capitulo 10

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Alguns dias depois.
 
Embora eu tenha tentado, ainda não consigo esquecer. Em nenhum momento dona Cora se fez presente. Em algumas noites o pesadelo me atormentava, em outras, a minha própria consciência e em nenhuma pude segurar em sua mão. É engraçado a maneira que ela me faz parecer uma frágil boneca de porcelana.

Eu sei que não deveria dar tanta importância para uma ausência sempre presente. Como posso sentir a necessidade de algo que nunca tive? Me lembro bem de uma madrugada qualquer, por volta dos meus oito anos, onde o desespero se transformou em febre e o medo me sufocava... ah meu amigo, Dona Cora estava em uma viagem de negócios. Eu precisava dela ali, mas também fui feliz com o carinho do meu pai.

Você me deixou para trás. Será que Dona Cora tinha medo de me ver afastá-la dos seus sonhos? Ela adora a ideia de ser a mulher do ano, capa de revista e ser lembrada como a melhor empresaria. Já eu adoraria a ideia de tê-la ao meu lado. Confesso que não sei expressar isso em palavras, só que não é tão difícil de decifrar.

Em noites assim sem amor, vejo o sol nascendo e as lágrimas secando. Eu não queria sair do quarto, não hoje. E tudo bem. É que é meu aniversário e talvez Dona Cora não se lembre disso.
Três batidas na porta. Eu não respondi mas dona Rosa entrou do mesmo jeito.

— Parabéns pra você, parabéns pra você, parabéns pra você! — Ela cantarolava apenas essa parte e sorria.

— Obrigada, Rosinha. — Eu disse e ela veio me abraçar.

— Te desejo juízo, muito juízo. — Beijou-me na testa. — E trate de se arrumar logo para descer e tomar o café.

Eu tentei questionar mas não fui ouvida. Rosa me deixou sem opções e sem abertura para reclamações. Acabei me arrumando, forçando um sorriso e descendo para a sala.

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Não sei porque precisamos nos magoar desse jeito. Confesso que o meu coração reagiu ao vê-la conversando com Emma. Eu até esqueci que a minha noite de sono havia sido péssima. Quem disse que a verdade é linda? Eu até esqueci que dona Cora poderia estar contando as minhas mentiras para ela.

Naquele instante, o meu desejo era de esquecer absolutamente tudo que há de errado e fingir que não existiria mais problemas. Será que dona Cora compreende a dimensão de estar por perto? Eu queria tanto que ela fosse o meu porto seguro também. Às vezes penso que somos iguais e por isso temos dificuldades em nos conectar.

Enfim, deixemos isso de lado.
O meu pai também estava presente. Ele foi o primeiro a correr me abraçar e me desejar as coisas mais lindas deste mundo. Seu Henry me trata como uma eterna criança. Eu gosto do seu amor. Eu gosto da pureza da nossa relação.

— Por quê não me contou que era o seu aniversário, Rê? — Emma perguntou.

— Não achei que fosse importante.  — Eu respondi e dei de ombros.

Depois de toda a demonstração de carinho do meu pai, me afastei e me sentei no sofá, ao lado da cadeira de rodas de Emma.
— Parabéns, Regina. — Foi tudo o que Dona Cora  ousou dizer. Não houve abraços e nem longos sorrisos, mas pelo menos desta vez ela não estava viajando.

— Obrigada.

Um breve silêncio.

— Eu amei conhecer novamente a sua mãe. Nós até que nos entendemos bem. — Emma comentou.

— Eu imagino que sim. Dona Cora sabe ser simpática com os demais. — Comentei e pude notar o seu olhar sobre mim.

— Filha, a dona Rosa fez um bolo maravilhoso para você. — O meu pai nos interrompeu antes que virasse discussão.

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