Parte XI

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 Passos distantes ecoam no ouvido do garoto de jaqueta verde-musgo, fazendo-o despertar do transe que é estar deleitando do primeiro beijo. A sensação, para Julian, é estranha, embora saiba que poderia fazer isso por horas ao dia. Lá no fundo, a sensação vai além do quente e molhado. E o resquício do sabor da nicotina nem o incomoda.

Os lábios se separam, mas se dependesse do menino de moletom despojado, não o faria. O sabor doce lembra refrigerante de uva, e para Yan é tão bom ter sentir esse sabor dessa maneira.

À medida que Julian se afasta, o outro o busca novamente, porém, sem sucesso. Os olhos deles se abrem simultaneamente.

Julian poderia facilmente ter um ataque cardíaco ali. Seu coração pulsa tão forte que ele pode ouvir as batidas. Mas o menor não sabe se é o medo ou a emoção. E afastar-se não ajuda muito. Ainda sente que pode provocar o órgão para fora a qualquer momento.

O garoto de olhos esmeraldas aperta a alça da bolsa pendida ao corpo. Sem saber o que falar, — se é que ele ainda contém essa habilidade — desprende o olhar e parte para frente.

O corpo elétrico de Yan o acompanha, no automático.

Novamente Julian fica a uns passos na frente. Contudo, dessa vez não é a vergonha que o toma por inteiro. Ele se esforça ao máximo para reduzir o sorriso que se forma em seus lábios. Ele estaria orgulhoso de si ou hipnotizado?

— Eu ainda não entendi muito bem — diz Yan, vagamente, e indaga: — O que aquilo quer dizer?

Julian, pensativo, desacelera o passo. "O que aquilo quer dizer?" O próprio não sabe.

Sua boca apenas se entreabre, mas nada sai.

Eles caminham calados, agora lado a lado. Yan reconhece o local por onde passam. Tomaram as bebidas quentes mais cedo aqui.

— Quer parar e tomar alguma coisa? — convida Yan.

Julian para, olha para o aconchego do estabelecimento e fica tentado. O porém é: "Isso seria, tipo, um encontro?" pensa. Assustado com os próprios pensamentos, Julian recusa com a cabeça. "Seu idiota, por que você é assim?!" martiriza-se e fala:

— Acho que devemos ir antes que chova.

— Talvez fosse melhor ficar aqui, assim não tem perigo de nos molhar caso venha a chover.

Julian abaixa a cabeça, tímido.

— Acho melhor irmos, não quero chegar tarde em casa.

"Você é muito medroso." relembra Julian. Yan em parte está certo, mas Julian tem seus motivos. Cresceu na família de pais religiosos. Toda a mentira acabou se tornando uma falsa verdade, por assim dizer. Talvez não seja simples assim para Julian perder o hábito de se esconder; não seja tão simples tirar uma máscara forjada através dos anos. Mesmo que essa máscara não sirva de nada no momento, ela ainda existe no mesmo.

— Certo. — Yan apenas confirma e segue.

Depois de um tempo de caminhada, as gotículas de chuva aumentam em uma constante notável. O céu é repleto de nuvens escuras. A lua sequer é vista.

Eles se afastaram muito da lanchonete, não podem voltar.

— Avisei que devíamos ter ficado lá atrás, garoto dos desenhos — implica Yan.

Não querendo pegar um resfriado, Julian tem uma boa — ou péssima, não decidiu ainda — ideia.

— Só me segue — Julian diz, autoritário. — E para de me chamar assim.

Yan tira as mãos dos bolsos e as levanta, brincalhão.

Julian puxa sua bolsa, tira as chaves de dentro e abre a porta da papelaria.

Verde e CastanhoOnde histórias criam vida. Descubra agora