Nezumi perdeu a conta de quantas vezes pensou em Shion.
Não era normal alguém ser tão obcecado pelo próprio namorado assim, ele sabia, mas não podia fazer nada. Os dois estavam vivendo no extremo, e é no extremo que você encontra o seu ponto de paz. De todas as pessoas que Nezumi já tivera um relacionamento, Shion era o que lhe mais preocupava, e era por isso que sua imagem não saía da cabeça.
Precisar vê-lo era apenas uma maneira de confirmar que ele estava bem, e de preferência, vivo. Ora, Haru era louca, mas não dava indícios de que poderia sumir a qualquer momento, Kalli, bem, ele era mestre na arte de se vitimizar ou fazer chantagem psicológica. Shion não era assim, não. Ele não deixava Nezumi preocupado porque queria ou porque achava bom, ele tinha problemas reais que não dependiam de um relacionamento. Problemas que já existiam antes de Nezumi chegar.
O moreno suspirou exausto de tanto pensar e sentir, ele apertou o volante e pegou a chave para abrir o portão de casa. O encontro com sua avó secretamente fascista havia o desgastado e o deixado irritado. Como alguém poderia ser tão antigo e recusar o novo? Ele não entendia, mas teve que lidar com a mulher se referindo a Shion como se ele fosse uma garota. Uma bela garota loira, inteligente e que sem supervisão, se tornava um suicida em potencial. Era uma mistura de comicidade com tristeza.
A ideia de não aceitar o futuro sempre incomodou Nezumi. Talvez ele, por sempre ter tido os seus sentimentos validados e ter sido criado de uma forma positiva, visse as coisas de uma maneira diferente, e todas as vezes que seu mundo perfeito se chocava com o de outrem, ele se colocava a pensar em tudo; havia sido o mesmo com Shion.
Shion não havia superado o seu próprio pai morto, nem sequer havia entendido que ele morreu, e todo o luto que permaneceu dormente em seu peito, havia acordado ferozmente. Nezumi sentiu-se confuso quando notou essas coisas em seu próprio namorado, mas mais estranhou o fato de que o que o outro sentia era difícil de se compreender. Luto era uma coisa única, exclusiva, não padronizada, pessoas sentiam o luto da forma que seus cérebros permitiam, então Nezumi não entendia, mas também não julgava. Em um certo ponto ele se sentia patético e insensivel demais, Shion estava passando por uma metamorfose, e tudo o que Nezumi podia fazer era assistir e torcer para acabar logo.
Era rude de sua parte querer que seu namorado melhorasse logo? Por que ele sentia que era, mas não sabia explicar necessariamente o porquê. E muitas das vezes ele se pegava pensando em como era um idiota por pensar daquele jeito. Ele estava feliz por Shion, e isso bastava. Seu namorado merecia ser feliz assim como todo mundo.
— Você vai entrar? — ele ouviu a voz de seu pai vindo de algum lugar na casa, e então acelerou o carro para o colocar na garagem.
Sua mente estava a um milhão, todas as vezes que ele visitava a sua avó acabava assim, perdido no tempo-espaço.
— O que vai ter hoje pra jantar, mãe? — Nezumi perguntou assim que colocou seus pés dentro de casa, ele podia ouvir seus pais conversando alto da cozinha sobre alguma coisa que parecia distante, borrado.
— Noite de pizza em família! — seu pai respondeu. — Quer convidar o Shion?
Nezumi coçou sua cabeça ao ouvir aquilo, querer ele queria, mas a pergunta era: seu namorado seria liberado? Ele estava trancado a sete chaves, não tinha uma perspectiva de sair tão cedo para algum outro lugar que não fosse a escola. E que triste era pensar daquele jeito, Nezumi sempre foi criado "solto", seus pais lhe deixavam ter experiências boas e más, e seus antigos parceiros também tinham essa liberdade, mas Shion era diferente, e isso o deixava um pouco incomodado.
Lentamente ele flutuou até a cozinha e sentou-se, observando os seus pais brincarem de guerra de dedões enquanto seu cansaço se acentuava em seus ombros.