Antes, Fazenda Haavik - Noruega.
O boi ossudo sacudiu as orelhas enquanto empurrei o arado afiado contra a terra lamacenta, para acabar com o restante do trabalho. O sol do final da tarde derramava-se pelas valas paralelas e contra as minhas costas largas, despidas. Usei uma mão suja de terra para afastar um fio negro do rosto, limpando o suor, sem me importar com as pequenas pedras pulando contra o meu corpo. Uma havia me acertado recentemente causando um pequeno corte na testa. Dei um sobressalto com o instrumento, assustando o boi que puxou as rédeas de couro marrom. O sangue grudento escorreu junto ao cansaço e a relha se enterrou na terra.
Naya, que colhia as últimas flores silvestres de verão para fazer chá e também para vender ao curandeiro, pondo as melhores delas cuidadosamente dentro do balaio, conseguiu me observar graças à sombra que o seu chapéu de palha projetava em seu rosto.
— Ficará cicatriz? — Questionei para Naya, quando esta insistiu para que eu repousasse na margem fria da fazenda para fazer um curativo, mantendo o meu olhar impassível contra a mulher.
Não me importava com cicatrizes, sabia que era impossível evita-las. O trabalho na fazenda era árduo demais para conseguir esse feito e mesmo assim eu me esforçava, mas não por mim e sim por Rubi e por toda a integridade da imagem divina da Ordem Lapidada.
Rubi de Alvorada repudiava qualquer marca de cicatriz, "você não pode, você é um deus! Um símbolo de Adamantem. Acha que Adamas carrega cicatrizes em sua Estrutura Lapidada? Ele é uma figura divina assim como você, jamais terá algo que represente a fraqueza. Não deixe que vejam marcas humanas em você, Ethan. Não deixe que vejam o seu ponto fraco".
Mas naquela manhã, Naya olhou para os meus olhos como se fosse a última coisa que veria em toda sua vida, Se viu em mim, um ser que sangra, que sente dor. Como se aquela nova ferida representasse algo mais real e mais próximo a ela do que um Deus de Diamante. Me sentia angustiado por isso, gostava do gosto catártico do corpo humano, do encanto dos sentimentos, da capacidade de sentir a felicidade das pessoas apenas por compreensão e não cujo Potencial Mágico inimaginavelmente poderoso jorra num acender de olhos, como com Zircônio ou Lansafira.
Naya entendeu a minha preocupação, entendeu a minha guerra. Ela sempre entendia, porque era quem estava comigo. A quem uma parte de mim pertencia. Respirou fundo e pôs a mão em minha testa para poder esfregar um tecido grosseiro sobre a minha pele mais uma vez. Recolheu um cado de água, espremendo-o e colocando-o novamente sobre a ferida na minha testa.
— Ter cicatrizes é importante para nos lembrarmos de que somos fortes — Naya respondeu, suave, tentando me tranquilizar, fortalecer e me tornar mais humano. Contradizer tudo o que era posto contra o Fruto Sagrado, mas era tarde demais para isso. Os estudos reproduziam cada passo da minha vida. — Lembre-se do que seu avô diz, Ethan. Só quem foi para a guerra, sabe o que é uma guerra.
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𝔉𝔦𝔩𝔥𝔬 𝔡𝔞 𝔖𝔞𝔩𝔳𝔞çã𝔬
FantasyFruto Sagrado está à beira de sua condenação após permitir que Opala tomasse o poder do Caadal e após assassinar o seu próprio pai, Adamas. O Deus Diamantense que sobreviveu há milhares de anos condenados e que em seu último minuto de vida, concebeu...