Oito - Gargatada

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Então ao soltar o ar ele soltou também um soluço choroso, um soluço de dor, e em seguida me abraçou fortemente. Não eu não o abracei, não fiz nada só fiquei parado, mas com tantos olhares me cercando fiz um movimento rápido e acolhedor o abraçando de volta.
Lembro de quando minha mãe morreu, um acidente que fez o galpão onde ela trabalhava, em uma empresa de costura queimar, morreu ela e mais 25 funcionários, uma tragédia lamentável. Naquele dia, enquanto eu entrava em desespero, minha tia Dalva me segurava, segurava minha cabeça ao mesmo modo, “Respira Apollo” dizia ela “de novo” “de novo”. Isso me faz pensar o quão ela teve que ser forte por mim, sim ela havia perdido a irmã e mesmo assim tentava me acalmar ao invés de se acalmar.

Em seguida a equipe toda se mobilizou, trouxeram um copo de água e deram em minha mão e quanto ele chorava em meu ombro e entreguei a ele:

— Aqui, beba um pouco de água — falei

— Sua mão está sangrando — falou baixinho.

— Está tudo bem, beba a água — falei

Ele pegou o copo se tremendo.
Bebericou e eu me afastei. Em seguida ele foi acolhido pela equipe de paramédicos.

— Bom trabalho Apollo — disse Carol.

Dei apenas um sorrisinho sutil. Um aceno positivo de cabeça. Eu não sentia que eu havia feito um bom trabalho, eu apenas havia o ajudado, mesmo sem motivação.
Se algo acontecesse com ele pelo fato dele entrar no prédio eu seria responsável, e eu não queria ser responsável.

— Não sabia que cê tava comendo o viadinho — disse Caio aí passar por mim

Eu o olhei feio.

— É o que diz para ele enquanto ele dá gargantada na sua rola, “respira” — disse Bruno rindo e os dois caíram na risada

Eu riria também, mas eles não me pegaram em um bom momento.

Olhei para minha mão machucada, Caio riu, Bruno riu, eu ri falsamente, mas fechei o punho, e virei um murro certeiro no rosto do Bruno. Ah merda eu estive com vontade de fazer isso, eu queria ter socado alguém desde muito tempo, eu queria extravasar e não era no puteiro agora eu entendo. Em seguida dei outro, Caio tentou intervir e acertei o cotovelo em seu rosto, em seguida deferi nele uma único murro certeoro e ele cambaleou, em seguida me voltei para o Bruno, Carol tentou entrar no meio para apartar, a impressa toda se voltou a nós, câmeras, entrevistadores pessoas.
Eu não estava contente, passei por cima da Carol, grudei Bruno no colarinho e lhe acerto uma cabeçada forte no meio do rosto. Em seguida Caio, novamente, tentou se aproximar levou um outro murro, e pude ver o sangue jorrar de seu nariz com a força do meu puno.
Todos ficaram parados me olhando, e eu saí do local envergonhado.

....

No corpo de bombeiros eu estava sentado enquanto e enfermeira terminava de dar o último ponto em minha mão, 4 pontos no corte e curativo nos nós dos dedos estourados da briga. Carol vinha entrado com seu cabelo quase louro trançado e caído nas laterais dos olhos, segurava sua prancheta como sempre, entrou na sala e a enfermeira já guardava seu material na maleta. Agora era a hora que eu seria afastado, ou remetidos, meu rosto estava estampado nos jornais, na televisão, e os repórter tentavam conversa comigo para saber o que aconteceu.

— Hoje foi um dia estressante não é? — disse Carol.

Eu me mantinha em silêncio de cabeça baixa.

— O quê aconteceu? — perguntou

— Quero que me tire da equipe.

— Apollo, eu sei que era o seu sonho ser bombeiro, eu conheço você, sua tia e conheci sua mãe, eu quero um esclarecimento.

— Caroline eu não posso trabalhar com pessoas que fazem piadinhas em momentos delicados como aquele. Eu... Eu perdi minha mãe num incêndio, você sabe.

— Por isso bateu no Caio e no Bruno, eles zombaram de você?

— Não eles zombaram de Nael, e Nael tinha acabado de perder pessoas. Acabado de salvar a única coisa que restou da família dele...

Carol ficou quieta. Em seguida tocou meu ombro.

— Quer dizer o que eles disseram?

— Tenho vergonha do que eles falaram — e era verdade. — Apenas Zombaram dele por ele ser ... Gay

Eu estava abruptamente  envergonhado.

— Estou orgulhosa de você. — deu uma pausa — Sempre te achei um babaca mas nunca achei que fosse do tipo que defende as pessoas, ainda mais o Nael. Eu achava que...

Ela ficou quieta.

— Bom não importa, vou dar a nota para a impressa e você não vai sair da minha equipe. — disse ela riu de maneira sutil.

Então eu me senti lisonjeado, agora eu era herói. E logo eu era o cara que defendeu o colega de trabalho, e Bruno e Caio foram exonerados do cargo e a impressa falava disso nos jornais. “O bombeiro não gostou que zombassem do seu colega de trabalho que tinha acabado de perder parte de sua família”, e de novo eu era o maior, o incrível Apollo, com holofotes virado para mim, e eu não sabia se deveria me vangloriar daquilo.
Mikael havia perdido sua avó, sua tia e um sobrinho de 7 anos, e restou apenas o bebezinho Pedro de seis meses era seu afilhado e também seu primo, filho de sua tia. Ele virou manchete do jornais locais, todos ficavam comovidos com fato dele ter se deparado com a família em chamas em uma ocorrência, houve uma homenagem e um velório da família dele da qual eu não participei. Eu não queria ter ligações com ele por mais que eu já estivesse entrado em uma briga por sua causa.

Com Amor, ApolloOnde histórias criam vida. Descubra agora