Lacrimosa

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O piano era incrível. Ele ficava em um cômodo cuja porta se situava na cozinha. Sim, onde Ciel acreditava ser uma lavanderia. Era uma segunda sala, com um piano, sofás, alguns livros. A cor predominante era branco, o que apenas destacava ainda mais a cor do piano. Ele era grande, de cauda, com todas as 7 oitavas e suas 88 teclas. Ciel não pôde deixar de contar todas elas e perceber que ele possuía mais uma terça menor. Aquilo era um piano de profissional. Deveria ter custado mais do que sua alma jamais valeria.

"Não sei como ele está. Faz mais de um ano que um homem veio aqui avaliar o piano e disse que ainda estava em ótimas condições." Sebastian se explicou.

"Imagine! É perfeito! Eu nunca vi um piano tão lindo. É mais bonito que o do Concert Hall!" Ciel estava tão excitado com aquela visão, que ele tinha vontade de abraçar o piano e levar embora para casa. Não que ele coubesse em sua casa. E Ciel não seria forte o suficiente.

"Ninguém sabe se um piano é perfeito até tocar." Sebastian se sentou ao sofá daquela sala. "Boa sorte."

"Obrigado." O jovem encarou as teclas. Ele nem sabia se conseguiria tocar naquilo. O piano de sua tia não chegava nem aos pés desse instrumento de corda divino. Era isso. Se Deus existisse, era óbvio que ele tinha esculpido aquele piano à mão. Ele não queria testar nada que não fosse uma música de verdade. Assim, tocou Canon in D. E teria sido perfeito se ele não tivesse cometido tantos erros.

As teclas eram mais pesadas do que o esperado, ele esbarrava nas notas vizinhas. Ele não conseguia fazer saltos muito largos por subestimar o tamanho do piano. Por um momento, ele estava grato por Sebastian ser surdo. Provavelmente era melhor ser surdo a ouvir aquilo.

Mesmo assim, o piano soava bem. As notas estavam perfeitas e sem nenhum erro. Era muito melhor do que ele poderia imaginar. A vontade de sequestrar o piano só aumentava.

A casa de Sebastian era o paraíso: ele não pagava por nada, não precisava cozinhar, lavar, passar, ele tinha um piano a sua disposição, e poderia tocar quando quisesse já que o dono da casa era surdo. Onde mais ele poderia morar? Nenhum lugar jamais seria bom como esse.

"E então?" Sebastian questionou, vendo que Ciel estava com as mãos no colo, encarando o instrumento.

"Ele é bom demais para mim." Foi tudo que o jovem conseguiu expor de seus sentimentos.

"Isso é ruim." Ele virou uma página de seu livro. "Com treino, tenho certeza de que vai melhorar."

Se aquele piano viesse a engolir Ciel, no sentido literal, ele morreria feliz. As manchetes diriam que ele foi devorado pelo melhor piano do mundo. Talvez assim ele conseguisse usar um pouco do talento do instrumento.

"Fique à vontade para treinar. Só tome cuidado com ele. Como você deve imaginar, é um piano muito bem avaliado e caro." Sebastian cruzou as pernas, demonstrando que estava entediado. Não adiantava. Seu dia só parecia render quando ele trabalhava em seu livro.

"Desculpe perguntar, mas... Quanto vale esse piano?" Ciel queria saber, porque ele precisava comprar um idêntico.

"Depende... O valor do piano em si, uns 500 mil dólares. Mas acho que o preço aumenta por ele ter sido tocado pelo meu pai." Ele suspirou. "Já me ofereceram valores exorbitantes, mas eu achei que era errado vender o piano da família, e o melhor era deixá-lo guardado até ter alguma utilidade."

Ciel encarou as teclas. Ele não entendia como poderia valer tanto, ou como as pessoas poderiam falar com tanta simplicidade sobre isso. "Acho que se eu vendesse a casa dos meus pais, todos os itens, e também vendesse os meus pais para o mercado de escravos, eu ainda não teria todo esse dinheiro."

I Just Want to Hear YouOnde histórias criam vida. Descubra agora