Without a soul;
my spirit's sleeping somewhere cold,
until you find it there and lead it back home.
Eu amo você, Roza.
A voz é rouca e carregada de sotaque e dor. Ela ecoa, as vogais se estendendo no espaço e no tempo, como se estivesse em uma capela. Também está distante, abafada; da mesa maneira que ouvimos as vozes quando estamos debaixo d'água. Tão distante e ao mesmo tempo tão perto.
Eu amo você.
A dor é tão profunda e afiada que seria capaz de rasgar os tecidos de seu coração. Ouvi-la quase causa uma dor física. O amor não deveria causar tanta dor assim. O amor deveria te fazer inflar feito um balão de ar e flutuar pelo céu. Deveria te fazer sorrir como se fosse impossível parar, o peito formigando de excitação que te faz quase dar pulos. A voz é tão intensa, o amor tão real em suas palavras assim como a imensa dor. Está errado. Algo está muito errado.
Roza. Roza. Roza.
É uma prece. Chama por ela com adoração, amor e dor. Chama por ela com o peito em chamas, os sentimentos confusos e perturbados. Quem é aquela por quem chama? Um anjo para que ajude a superar as dificuldades? Uma santa para lhe confortar nas horas mais difíceis? Talvez os dois. Ou talvez a terceira opção: a amada há muito perdida, cujo nome, semblante, cheiro e voz povoa sua mente como um ser iluminado a ser adorado. A amada a qual pede por ajuda, a qual pede por conforto, a qual decidiu amar a vida inteira e após.
Por favor. Roza. Eu te amo.
A voz se distancia mais ao passo em que escuridão avança. O vazio se aproxima sorrateiramente, um gato perseguindo o rato e o encurralando-o na parede.
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A dor volta. É uma dor estranha, como se não fosse sua. Ela corta se corpo em milhares de pedaços então os juntam novamente apenas para fatia-lo mais uma vez. Um ciclo sem fim e cansativo; mina suas forças, a enche de agonia e a faz querer gritar. Mas não há mais voz ou força. Também não há mais corpo.
Claro, escuro.
Quente, frio.
Dor, alívio.
É uma montanha-russa de sensações e está cansada. Quer dormir. Quer paz e tranquilidade, porque não lhe dão isso? Está tão cansada...
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Sol esquenta sua pele e Rose abre os olhos. O céu está azul e as nuvens brincam de se formar, grandes ovelhas na imensidão. Sente a grama formigando em suas costas. Fecha as mãos na terra, sentindo sua umidade e frescor.
– Você não deveria estar aqui.
Rose vira a cabeça devagar e se depara com um homem alto sentado ao seu lado. Dimitri.
– O que? – indaga confusa, sem se mover.
– Você não deveria estar aqui. – Dimitri parece sereno e triste. Por que ele está triste? – Você tem que voltar, Rose.
– Do que você está falando? – ela sorri. Abre uma das mãos e estica em sua direção – Eu estou bem aqui, com você.
O sorriso de Dimitri é pequeno e ele não a toca.
– Não, não está. Volte, Rose. Você é forte. Precisam de você.
Agora Rose se senta, sem entender. O movimento a deixa tonta e a paisagem onde se encontra oscila em seus olhos.
– Dimitri, você está se comunicando em códigos e eu não estou seguindo. Porque não podemos aproveitar esse dia lindo de sol?
– Porque aqui não existe. É tudo parte da sua mente.
– Camarada, eu sei que falo que às vezes você é muito sério, mas se for fazer brincadeiras sem graça assim prefiro que continue sem fazê-las.
O homem não responde. Ele a encara com carinho e ergue a mão para tocar o rosto de Rose. É tão suave e tão leve seu toque que é quase imperceptível.
– Volte, Rose. Volte para mim.
O brilho do sol se intensifica e ofusca sua visão. Tudo desaparece.
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Nada. Flutua no nada. Mas deve haver algo, ou não estaria ali. Ou então também não existe.
Tenta se lembrar de seu nome, mas não recorda. Não consegue se mover, não consegue se sentir. Está tudo vazio e negro. Deveria se sentir perturbada e assustada, mas nada sente.
O nada é preenchido por um perfume. É masculino e suave, porém marcante. Sente notas amadeiradas conhecidas. O perfume traz consigo algo mais. Vibrações. Vibrações e pulsos elétricos que parecem formar seu corpo. Sente seus dedos, suas pernas e seus braços, embora não consiga mexe-los.
Algo toca sua mão. É quente e confortável, e traz segurança. É um toque suave e ao mesmo tempo intenso. O toque arrepia sua nova pele e acelera o coração que não sabia existir. Seus batimentos ecoam em seus ouvidos ritmados. Tum. Tum. Tum. Tum.
Roza.
A voz. Já ouviu essa voz. Sua respiração pesa e seus olhos se enchem de lágrimas. A voz. Ela é algo. O dono dela é algo. Peças faltam nesse quebra-cabeça, a confusão se intensifica. O que está acontecendo? Se pergunta.
Sentimentos tomam forma. São marcantes como o perfume, quentes como o toque e intensos como a voz. Um redemoinho deles. Carinho, amizade, também tristeza e raiva. E amor. O amor queima de dentro para fora, mas é um fogo diferente. Não machuca, não incomoda. Ele aquece e protege, e é tão intenso que seu coração parece não bater rápido o suficiente para contê-lo.
Dimitri.
O nome se forma em sua mente. É o nome do perfume, do toque e da voz. É o nome que instiga força e perseverança.
Dimitri.
Onde está Dimitri? Por que não estão juntos? Eles se pertencem um ao outro com tamanha força que moveria céus e infernos. O amor explode como fogos de artifícios ao som desse nome, e um lapso de consciência se faz presente.
Precisa encontra-lo. Precisa saber se ele está bem. Precisa de Dimitri e ele precisa dela.
Precisa espantar a escuridão e o vazio, trazer para si a luz e a consciência. Precisa libertar-se do que quer que a esteja prendendo longe de Dimitri.
Volte para mim, Roza.
Wake me up inside.
Call my name and save me from the dark.
Bid my blood to run.
Before I come undone.
Save me from the nothing I've become.
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Enchanted
RomanceJá houve uma época na sua vida que quase tudo lhe parecia cansativo e falso? Rose se sentia sufocada. Eram muitas coisas a sua volta e isso a ensurdecia, não dando a chance de ouvir seus próprios pensamentos e segui-los. Fatigada, em uma noite que e...