O jantar foi, na medida do possível, excelente. Julian tirou de letra, mesmo que sentisse um arrepio na espinha e mãos nervosas de vez em quando. O menu foi incrível, a conversa foi tranquila, o lugar era bonito, seu par era encantador... Para o menor, nada para aquele primeiro encontro poderia ser melhor.
Agora eles caminham, sem rumo. Ideia de Yan.
O luar preenche o céu, mas a maior iluminação vem das vitrines de loja ou dos faróis dos carros.
— Você vem muito aqui? — Julian perguntou.
— Sim, eu costumava vir muito para cá com meus pais.
E o tópico sensível volta à tona, contudo, as taças de vinho deixaram Yan distraído. E os filtros são abolidos do mesmo.
— Meus pais meio que me deserdaram quando descobriram sobre mim, sabe? — Ele chuta um pedaço de papel no chão. — Eu me sinto bem com isso agora, acho que posso ter me acostumado. Mas acho que sinto falta também.
Julian se mantém calado. O menor sabe que não é o melhor do mundo consolando alguém.
— Você tem irmãos? — perguntou Yan.
— Só se você contar com Erick.
— Eu tenho dois. — Yan farfalha — É uma merda, se você quer saber. Principalmente quando eles seguem os passos dos seus pais e você vira, de repente, a ovelha negra da família por "não fazer algo de valor." Ainda mais quando você é o único com uma condição sexual diferente.
Yan prometeu para si mesmo não entrar nesse assunto esta noite, pois seu foco seria apenas desfrutar daqueles olhos verde-esmeraldas que não saem da sua mente.
De canto de olho, o garoto de olhos castanhos avista como o menor o fita e seus passos diminuem.
— Estou falando demais, né?
— Sem problemas. — "Fui instruído para lhe ouvir" pensa.
— Desculpa.
Os dedos de Yan dançam, de modo estranho, no bolso de sua calça. Julian sorrir por entender o porquê.
— Está sem cigarros?
Yan confirma com a cabeça.
— Fofo da sua parte, — Julian mostra os dentes — mas não é preciso.
Por mais que o cheiro lhe irrite, Julian não quer ser um empecilho. Ele entende como é ter algo para acalmar em momentos assim.
— Está tudo bem. Mas podemos trocar de assunto, não queria lembrar da minha relação familiar hoje.
— Ok.
Julian caça algo na cabeça, mas está em branco. "Eu só queria ter o mínimo de aptidão social" pensa.
— Argh! — o menor deixa escapar.
— Tá de boa?
— Sim, está. Eu só queria ter alguma habilidade social interessante.
— Quer parar aqui? — anuncia Yan.
Um rio se encontra logo à frente. Os dois param lá, apoiando-se no muro de pedra. Yan observa algumas balsas passarem, já Julian, ele fica fitando a calçada e as luzes dos prédios
— O que você quer dizer com "habilidade social interessante"?
— Quero dizer que eu não tenho muita competência para fazer uma conversação sobre algo comum.
— E sobre o que você costuma falar? — Yan volta-se metade do corpo para Julian, deixando só um cotovelo no muro.
E, por sua vez, o garoto de olhos esmeraldas vira apenas o pescoço para encarar os castanhos atentos.
— Sei lá — Julian diz, viajando seu olhar até os lábios secos do maior — eu nunca falo muito. Não é minha melhor forma de expressão.
— Pergunte-me qualquer coisa. Pode ser algo muito aleatório, não precisa perguntar qual minha banda favorita ou que tipo de filme eu assisto.
Yan hidratada seus lábios, deixam o interior de Julian histérico.
Pensante, o garoto decide deixar fluir qualquer coisa de si, mesmo que seja algo estranho. Logo, ele diz:
— Você não tem medo disso?
— Perguntas estranhas? Encontros? Se apaixonar? Homofobia? Balsas? — brinca — Você precisa ser mais específico.
Julian acompanha a postura do maior, ficando, também, com um cotovelo no muro e voltado à Yan.
— Crescer, mais especificamente — explica Julian, simples. — Eu nunca imaginei que algo assim seria real um dia. Todas essas sensações seriam reais.
Yan tenta ficar o mais passível possível.
— E essas sensações se tornando reais, implica que todas as outras coisas também serão.
Não totalmente, mas Yan compreende um pouco do que o outro lhe fala. Até, de certo modo, concorda.
— Talvez seja assim para todos... Quando estamos sendo ensinados sobre a teoria, não parece ser muito complicado, até que a prática do crescer faz você torna todos os seus sonhos reais ou eles virão seus pesadelos. — Julian fica com o olhar levemente pesado. — E é sobre isso que eu costumo falar — finaliza o menor.
Yan dá um sorriso rápido.
— Isso soou meio mórbido, porém, eu entendo. Tento sempre agradar, de alguma forma, meus pais com as escolhas que eu fiz, mas nunca vou ser tão bom quanto meus irmãos. Eles quebram as expectativas e eu sou só, minimamente, suficiente.
Yan inclina a cabeça para o lado, levando sua atenção para as balsas novamente.
— Quando eu era menor, uns quinze anos, mais ou menos. Eu sempre ouvia dos meus pais para sempre melhorar. Eu ficava me esforçando, mais e mais a cada dia. Eu passei a pensar no meu próximo passo mesmo antes de dar o primeiro. Felizmente, entendi que as pessoas só querem apreciar aquilo ao qual são incapazes de fazer ou conquistar, aí despejam as expectativas nos outros. Vi que aquilo não ia funcionar, porque toda vez que eu queria mais, eu não me sentia suficiente, porém, sentia que era o máximo que eu podia. Então acho que, às vezes, é apenas isso que a gente deve ser. Suficiente. — Julian puxa o queixo de Yan e fita aqueles lábios, agora molhados, tentadores — Como você parece ser para mim.
Sem perder tempo, o garoto dos olhos-esmeraldas suprime o espaço entre ele e o garoto de olhos castanhos.
— Também acho que estou me apaixonando por você — o menor diz, sem recuar muito seus lábios.
— E isso é uma das coisas que te assusta? — perguntou Yan.
— Me deixa apavorado.
— Mas você se importa?
Tocam seus lábios brevemente, Julian diz:
— O que você acha?
Julian estava mostrando muito mais que um desejo de alguém apaixonado. Ele estava concretizando a escolha de não se esconder mais em uma bolha satisfatória; estava mostrando de forma explícita ao mundo o que ele é, mesmo que isto leve seu coração à boca; ele estava enfrentando as normas impostas por uma família conservadora e preconceituosa.O garoto de olhos esmeraldas estava experimentando o sabor de como é a liberdade.
Todavia, Julian ainda se importava em ter olhos nele, bocas lhe proferindo injúrias, mentes o ridicularizando, qualificando seus talentos por sua orientação, etc. Por outro lado, seu corpo só sabia querer e querer mais o garoto de olhos castanhos.
É engraçado que em alguns dias Julian só pensava em produzir algum outro quadro ou uma artes para fornecer na papelaria e agora está se ligando a um estranho que o destino colocou no caminho.
Há alguns dias o único castanho importante era os das folhas secas da sua estação favorita. Agora o castanho é vivo, é uma auréola encantadora, em chamas pacíficas e tentadoras.

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Verde e Castanho
RomanceO céu estava alaranjado, em sua maioria. Havia muitos tons de castanho e amarelo nas árvores, mas também havia verde: ao qual o castanho apreciava; no qual castanho se perdeu. E em uma comum, mas linda, tarde de outono, um desejo foi florescendo enq...