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No domingo à tarde, a chuva perfumou as frestas maciças de madeira do assoalho, emanando dos veios de seus caracóis escuros um aroma petrichor que despertou o pitbull para mais um dia calmo e menos dolorido do que os anteriores, apesar de ainda le...

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No domingo à tarde, a chuva perfumou as frestas maciças de madeira do assoalho, emanando dos veios de seus caracóis escuros um aroma petrichor que despertou o pitbull para mais um dia calmo e menos dolorido do que os anteriores, apesar de ainda letárgico e apreensivo. Ainda não havia se acostumado a aquilo.

Os amores perfeitos e narcisos choravam na tempestade pré primaveril na varanda, mas não pareciam tristes, gotejando em seus solos preto seu pranto, e fertilizando suas raízes enquanto o céu parecia mercurial e as nuvens, apêndices escuros e felpudos, planando, sem rumo, vociferando por aí.

Jungkook, como se sentisse em suas entranhas, pressagiou que estava cada vez mais próximo do horário o qual invadiu aquele duplex antigo, para contabilizar exatos três dias que foi acolhido por aquele humano desconhecido e recebido para ser cuidado como uma visita esperada por anos. Era o primeiro, todavia, que se estava quase apto o bastante para fazer qualquer coisa que não fosse dormir, gemer de dor ou temer por sua vida, usando da clareza de seus pensamentos que se curavam, para ajustar seus objetivos e rever o cenário o qual se encontrava.

Naquele instante, na quietude daquele espaço estranho, o híbrido experienciou um tipo de devaneio claro como água, admirando a contragosto da simplicidade idílica que tudo ocorreu após os eventos confusos do dia anterior, onde acreditou que a negociação e conversa no andar abaixo poderia culminar para sua entrega, justo no momento o qual ele mal podia correr ou retaliar contra o inimigo. Aconteceu que continuava ali, entre caixas e tecidos, enrolado e resguardado, para seu horror, para a enxurrada confusa em seus instintos de alerta, deixando-o ligado até o tremor de suas carnes e nervos durante a noite passada, cedendo ao fim para a serena calmaria do adormecer onde aquele humano esquisito leu algo candeciado, como uma canção de ninar, sonetos veraneios, em outra vigilia.

Era difícil compreender a cronologia daqueles acontecimentos, e ainda mais o porque daquele cara com cheiro de terra e livros, naquele presente incerto e abstrato que era seu torpor de febre e cansaço, havia lançado mão de uma mentira para ajudá-lo, sem pedir nada em troca até então e fazendo um caminho reverso do qual esperava em relação a cobrança.

Tal questão, entrementes, não fazia a ansiedade e a paranoia assustada pararem de crescer em Jungkook, mortais e venenosas, sussurrando em seus ouvidos que tudo era uma farsa, como uma serpente de língua doce, e que em alguma hora, sua dívida seria cobrada de uma maneira ou de outra.

A diferença daquele medo, porém, era que ele não adentrava somente em sua cabeça para modificar tudo que conhecia e acreditava — ele o fazia lutar para conseguir entender algo que já o fazia em sua totalidade anteriormente, a maldade humana não inédita em seu convívio e rotina. Jungkook sabia, que se cedesse a tais afetos, aquela tortura suave o machucaria em suas partes moles mais dolorosamente do que os socos e os pontapés que o feriram antes.

Se aquele humano planejava traí-lo, qual era o sentido daquela compaixão empática, daquele cuidado voluntarioso e gentileza altruísta?

Sua mente não capturava e muito menos absorvia as respostas para aquilo, não compreendia o porquê mentir para o outro que confiava, do qual era amigado, — de acordo com os cheiros misturados das prateleiras até o canteiro de suculentas — se nada ganhava em troca além da seguridade de que não soubesse do segredo que era Jungkook escondido atrás da poltrona, fraco e desprotegido em sua hostilidade imposta.

Cão de Briga | namkookOnde histórias criam vida. Descubra agora