capitulo 8

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Ultimamente, eu tenho me perdido em você. O dia amanheceu estranhamente calmo. Eu despertei mais cedo do que de costume, creio que a razão seja o fato de que estou estranhamente agitada, mas isso não tem relevância. O fato é que eu estava admirando o nascer do sol e me deixei a mercê da brisa leve da manhã. A vista da varanda do meu quarto é deveras encantadora e eu nunca havia parado para observar tal detalhe.

Eu nunca passei tanto tempo em uma batalha perdida. Mil e uma coisas se passavam pela minha cabeça. É como se eu estivesse me afundando mas a sensação fosse o oposto disso. É tudo muito novo, só que me parece tão íntimo e tão antigo. É um sentimento ansioso e quente. Posso lhe contar um segredo? Tenho pavor da ideia de abandonar o meu egoísmo. Tenho pânico de descobrir o que existe além do que sou agora. Tenho medo de entender a farsa que habita dentro de mim.

Entre esses mil e um pensamentos, o sorriso dela era o que mais prevalecia. Ah meu amigo, pelo visto serei escrava da mentira e seguirei perdendo todas as noites e dias. A verdade é que não quero deixá-la sozinha, mas daqui a seis meses eu ficarei sem amor e terei que assisti-la partir. Sim, tenho consciência do tempo limite dado pela minha mãe e sei das consequências. Sim, também sei que deveria ter o senso e contar tudo agora, só que eu sou egoísta, se lembra?

Eu não posso aguentar o peso do que sinto. E assim, vendo o nascer do sol, penso que o melhor é não sentir e jamais esquecer as razões que têm me levado a assistir desenhos até Emma adormecer. Eu fico em seu quarto até vê-la serena em seu sono e depois saio sorrateiramente. E sorrateiramente, serei obrigada a sair da sua vida.

E aqui estamos nós, outra vez vivendo o futuro, sem nem compreender a mentira do agora.

— Pra você! — Augusto me entregou uma xícara de chá. Eu não havia notado a sua chegada.

— Eu odeio chá. — Eu disse, mas bebi o líquido quente. Pelo menos estava quente. Ufa.

— Eu sei. O seu vício é em tudo que faz mal, inclusive o excesso do café.

— Por isso nasci brasileira. O país das maravilhas e dos pecados. Eu não saberia ser europeia, Deus me livre. Mil vezes o meu estômago queimando, mas a minha alma podendo sentir o prazer de ingerir uma bebida descente pela manhã.

— Eu vou simplesmente te ignorar, Isadora.

Augusto deu de ombros e resolveu olhar para o céu azul. O meu amigo também gosta de belas paisagens.

— O que veio fazer aqui?

Augusto respirou fundo e pareceu estar organizando a sua resposta.

— Te trazer chá?!

— Sem gracinhas, por favor.

— Tenho medo de tudo que tem acontecido. — Ele disse. — Eu te conheço bem, Regina. A hora que tudo acabar, toda essa sua coragem se transformará em desespero. Não quero vê-la se perder em mais vícios.

— Eu estou bem. Desde o acontecido, tenho ficado firme. Não bebo, não fumo e não me drogo.

— É exatamente esse o problema. Tudo na sua vida é o extremo. — Augusto se virou para me olhar nos olhos. — Só não se apegue na garota, por favor. Isso seria a sua perdição. Se você resolveu mentir, okay, mas não vista essa fantasia por completo. 

Um breve silêncio.

— Você pode me ajudar com o trabalho de hoje? Preciso acabar rápido para levá-la ao cinema.

Augusto riu e balançou a cabeça. Ele parecia não estar acreditando no que ouvia. O meu amigo sabe que independente do que for falado, irei agir impulsivamente.

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