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Logo começou a encher os lampiões extintos com querosene e, quando a sala iluminou-se de novo, olhou ao redor para ver se encontrava uma lanterna para continuar a exploração. Pois, por mais angustiado de horror que se sentisse, seu senso de rigorosa determinação vinha em primeiro lugar, e ele tomou a firme decisão de não deixar pedra sobre pedra na investigação dos hediondos fatos por trás da bizarra loucura de Charles Ward. Como não encontrou uma lanterna, escolheu o menor dos lampiões para carregar. Encheu também os bolsos de velas e fósforos, além de levar consigo uma lata de querosene a fim de guardá-la como reserva se por acaso descobrisse algum laboratório oculto no outro lado do terrível espaço aberto com o altar obsceno e inomináveis poços cobertos. Tornar a atravessar aquele espaço lhe exigiria o máximo de coragem, mas sabia que tinha de fazê-lo. Por sorte, nem o altar assustador nem o poço destampado ficavam perto da imensa parede perfurada de celas que delimitava a área da caverna e cujas obscuras passagens em arco indicavam as metas seguintes de uma busca lógica.

Willett, então, retornou ao enorme corredor inundado de fedor e angustiante lamentação, baixou o lampião para evitar qualquer vislumbre distante do altar infernal ou do poço descoberto com a laje de pedra perfurada ao lado. A maioria das passagens escuras levava apenas a pequenas câmaras, algumas vazias e algumas usadas como depósitos, e, em várias das últimas, viu uma curiosa acumulação dos mais variados objetos. Uma estava cheia de fardos de trajes putrefatos e envoltos em poeira, e o médico estremeceu ao notar que eram inequivocamente roupas de um século e meio antes. Em outra câmara, encontrou numerosas peças de trajes modernos que pareciam estar sendo guardadas aos poucos, ali, para equipar um grande número de homens. No entanto, o que mais o repugnou foram os imensos tonéis de cobre com sinistras incrustações, espalhados em várias salas. Inquietaram-no ainda mais que as tigelas de chumbo gravadas com desenhos estranhos, cujas bordas exibiam resíduos detestáveis, e das quais desprendiam odores repelentes, perceptíveis até mais que o fedor geral da cripta. Depois de ter percorrido mais ou menos a metade da extensão da parede, Willett descobriu outro corredor semelhante ao anterior, para o qual se abriam várias portas. Pôs-se a investigá-lo e, após entrar em três aposentos de tamanho médio, que nada continham de importante, chegou, afinal, a um grande apartamento retangular, cujos tanques, mesas, fornalhas, instrumentos modernos, alguns livros e infindáveis prateleiras com frascos e garrafas o proclamavam, de fato, o procurado laboratório de Charles Ward — e, sem a menor dúvida, do velho Joseph Curwen anteriormente.

O dr. Willett acendeu os três lampiões que encontrou cheios e prontos, examinou o local e todos os acessórios com intensa curiosidade e notou, a julgar pelas quantidades relativas dos vários reagentes nas prateleiras, que o interesse dominante do jovem Ward devia ter sido por algum ramo de química orgânica. No geral, pouco se podia deduzir do aparato científico, o qual incluía uma mesa de dissecação de aspecto horripilante, de modo que o laboratório revelou-se, na verdade, uma grande decepção. Entre os livros, via-se um antigo exemplar surrado de Borellus impresso em letra gótica, e foi estranhamente interessante notar que Ward sublinhara o mesmo trecho que tanto perturbara, mais de um século e meio antes, o bom sr. Merritt na fazenda de Curwen. Aquela cópia mais antiga, claro, deve ter sido destruída junto com o restante da biblioteca oculta de Curwen no ataque final. Três passagens arcadas saíam do laboratório, e o médico as investigou em sucessão. Nessa olhada superficial, viu que duas levavam apenas a pequenos depósitos, mas ele fez um exame minucioso nestes, observando as pilhas de caixões em vários estágios de deterioração, e estremeceu violentamente diante das duas ou três placas tumulares que soube decifrar. Também se viam muitas roupas estocadas nesses depósitos, além de várias caixas novas e fechadas com pregos que ele não parou para examinar. O mais interessante de tudo talvez fossem algumas peças soltas que julgou se tratar de fragmentos da aparelhagem de laboratório do velho Joseph Curwen. Embora houvessem sofrido danos nas mãos dos atacantes, ainda se podia reconhecer nelas a parafernália química do período georgiano.

O Caso de Charles Dexter Ward (1943)Onde histórias criam vida. Descubra agora