O Passado de Abine

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Michael Jackson
Rancho Neverland, Los Olivos
20 de dezembro de 1995, 21:05

 Meus polegares fazem movimentos circulares acariciando sua pele, graças a pequena abertura que tem em seu vestido. Minha língua está se enroscando com a dela há muito tempo. Há anos não nos beijamos assim. Costumávamos passar horas nos beijando. Nos curtindo... namorando. Namorávamos muito, será que vamos voltar a ser como antes algum dia? Bem, não sei, mas, esse pode ser o primeiro passo

— Podemos nos sentar um pouco? — pergunta entre nosso beijo sem abrir os olhos. Suspira e abre seus lindos olhos lentamente. Aceno positivamente para ela e a guio até o final da cama. Me sento e ela se senta em meu colo com uma perna de cada lado. Posiciona suas mãos em meus ombros e passa seus olhos por todo o meu rosto. Contemplando cada detalhe. Ela gosta de reparar, adora!

— O que você vê? — sempre faço a mesma pergunta e quando tudo realmente está bem entre nós e ela esta disposta a tudo por nós ela diz "vejo o amor da minha vida" quando as coisas ainda estão ruins, mas, mesmo assim ela quer meu toque, ela diz "vejo um homem incrível". Parece não ter diferença entre os dois, mas, tem!

— Eu vejo um homem! — essa é nova para mim, o que significa? — Vejo um ser humano que quer fazer isso dar certo — ela acaba tropeçando na última palavra — Existem tantas coisas que eu ainda não te contei — ela respira fundo — Você ainda vai me amar após saber tudo? Que quase matei alguém?

— Você matou alguém? — sussurro. Abine com seu olhar perdido olha para trás de mim e respira profundamente — Aby, me conta! — levo às duas mãos até seu rosto — Sabe que pode me contar qualquer coisa, não é? — Abine volta a olhar para mim. Seu rosto está diferente. Seu semblante está triste — Não vou te julgar, não vou te deixar! — ela posiciona suas duas mãos em frente ao rosto

— Quando você pergunta sobre meus pais eu sempre mudo de assunto — aceno positivamente — Tem um motivo Michael — ela abre um sorriso triste — Há alguns anos eu venho recebendo ligações — ela começa a esfregar uma mão na outra, está nervosa — São dos meus irmãos — ela coloca às duas mãos na boca — São pessoas horríveis — passa a mão pelo rosto — Depois dessas ligações eu não consigo me sentir em paz — respira fundo — Por isso me afastei de você, a presença deles em minha vida acaba comigo. Michael, você não tem noção do inferno que vivi antes de conhecer você!

— Aby — tento controlar minha respiração. Não posso chorar, não posso — Então me conte, por favor me conta! Você viu, nos últimos dias eu suportei tudo! Eu posso dar conta dos seus fardos também, me diz! — sussurro — Sou seu homem, seu parceiro de vida!

— Tudo bem — fecha os olhos e respira profundamente mais uma vez para tentar se acalmar — Como você já sabe, eu fugi de casa aos 16 — me lembro completamente, foi após dois meses que eu a conheci — Nos conhecemos dois meses após eu chegar aqui — ela sorri e me encara. Aos poucos seu sorriso vai se desfazendo e seu rosto vai ficando mais tristinho

— Por que essas ligações dos seus irmãos te machuca? — Aby morde o lábio inferior e suspira — Eles te fizeram alguma coisa?

— Michael, eles deviam me proteger e não me protegeram. Éramos quatro irmãos, eu, minha irmã Luanda e meus dois irmãos. Meus pais viviam dizendo que os nossos irmãos deviam proteger a mim e a Luanda, mas, isso não aconteceu quando precisamos — Aby se levanta e em seguida se senta ao meu lado esquerdo — Quando Luanda completou 15 anos, meus pais decidiram que ela estava ficando velha demais e que devia se casar! — o quê? Incrédulo eu apenas a encaro

— Então, no final de semana meu pai trouxe um amigo para casa. Ele ficou para o jantar e não tirava os olhos de mim e Luanda. Se notava que ele tinha muito dinheiro. O engraçado é que nós tínhamos uma boa vida, não era necessário vender nenhum de nós! — ela ri de nervoso — Eles obrigaram Luanda a se casar com ele, ela fugiu no dia do casamento. Como ela era de menor, bem, o casamento foi simbólico então o velho não pôde ir atrás dela!

— Ela era só uma menina — olho para o chão. Como é possível que existam pais assim? Deus isso é tão horrendo

— Sim, era — olha diretamente para mim — Eu também — não. De jeito nenhum! Eles não fizeram isso com ela, não é? — Me obrigaram a me casar com quem eles queriam que se casasse com Luanda como um pedido de desculpas por Luanda ter os feito passar vergonha — olha para cima — Teve a cerimônia simbólica. Eu só tinha 11 anos — suspira — Passei dois anos da minha vida servindo de empregada e fazendo os deveres de esposa na cama. Eu só ficava lá parada. Não sabia nem o que estava acontecendo — ela ri ironicamente

— Ele tinha 52 anos quando eu enfiei uma faca bem no meio da mão dele e fugi daquele inferno — fala entre dentes — Eu queria ter passado a faca na garganta dele — ela diz com um ódio em sua voz

— Meus irmãos estavam no meio do caminho e eu corri para eles — volta a olhar para mim — Eles tinham seus 26 e 29 anos, o mais velho tinha uma filha de sete anos e o mais novo uma menina de três. Eles as protegia como se fossem tudo para eles, nunca que eles deixariam que algo similar com elas, de forma alguma — ela ri enquanto lágrimas descem por seus olhos

— Eles disseram que me ajudaria, disseram — ela ri — Inocente pensei, são meus irmãos — ela gargalha — Eles me levaram de volta para a casa do maldito e lá ele acabou comigo — ela passa às duas mãos por baixo dos seus olhos — Não pense que aquele branquelo só me bateu — ela ri mais e mais — Ele fez tudo o que queria, não importava o quanto eu gritava ninguém ouvia ou ligava. Ninguém se importava comigo eu estava sozinha com uma dor insuportável entre as pernas! — ela chora copiosamente

— Por isso que eu cuido tanto da nossa imagem, agora eu tenho pessoas que gostam de mim e se importam. Eu sei que você se importa, mas, eu me sinto tão sozinha todas às vezes que me lembro de suas traições, o pior é saber que aconteceram graças aos meus traumas — Aby coloca os braços ao seu redor abraçando ela mesma

— E desde o final dos anos 80 eles estão me ligando. Querem que eu vá ver a minha mãe que está doente, eu não vou. Não vou — ela chora mais ainda. Me aproximo. A puxo para mim e a abraço com força. Nos deitamos na cama e ficamos aqui, abraçados. Ficarei aqui até que minha pequena se acalme. As lágrimas são impossíveis de serem seguradas, nesse momento choro feito uma criança. Eu não consigo acreditar que ela passou por tudo isso. O quão forte é essa mulher.

Inimigos DeclaradosOnde histórias criam vida. Descubra agora