Depois da conversa intrigante que as mulheres Andrews tiveram no carro, o silêncio reinou e a mais nova pôde focar prédio a frente. Primeiro haviam alguns garotos esguios conversando nos degraus mas, em questão de segundos – provavelmente ao verem o carro em que ela chegara – o número de alunos na escadaria da entrada aumentou e o circo parecia estar formado para sua chegada triunfal. Aisha não se preocupou em se despedir da sua mãe, apenas colocou seus scarpins no chão podre da escola e seguir em frente com a cabeça erguida, sem dirigir o olhar a nenhuma daquelas pessoas que a secavam.
Mal andou dois metros e já ouviu os burburinhos que ninguém fazia questão de disfarçar.
“Vocês viram o carro que parou aqui? Deve ser a filha do mafioso”
“Então ela realmente existe, pensei que era uma lenda urbana”
“Ela é bonita, me disseram que era tão feia que seu pai não deixava ninguém a conhecer”
“Pensei que era doente”
Aisha sorriu mentalmente. Queria que eles especulassem, que falassem mesmo dos mistérios que a rodeavam, afinal, gostava de receber atenção. Queria que a temessem, a invejassem e principalmente que não se metessem em seu caminho.
Ela seguiu perdida pelos corredores até ver que uma menina loira a esperava com uma plaquinha com seu nome. Achou brega, para dizer o mínimo.
– Bom dia, Aisha Andrews. Meu nome é Lily Lodge e vou te guiar no seu primeiro dia. – A garota tinha um grande sorriso estampado no rosto.
Antes de se apresentar, Aisha observou as características da menina: Baixinha, olhos claros e um cabelo loiro meio amarronzado e difícil de descrever já que estava preso em um coque. Com uma breve observação notou que ela tinha belas curvas, facilmente escondidas por suas roupas largas. Era o clichê da garota certinha.
Lily a levou para um tour detalhado – e entediante – por todos os ambientes importantes da escola. Depois de Aisha conhecer os armários e – com muita pena e esforço – substituir sua bolsa caríssima por alguns dos livros que estavam lá para as aulas do dia, seguiram direto para a sala.
Durante o caminho Lily mostrava e contava histórias sobre todas as fotos do corredor, falava sobre o quão acolhedora a escola era e que teria muitas oportunidades em algumas faculdades boas. Para Aisha era óbvio que toda essa “Cerimonia” se devia ao status financeiro da família e todo o prestigio e atenção da mídia local que tinham por receber uma aluna com um sobrenome tão importante. A última foto estava em uma moldura dourada próxima a um grupo de meninos com os clássicos casacos do time, haviam algumas prateleiras de troféus abaixo e uma placa de metal com a história de vida e superação da pessoa da foto. Matteo.
“se superou e construiu um dos maiores impérios da indústria têxtil do mundo”
Aisha não quis continuar a leitura. Percebeu rapidamente o quão idolatrado ele era naquele lugar e se ela não atingisse as expectativas, todo o esforço da sua vida seria desprezado e igualado a nada.
O grupo de meninos do time – liderado por Victor Cooper – se aproximou delas as observando de cima a baixo e Aisha rapidamente reconheceu um deles. Era o musculoso da boate. Passaram-se semanas desde aquela noite, mas seu rosto ainda estava fresco na sua memória e ela se perguntou se o amigo dele – que ela conheceu intimamente nos fundos da boate – também estudara ali. Seria coincidência demais.
– E então pequena Lodge, não vai me apresentar sua amiga? – um dos garotos pergunta.
– Essa é Aisha Andrews, vai estudar na nossa turma esse ano. Aisha, esse é Victor Cooper, capitão do time de basquete e...
– Prazer, sou o garoto mais popular da escola, ao seu dispor senhorita. – Em uma tentativa de cavalheirismo, achou uma boa ideia se aproximar para acariciar as mãos dela mas Aisha o rejeitou no mesmo instante. Conhecia bem os garotos populares e um deles havia destroçado seu coração anos antes. Não deixaria isso acontecer de novo.
– O prazer é unicamente seu. – Ela respondeu e ele faz uma careta de dúvida, provavelmente não entendendo o que ela quis dizer. – Vamos Lily, quero conhecer a quadra antes de entrar na sala.
Lily assentiu e assim que se afastaram, tentou conter uma gargalhada.
– Você é muito inteligente, A. Victor é tão burro que não deve ter entendido por que você o ignorou, eu poderia jurar que ele estava nervoso e que deve estar pensando nisso até agora. – Aisha se permitiu esboçar um pequeno sorriso, considerou que o comentário da maluquinha era um tanto... simpático. Lily parecia ser uma boa pessoa mas Aisha definitivamente não tinha a intenção de aprofundar a amizade com a pequena Lodge.
– Ele é um desperdício, muitos músculos e pouco cérebro, não vale a pena dar papo a esse tipo – ela tentou desviar o assunto, não queria falar sobre garotos que ela ficava ou sobre sua vasta experiencia com babacas. Precisava manter o perfil sério. – Seu sobrenome me é familiar... – disse tentando lembrar onde já havia ouvido.
– A senhora Andrews é amiga da minha mãe, eu sou filha de Diana Lodge. Elas ainda não tiveram a oportunidade de se encontrarem, mas já ouvi elas fofocarem por telefone várias vezes. – Aisha não respondeu, apenas forçou um sorriso e pediu para continuarem a andar.
Elena havia ido se encontrar com Diana no dia em que chegaram. Ou pelo menos foi essa a desculpa que usou para fazer sabe-se lá o quê. Não havia motivo para Lily não saber disso. O que significava que tinha alguém mentindo nessa história.
– Posso pedir pra ela marcar com a senhora Elena e vocês jantarem lá em casa no sábado.
– Isso pode ser legal.
Enquanto as meninas seguiam para os corredores das extracurriculares, ainda eram o assunto do pequeno grupo de atletas que ficara para trás.
– Ela é muito gostosa – Victor diz aos seus súditos fieis – até o final do ano já vou ter pegado e depois ela ficará aos meus pés pedindo mais. – Ele gargalha alto.
– Aposto cinquenta pratas que ela vai te dar um fora de novo – Ethan diz.
Luke havia esquecido um livro no armário e passou por eles enquanto falavam dela. Ele não conseguiu conter a risada depois do que Ethan disse e em questão de segundos, já havia um novo circo armado – dessa vez no meio do corredor –. Victor entendeu aquela risada como um deboche e partiu para cima de Luke no mesmo instante enquanto os outros que também riam foram se afastando para observar o pequeno tumulto de longe.
– Porquê a bixinha aqui está rindo, hum? Está vendo algum palhaço na sua frente?
– Na verdade... – antes que Luke consiga se explicar, um de seus amigos derruba os livros que estavam nas suas mãos e os chuta para a porta de uma das salas de aula.
– Cuidado com o que faz nerd, dessa vez é só um aviso e eu não vou avisar de novo.
Eles vão embora e Ethan os acompanha com um sorriso fraco. Eram amigos desde criança, mas nunca tinha coragem de enfrentar os garotos para o ajudar. Antes Luke se chateava com isso, mas acabou entendendo que Ethan só os seguia por querer uma oportunidade no time. Não era egoísta o suficiente para pedir que seu amigo abandonasse um sonho por ele.
Luke se abaixou para recolher os livros e algumas folhas que haviam caído junto e se amaldiçoou mentalmente por dois motivos: ter rido no momento errado e não ter coragem suficiente para se defender. Era vergonhoso começar as aulas assim. Como provavelmente disse algum filósofo desconhecido: Depois da tempestade vem a calmaria.
Dentro da mente dele haviam trovões e relâmpagos pela vergonha que tinha passado diante de todos, pelos problemas com sua mãe, a ausência do pai que era seu melhor amigo, tudo estava sendo uma merda na sua vida.
O que ele não poderia imaginar é que assim que ele erguesse a mão para apanhar os livros que tinham caído de seus braços pela terceira vez, seria pisoteado por um salto alto de bico fino e envernizado, onde ele provavelmente conseguia ver seu próprio reflexo.
Olhou para cima pronto para xingar quem quer que fosse, mas a surpresa que teve foi maior do que a dor que estava sentindo na mão.
Era a garota misteriosa.
– Quando eu disse que poderia pisar no primeiro idiota que passasse na minha frente hoje, não sabia que seria de forma tão literal – ela disse estendendo a mão para ele.
Não havia o reconhecido de imediato mas bastou que ele levantasse e ela pudesse ver claramente aquele par de olhos azuis assustados e pela primeira vez na vida Aisha se sentiu realmente sem palavras. Era o garoto da dança bizarra, o garoto que beijou inúmeras vezes nos fundos de uma boate, o garoto que ocupou seu pensamento por algum tempo.
Luke passou alguns minutos a observando de boca aberta para se convencer de que era real. Era realmente ela. A garota misteriosa estava diante dele e a considerava ainda mais bela a luz do dia.
– Olá Davis! – sua voz inconfundível ainda possuía o mesmo tom confiante e seu sorriso debochado permanecia igual.
– Olá...
– Estuda aqui?
– Sim, você também? – ela assente – Nunca havia te visto por aqui...
– Ela se mudou pra cá com a família no início das férias, é nova na escola – a pequena Lodge os interrompe – Aisha, você não me disse que já conhecia alguém da escola.
– Nos falamos rapidamente no dia que cheguei, já havia até esquecido seu rosto.
Sua fala surpreendeu Luke. Afinal, ele sabia que não diria na frente de Lily que havia o beijado nesta mesma boate, mas a forma como falou soava como se não tivesse significado nada ou até mesmo não lembrasse do que houve depois da conversa.
A diretora Abigail Miller surge absolutamente do nada se dirigindo a Aisha, se apresentando e dizendo milhares de vezes que era muitíssimo bem vinda à escola.
1. Tour com a presidente do grêmio.
2. Honras feitas pela diretora.
3. Pessoas passando e apontando para ela a cada minuto...
“Haver tantas pampas e cerimonias para uma novata comum era no mínimo estranho.” Pensou ele.
– Obrigada por essa recepção diretora Miller. Meu pai ficará feliz em saber que fui tão bem recebida na escola em que ele se formou. – Abigail Miller ficara satisfeita com esse comentário. Estava recebendo em sua mera escola, a herdeira de uma das maiores fortunas do país.
Foi aí que a ficha de Luke finalmente caiu e ele se deu conta do sobrenome da garota: Andrews. Simplesmente havia beijado várias vezes a filha e herdeira de um os caras mais ricos e poderosos do México e dos Estados Unidos.
A pessoa que marcou seus pensamentos por longas noites sem sono era Aisha Andrews, simplesmente. Mistérios a rodeavam mesmo antes dela nascer, desde a viagem sigilosa de seu progenitor até um mero beijo quente em uma festa nos confins da cidade e ele estava definitivamente surpreso por ela ser totalmente diferente do que imaginava.
Assim que o sinal tocou pela segunda vez, ela entrou rapidamente na sala junto com Lily.
Antes que Luke tivesse tempo para falar mais alguma coisa.
Antes que pudesse perguntar se ela lembrava do que quase rolou.
Ela não estava com pressa, nem mesmo fugia dele. Era indiferença. Não se despediu por não se importar o suficiente ou talvez, não seja fosse tão indiferente assim. Talvez simplesmente o tratasse como parte dos seus joguinhos ou fugia da sensação boa que ele a causava.
Enquanto Aisha se afastava para evitar pensamentos profundos, Luke se sentia bobo por tê-la procurado tanto.
Agora que sei quem era de verdade, parecia ainda mais inalcançável que um rosto misterioso.
Aquele beijo, aquela conversa, aquilo que quase aconteceu...
Pra ele, havia sido mais do que algo casual e no fundo, ambos gostariam que se repetisse.
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Aisha
Romance"NÃO SEI SE VOCÊ PERCEBEU, MAS EU NÃO TENHO UM CORAÇÃO PRA QUE POSSA CONQUISTAR" Luke Davis é um jovem peculiar e esquisito em Moon Garden, uma pacata e humilde cidade no interior dos Estados Unidos, sem muitas experiências e envolvimentos amorosos...