Por Essa, não Esperava

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Um presente pela vitória do Brasil.

-Bom dia, Mito.

-Bom dia, Madara.

Os dois estavam no escritório diariamente ocupado por Minato, outrora usado por Mito e antes dela, pelo finado marido dela.

A forma como se encaravam era uma clara evidência de um passado ressuscitando dos mortos, cheio de espinhos e de amarguras que nem o longo tempo apagou. Não era raiva um do outro, mas um desgosto, uma tristeza que os impregnava porque as palavras não foram ditas quando necessárias. O empregado deixou a bandeja com café num bule, fatias de bolos e duas xícaras e saiu. Mito avisou que não queria ser importunada até a hora do almoço, exceto em caso de vida ou morte.

-Você é indestrutível, Mito.

-Tenho minhas razões para permanecer nesta terra. Se Deus não me levou ainda, é porque ainda falta muito para eu fazer. Sirva-se do que quiser, Madara.

-Aceito o café porque nunca neguei seu café. - pôs um pouco na xícara. Os olhos empapuçados pelos anos ainda eram os mesmos. Olhos de corvo. Todos os Uchihas que Mito conheceu, e foram muitos, tinham olhos de corvo. Severos, agourentos e irremediavelmente inteligentes, que veem a alma. Mito odiava esses olhos pretos. Não importa o rosto em que estejam, esses olhos de corvo sempre são arrogantes. - Para que é que me chamou aqui, Mito?

-Quero contratar seu neto para fazer uns serviços para mim.

-Você pode pagar por uma equipe de empreiteiros de classe alta, deixe meu neto de mão.

-Não me diga o que fazer.

-Não estou dizendo, só peço que não mexa com o meu neto, por favor.

Ela bateu a bengala no chão e torceu a cara numa expressão de dor e tristeza.

-Você me deve, Madara. - Kushina e Minato ouviam do lado de fora, abaixo do peitoril da janela, porque estavam bem curiosos a respeito da relação da idosa com aquele velho estranho. A voz da matriarca soou tão sofrida que, por um segundo, sua filha achou que ela estava chorando. - Você me deve. Tirou tudo de mim, Madara, tudo o que eu tinha. Você me deve.

-Seu rancor é comigo, não com o meu neto. - perdeu sua impassividade para aquela expressão. Não se arrepende do que fez no passado, mas nunca foi sua intenção machucar Mito. Não ela, que era tão boa amiga durante a adolescência e a infância. E agora não aceitaria que os seus erros estragassem a vida de Sasuke, não agora que está se arranjando bem. - Deixe-o fora disso.

-Seu neto veio atrás do meu porque quis e agora... - ofegou. A idade pesa em sua voz. - Ele ficará conosco. Quer queira, quer não queira. Não pode me impedir de fazer isso.

-Mito, por favor...

Ela bateu a bengala de novo.

-Você tomou Hashirama de mim! - alegou alto. Kushina arregalou os olhos e o marido ficou mais atento. Nunca ouviu sua mãe falar assim com estranhos. - Quando ele me disse que deitava com você, nosso melhor amigo, eu não me importei. Era dever da esposa aceitar os amantes do marido. E eu sempre fui boa esposa, mas... - ela respirou fundo. Aquelas palavras estavam há tanto tempo presas em sua garganta que saíam ásperas como areia e cascalho, raspando sua língua. - Enquanto eu tivesse Hashirama, tudo estava bem.

-Não fiz por mal, nós só...

-Cale-se! Não me interrompa. Não basta a dor que me causou, quer me negar o direito de acusá-lo da verdade? Vocês, malditos corvos, ardis da minha vida, arrancam tudo de mim! - Madara comprimiu os lábios. - Contra o amor eu não luto. Eu sabia que Hashirama não me amava quando casou comigo, eu sabia que jamais o faria me amar porque ele amava você, mas você era um covarde. Não tinha forças para lutar contra os seus pais como ele fez por você. E me usaram como cobertura para os seus encontros amorosos. Eu aceitei tudo porque não estava sozinha... - ela começou a chorar. - Mas você levou Hashirama para longe de mim! Você, que era como um irmão querido e amado para mim, me abandonou à miséria e à vergonha de ser a esposa traída! Logo eu! Uma Uzumaki, traída por um maldito corvo arrogante e vil! Logo eu, que pensava em você como diferente!

O Cara da QuintaOnde histórias criam vida. Descubra agora