Alice

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O despertador indicava 6:30, hora de levantar, mas eu ainda estava abraçada com a privada, muito antes daquele horário. E não, não era por passar da conta com bebida alcóolica que estava naquela situação.

– Você devia ter ido – disse Joyce atrás da porta, – pelo menos agora teria motivos para colocar os bofes para fora Alice.

– Você não está jogando nada para fora nesse momento – retruquei me levantando.

– Eu bebo socialmente gata. – Talvez a maior mentira que já ouvi.

O motivo do meu desespero era uma prova, que aconteceria em menos de duas horas, alterando meu estado e atacando minha gastrite. Uma doença causada por uma mente ansiosa e muito rígida consigo mesma e naquele instante, precisava se recompor. A medicação não fazia mais efeito, então depois de um banho quente e um chá bem forte, subi de bicicleta para a faculdade, já estava no quarto período e era uma nerd de poucos amigos.

O suor escorria na testa quando entrei na sala, na verdade seriam duas turmas fazendo a mesma prova, o nível de reprovação nessa matéria era altíssimo e eu tinha uma crise de nervos quando o professor se aproximava de mim. Danilo, o homem da nutrição de ruminantes, seus olhos me davam medo, ao contrário da maioria das colegas que o achava um charme, para mim, sempre foi difícil conversar, e em suas aulas quase não se ouvia minha voz.

Ao me sentar, constatei que estava em um péssimo lugar, nunca gostei do centro da sala, sempre nos cantos, aquilo me mantinha segura, mas ali, estava exposta. A maioria dos alunos chegaram mais cedo e garantiram seus lugares para esconderem suas enormes listas de cola. Quando enfim a prova foi entregue, não parecia compreender nada do que estava escrito e simplesmente não conseguia aguentar e sai em disparada ao banheiro.

A Zootecnia tinha ganhado meu coração e eu me empenhava ao máximo para ter boas notas e não desonrar todo esforço que minha mãe e meus avós estavam fazendo para me manter no interior. Sendo a mais nova de três filhos que Helena criou sozinha, eu ainda não havia dado resultados. Aline a primogênita, morava fora do país e dava aula em uma universidade, Gustavo aos seus vinte anos tinha conquistado o próprio negócio. E eu quis entrar nas agrarias e trabalhar com assistência em propriedades rurais.

Algumas horas mais tarde, constatei que um dos meus piores pesadelos se tornou realidade, iria reprovar na matéria. Eu estagiava por uma bolsa permanência, prestando serviço na recepção da universidade e mantive a postura, eu levava o meu trabalho muito a sério. Mas em casa com a cara inchada e o estômago pegando fogo adormeci.

– Oi, – atendi sem enxergar quem era.

– Bom dia Branquela, como foi a prova?

– Eu reprovei mãe. Me desculpa sei o tanto que trabalha para me manter aqui, mas eu não consegui raciocinar e ainda vomitei na faculdade, – desabafei.

– Filha, calma. Eu sei, mas você precisa superar esse medo. Todo mundo sabe que você conhece toda a matéria, mas se não se acalmar não vai conseguir ser aprovada, nem se passar o ano todo estudando isso. Mas como você está hoje? Semestre que vem você vai conseguir.

Minha mãe exigia muito dos três filhos, principalmente das duas mulheres, Aline e Alice. Gustavo, no entanto, odiava estudar e desde pequeno era o motivo da queda dos cabelos de minha mãe. Ela só diminuiu as exigências, quando a mais velha estava formada e se casou, e o do meio saiu da escola e montou sua loja de açaí, que logo se tornou uma franquia. No terceiro ano do ensino médio, não precisava mais da pressão da minha mãe, eu mesmo me pressionava a ponto de adoecer. Mas finalmente, como minha irmã, eu passei em uma universidade pública, o que não era uma opção dentro de casa. Havia só um problema, era em outra cidade, então, me mudei para São Luís de Montes Belos, interior de Goiás.

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