Capítulo cinco

12 1 0
                                    

Por mais que Daisuke prolongasse o intervalo de suas visitas a Haruka, não havia como negar os efeitos de ter uma alimentação regular. Esperava o máximo que podia antes de ir ao quarto dela e ter que se ajoelhar para beber sangue no pulso estendido da vampira, mas depois do incidente com Alana não conseguira se forçar a enfrentar a fome — sede? — por mais de duas semanas. E isso era o suficiente para que não se sentisse mais cansado o tempo inteiro, e os sentidos ficassem afiados como se antes ele tivesse algodão enfiado nos ouvidos e nariz. O cheiro das empregadas humanas agora ficava mais tempo num local depois que elas partiam, e Daisuke começava a encontrar trilhas que lhe permitiriam segui-las caso desejasse, mas estar alimentado trazia a ele a segurança de que não atacaria Hana ou Yu Jun ou uma das velhinhas. A vida não era bela, mas pelo menos deixara de ser miserável.

A energia extra precisava ir a algum lugar, e Daisuke relutantemente decidiu checar a tal academia no porão. Akihito fornecera à sua gangue equipamento profissional, e quase toda noite o local estava cheio de aparelhos para fisiculturistas ávidos. Nas noites mais cheias eles precisavam revesar o uso das máquinas.

"Muita interação social."

O engraçado era que a maioria dos vampiros era composta de jovens magricelas e, sendo vampiros, eles nunca desenvolveriam músculos. Daisuke os observou enquanto se exercitavam, e viu bracinhos finos levantarem tanto peso quanto lutadores profissionais. Claramente a força vampírica não se originava de carne e ossos.

Saiu da casa, se recusando a admitir que havia criado expectativas sobre a academia.

O jardim havia sido um ótimo companheiro por várias noites, mas Daisuke precisava de mais. Hesitante, ele foi até a borda do telhado e saltou. Içou-se para cima e cuidadosamente subiu pelas telhas inclinadas. Eis um mistério: será que sob essas telhas se escondia um sótão enorme? Por qual parte da casa teria acesso a ele?

— Uau.

A visão do céu desimpedido de paredes e copas de árvores era libertadora. Com cuidado para não escorregar, Daisuke perambulou um pouco, prestando atenção no cenário noturno. Ele ainda estava na Cidade Alfa — percebeu. Bem, claro que estava. A força policial sempre soubera a localização da casa de Akihito, mas lá dentro era como um país à parte, fazendo Daisuke se sentir distante da cidade onde nascera e se criara. Do telhado ele via a Torre Alfa, e o distrito do Teatro. Os outros prédios na área não eram muito altos: gente rica espalhava suas casas pelo chão, ao invés de lançá-las aos céus.

O telhado nunca estava completamente vazio. Daisuke não sabia se eles eram sentinelas ou apenas vampiros particularmente antissociais, mas pelo menos eles não o abordaram.

Em um dos lados da propriedade o telhado era próximo o suficiente do muro externo para que Daisuke tentasse um pulo. Foi fácil. Tão fácil, de fato, que foi mais um daqueles momentos em que Daisuke teve consciência de que não era mais humano. Em noites calmas, agora que não estava mais morrendo de fome, era fácil pensar em si mesmo como um refém, mártir, herói trágico... mas reféns podiam ser devolvidos, e mártires e heróis trágicos morriam, e nenhuma das duas coisas se aplicava a ele.

— Ei!

Foi tirado do seu devaneio pelo chamado de um dos vampiros do telhado, posicionado mais acima do que o grupo que normalmente ficava lá. Esse devia ser o sentinela.

— Só explorando. — Daisuke pulou de volta para o telhado.

Nos outros dias repetiu o exercício. Tinha certeza de que a qualquer momento Haruka o chamaria para impor algumas regras, mas queria aproveitar enquanto isso não acontecia. Daisuke chegou a dar uma volta inteira andando por cima do muro durante seus passeios noturnos. Os sentinelas não comentaram mais sobre isso, então desceu para a rua. Isso provocou uma reação. Num piscar de olhos o sentinela estava sobre o muro, pronto para pular sobre Daisuke se ele se afastasse demais.

Técnicas SanguíneasOnde histórias criam vida. Descubra agora