grupo que tomara a mesma estrada 157 anos atrás numa terrível missão que ninguém jamais poderá compreender.

O trajeto pela periferia em decadência da cidade foi curto, e logo se descortinaram à frente a ordenada Edgewood e a sonolenta Pawtuxet. Willett virou à direita perto de Lockwood Street e seguiu de carro ao longo da estrada até onde foi possível, depois saltou e continuou a pé em direção ao norte até o local em que o penhasco elevava-se sobranceiro acima das belas curvas do rio e das enevoadas depressões calcárias mais além. As casas ainda eram bem dispersas ali, e logo ele avistou o bangalô isolado com a garagem de concreto numa elevação à esquerda. Percorreu com rapidez a alameda de cascalho desleixada acima, bateu à porta com mão firme e dirigiu, sem um tremor na voz, ao maligno mulato português de Brava, que abriu apenas uma fresta.

Disse que precisava ver, com urgência, Charles Ward para tratar de um assunto de vital importância. Não aceitaria nenhuma desculpa, e uma negativa resultaria num relatório completo da situação ao sr. Ward, o pai. O mulato ainda hesitava e empurrou a porta quando Willett tentou abri-la, mas o médico apenas alteou a voz e renovou suas exigências. Chegou, então, do interior escuro um sussurro rouco que gelou o ouvinte de cima a baixo, embora não soubesse por que o temia.

O Caso de Charles Dexter Ward (1943)Onde histórias criam vida. Descubra agora