Nezumi tinha um dom que era seu calcanhar de Aquiles e ao mesmo tempo o paraíso, e este era os seus sonhos vívidos.
O tópico de sonhos ainda era um mistério para todas as pessoas. É claro que era do conhecimento de todos as fases do sono, porque temos paralisias do sono e até há teorias do porque sonhamos, mas não há um acordo universal sobre sonhos. De onde vem, por que se manifestam e às vezes somem, e qual a sua ligação com eventos futuros. Nezumi nunca foi espiritualizado, então não conseguia dizer se aquilo era algo dado por um algum guia a ele, mas aquele assunto ainda era uma incógnita, principalmente quando ele notou que seus sonhos eram completos e reais.
Noah não via cores quando sonhava, Nakko não ouvia sons, Safu simplesmente não sonhava. Nezumi vivia seus sonhos, ele sentia tudo como se estivesse vivendo, e isso o deixava incomodado.
Mas por que esse assunto de sonhos o intrigava? Por que ele sonhou com Shion, e acordou suado no meio da madrugada, trêmulo e grato por ter tido um sonho, e não presenciado um acontecimento real. Na verdade, os sonhos que ele costumava a ter com seu amado fluíam entre o amoroso e o sexo agressivo. A maior parte dos que ele vivia eram sobre sexo agressivo, enquanto a outra se baseava em cenários coloridos onde Shion apenas existia, e sonhos agridoces assim insistiam em serem confundidos com memórias passadas.
Mas seus sonhos após aquele encontro o fizeram ter pavor de dormir. Ele tinha vivenciado uma de suas brigas com Kalli que sempre o deixavam tremendo e sem ar, mas nesta, Kalli se transformava em Shion e tentava o matar. Não era algo para se ter tanto medo, exceto quando você sentia o ódio transbordando de alguém apenas pelo o olhar, quando você se sentia sob uma ameaça tão eminente que todos os seus músculos travavam. O segundo sonho deveria ter surgido por conta da foto que Shin se atreveu a mandar, o que resultou em puro erotismo - Nezumi odiava seus sonhos eróticos porque a probabilidade deles acontecerem quando comparada com a dos pesadelos acontecerem, era extremamente desanimadora.
Mas nesse sonho em específico, Shion lhe sussurrava para confiar nele. E o sentimento mórbido e inquietante que essas palavras lhe causaram fora o suficiente, ele sentiu como se aquelas palavras houvesse sido tatuadas no lóbulo de sua orelha. Aqueles sonhos o deixariam louco.
Talvez seja por isso que não há mais sonhadores no mundo, todos eles ficaram loucos com seus sonhos desconexos e morreram tentando descobrir o que tudo o que viam significava.
- Parece que alguém teve uma boa noite de sono após a saidinha de ontem - Itsuki falou assim que o viu descer as escadas.
Seus pais já estavam arrumados e com um bom humor imbatível, o que era irônico quando você levava em consideração que aqueles dois trabalhavam com coisas relativamente pesadas.
- Tive um pesadelo - Nezumi admitiu exausto e sentou-se despojadamente na cadeira.
Ichika, sua mãe, o olhou como um paciente em potencial. Nezumi fugia daquele olhar assim como o pecador foge do diabo na hora do arrebatamento. Ter pais que amavam o trabalho era assim, eles sempre queriam exercer a função quando tinham oportunidade.
- Você quer conversar sobre isso? - seu pai perguntou e Nezumi fez que não lentamente. - Pensei que você tinha saído pra se encontrar com alguém. Esse alguém era o Kalli? Por isso os pesadelos?
Ele voltou a negar. Se encontrar com Kalli era a última coisa que ele faria em sua vida, e esperava que esse encontro fosse somente na justiça, quando ele finalmente pedisse uma medida restritiva.
- Estive com o Shion ontem.
- Shion? Ah! Aquele garoto que te ligou quando você estava doente? - Ichika perguntou impressionada. - Ele é o seu namorado?