Então desligou. Aproveitei o momento para trocar de camisa, afinal a minha do trabalho estava suja de sangue e suor, mas me mantive com a mesma calça, depois eu poderia tomar um banho, ou não, tanto faz, eu só não queria parecer sujo. Por que me importo com isso. Logo o interfone tocou, e o porteiro avisará a chegada de Mikael.
Ele estava sentado na área de convivência do apartamento, estava pouco vazio, havia algumas pessoas sentadas em outras áreas, em outros sofás. Alguns empresários jogando conversa fora em poltronas pretas com os pés na mesa de centro, outras com casais rindo e o lugar estava criteriosamente silencioso embora houvesse algumas pessoas ali sentados.
Ele vestia uma camisa azul clara com estampa florida, com uma calça também clara e sapatos um tanto formal. Viados se vestem sempre de forma convidativa, nem precisam de placas, suas roupas dizem “oi eu sou um bichinha”, engoli seco a saliva. Estava arrependido de ter ligado, minha tia deu um conselho péssimo. Me sentei na poltrona de frente para ele, até a maneira de sentar é diferente, ele com a perna fechada e eu de pernas abertas, o encarando. Ele ainda estava com a cara tão péssima, devia estar péssimo referente a sua recente perda. O porteiro me encarava do outro lado do saguão, mesmo longe eu podia ver seus olhos me julgando.— Obrigado por vir — falei baixinho
— Não vim por você, vim por mim, por que você estragou o que restava da minha vida...
— E você acha que você não estragou a minha? Meu casamento? Meus amigos que não falam mais comigo.
— Oh, que pena que estou de você — disse ele teatralmente — você é do tipo que nunca perdeu não é? Nunca perdeu amigos, nunca perdeu pessoas... Bem vindo ao meu mundo Apollo.
Ele fez aquilo, que ele fazia quando estava irritado, apertou as sobrancelhas. E eu também tinha uma mania de cerrar os lábios quando irritado fechando a cara, e estava fazendo isso enquanto ele falava.
— Você acha que o quê? Estou com pena de você por sua esposa ter te dado um pé no rabo, ou seus amiguinhos terem parados de falar com você?
— Zombaram de mim hoje — falei irritado.
— Zombam de mim todos os dias, você zombava de mim todo os dias — disse ele mordendo os dentes se alterando — Eu nunca te fiz nada, eu nunca implique com as suas roupas amarrotadas, ou a maneira mal vestida que você aparecia, mas bastava eu aparecer mais arrumado e eu era motivo de piada, por que o certo é andar que nem você e seus amigos, sujos, fedidos, mal vestidos.
— Eu não ando assim... — falei irritado
— Sério? — ele ergueu o olhar me medindo.
Eu me olhei.
— Eu me troquei, eu... — dei uma pausa — Não é sobre isso que vim falar...
— Mas é sobre isso que eu quero falar, eu quero falar o quão homens babacas que nem você existe. Aquele dia lembra? Pensei que você fosse me bater, e pela primeira vez eu quem bati, mas sabe quantas vezes eu já apanhei por eu ser isso aqui?
Neguei, mas não que eu neguei a pergunta, neguei a exaltação dele.
— Várias, eu apanhei várias vezes por ser gay, e sabe quantas vezes eu pedi para que Deus me fizesse homem? Várias. Para vir um merda que nem você dizer que sou assim por eu não ter pais... — ele disse espichando os ombros feito um gato.
— Eu...
— Eu... Eu... Porra de eu, ninguém se importa com você, mas eu tenho uma pergunta, quando foi que viados se tornaram sua maior ameaça?
Fiquei quieto.
— Responde!! — gritou.
Naquele instante todos que estavam presentes me olharam, e mesmo depois do silêncio ter sido quebrado parecia que todos ali queriam uma resposta, mas ninguém de fato estava observando nossa conversa só haviam estranhado o grito de Mikael cortando o silêncio.

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Com Amor, Apollo
RomansaApollo é um homem de 28 anos que tem suas próprias convicção e preconceitos a respeito do mundo LGBT, mas acaba por descobrir que todo o seu preconceito não passa de uma máscara barata sobre o que ele realmente é. Apollo se apaixona pelo seu colega...