A Declaração

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Esse capítulo acontece durante a época de Mylathow, quando tudo estava bem, quando só tinha os assassinatos nos corredores do castelo como problema.


KEERAN
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Eu estava esquecendo alguma coisa.

Não sei porquê mas sempre que a noite chegava, eu me pegava pensando que estava esquecendo alguma coisa, e esse pensamento vinha sempre acompanhado por um gosto horrível na minha boca — mesmo que eu tenha acabado de sair da cozinha depois de tomar literalmente um litro de água.

Outra coisa que não entendo.

Como fui parar na cozinha e porque estou sempre com sede, uma sede inexplicável.

Às vezes acho que sou sonâmbulo, pois só percebo que estou na cozinha quando termino de beber água, quando minha garganta não está mais seca. Parece que só acordo quando termino com a água e consigo voltar a pensar, a notar, a olhar. E sempre me pergunto porque não bebi a água que fica na jarra em meu quarto, que os criados sempre deixam cheia, se estou com sede. Por que vou para a cozinha sem perceber? Provavelmente estou sendo bobo. Isso só acontece por causa do cansaço, por causa das dores de cabeça que eu sinto durante o dia, não é? Nenhum curandeiro consegue encontrar um bom remédio para acabar de vez com essas minhas dores de cabeça, e o feitiço que mamãe faz em mim também não resolve muito.

Oro todos os dias para os deuses para que essa dor desapareça de vez, e agradeço que isso não seja por causa de uma doença fatal, como ouço os curandeiros do castelo comentando de certos pacientes.

Enfim, depois de pesar minha barriga com água, caminho de volta para o meu quarto. Provavelmente é de madrugada, pois é sempre esse horário que acontece essa maluquice comigo. E é nesse horário que não consigo dormir mais, que demoro horas para conseguir pegar no sono novamente, mas prefiro deitar na minha cama confortável do que ficar andando de um lado para o outro pelo quarto, ou pelos corredores escuros — me estremeço todo só de pensar nesse último.

Odeio andar pelos corredores do castelo de madrugada.

Não é só por causa dos assassinatos que estavam rolando, eu sei que a segurança aumentou ainda mais e os guardas estão cuidando muito bem dos corredores, e sim por causa da escuridão.

Não sei porque esse medo na minha própria casa, porque sinto que as sombras nos cantos podem me atacar a qualquer momento, mas sempre ando rápido pelos corredores, como estou fazendo agora.

Estou andando tão rápido que só ouço os passos se aproximando quando estão perto demais, quando tenho que segurar o braço da pessoa com agilidade antes que ela caia no chão por causa do nosso esbarro.

Escuto o grito agudo no mesmo instante em que reconheço a pessoa que estou segurando.

— Makenna! — exclamo com surpresa. — Você está bem?

— Keeran! — ela exclama com a mesma surpresa enquanto se endireita depois do choque. — O que está fazendo por aqui?

— Na minha casa?

Não aguento, acabo soltando uma risada.

— Idiota. — ela me lança um olhar bravo, com aquela ruginha linda no meio das sombras, mas abre um sorriso no canto dos lábios. — Estou falando o que está fazendo andando pelos corredores de madrugada.

Olha que podia fazer outra piada, mas resolvo ser sincero.

— As vezes acordo com muita sede, então fui na cozinha atrás de mais água. — ergo as sobrancelhas para ela. — E você? O que está fazendo andando pelos corredores de madrugada?

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