Alice

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Era ridículo a maneira que meu pai estava me tratando, como se ele nunca tivesse se afastado, como se a doença que ele sofria não estivesse dizendo que daqui a pouco tempo ele morreria. Eu tentei ser educada nos primeiros dias, tentei entender cada uma de suas atitudes e falas. Agradeci gentilmente e recusei cada presente.

–Tudo bem, vou vender todos os animais para um abatedouro e mandar o Calebe embora. – disse depois que insisti que eu não poderia cuidar do haras.

– Não seria capaz de uma coisa dessas, – eu disse em um tom de ameaça. – Seu prejuízo seria enorme.

– Não ligo para isso – dando de ombros.

– Isso é chantagem! – e nem parecia ter sido ouvida.

– Chantagem ou não, o destino dos seus animais e do Calebe está em suas mãos. E pelo que fiquei sabendo, a fama dele não é muito boa na região. Acho difícil ele encontrar outro emprego tão rápido.

Não conseguia ficar no mesmo ambiente que ele nem por mais um minuto, sem que eu o ferisse. Desesperada entrei no quarto, deitei-me na cama e chorei até dormir, como não tinha jantado ainda, uma bandeja foi colocado em cima da cômoda, com algumas frutas. Aninha e dona Menina estavam me tratando melhor que o anfitrião.

Era quarta-feira quando eu precisei ir à cidade buscar alguns medicamentos, Pascoal queria que eu estivesse a par de tudo e eu não sabia exatamente o que fazer, desde o ocorrido não nos falamos direito. Telefonei para o professor Danilo, eu precisava de ajuda urgentemente. Todas as coisas básicas eu tinha feito com Jorge, pesagem, marcação, apartação de lotes. Mas os animais precisavam de acabamento*, o que eu não sabia proporcionar a eles nutricionalmente falando, pois ainda não sabia formular dietas.

Ei Jorge, já que viemos no meu carro. Que tal, você sofrer um pouquinho de emoção?

– Não entendi dona Alice.

– Eu dirijo a partir de agora. Não esqueça de colocar o cinto. – Eu o vi engolindo em seco.

Dirigi como uma verdadeira motorista, graças a Deus o carro é automático, mas quando parei na frente da casa da minha tia, vi meu companheiro segurando a lateral do banco com um pouco mais de força que o normal. Buzinei e Regiane e Anísia saíram com suas malas, nos cumprimentamos e quando elas iam entrar, eu ri de um pensamento que me veio.

– Ei Jorge pode trocar de lugar com a Rê, acho que vai ficar menos tenso conversando com minha tia. – Sem dizer uma palavra ele desceu e entrou no banco de trás.

– Vivi, o que você fez com o pobre do Jorge? ele está amarelo – a prima me questionou.

– Ele ficar bem, não esqueçam do cinto.

Como esperado minha tia iniciou uma conversa com Jorge que se distraiu totalmente do trânsito, eu e Regiane riamos baixinho as vezes e conversávamos sobre o trabalho. Chegamos sã e salvos na fazenda e havia outro carro estacionado, um jaguar vermelho, muito chamativo na minha opinião, mas não liguei. Ajudei Jorge, fui ao estabulo, levei alguns utensílios que precisávamos, e quando enfim estava em meu quarto, um pequeno homenzinho apareceu e agarrou minhas pernas, ele devia ter dois anos, o peguei no colo.

– Oi rapaz, tudo bem?

– Oi maninha – ele disse e meu coração parou. Aninha chegou no mesmo instante e arregalou os olhos castanhos.

– Como se chama? – só meu irmão mais novo me chamava daquele jeito.

– Ben.

– Ben, eu preciso resolver uma coisa rapidinho e depois a gente brinca. – E sibilei para Aninha que o tirasse daquele lugar. E me dirigi ao escritório.

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