7. Escadaria para o céu

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Esther acordou cedo naquele sábado nublado e logo arrumou sua cama.
Seu pai já estava aguardando para levar a filha para a rodoviária para ela ir ao Retiro Levita.
Já faziam 7 anos que Esther era considerada um prodígio com sua voz entre as levitas mas esse ano Esther tinha outros planos.
- Não quer mesmo que eu a leve de carro? - disse o Sr. Parker
- Não, papai, prefiro ir no ônibus da igreja!
O ônibus fretado sairia da rodoviária de Brigham City rumo a Salt Lake City na sede da congregação.
Sr. Parker deixou a filha na rodoviária e se despediu com um beijo na testa dela:
- Deus te proteja, minha filha. Mande meus cumprimemtos a reverenda Clair!
- Certamente papai! -respondeu Esther
A garota via seu pai se afastar com o carro, enquanto um frio percorria sua espinha e borboletas voavam alvoroçadas em seu estômago.
Ela se dirigiu ao guichê da Royal Bus e comprou uma passagem para Denver apresentando sua identidade falsa que estava escrito: Penelope Grace Baker e constava que a jovem Penny tinha 19 anos.
Ela pegou suas passagens e aguardou ansiosa pelo ônibus que a levaria ao seu sonho: ver Lennie de perto!
Após duas horas de espera o ônibus chegou e ela embarcou na sua jornada, eram 8 horas da manhã, ela chegaria ao seu destino por volta das 7:00pm , tempo suficiente para pegar um bom lugar na pista.
Durante todo o trajeto ela foi ouvindo em seu walkman que compara escondido de seus pais uma nova k7 da Sharon' s Ghost que ela havia ganhado de Rick e a mantinha escondida em seu estojo escolar.
A viajem seria longa mas valeria a pena.
Eram 7:34pm quando o ônibus parou na rodoviária de Denver, no Colorado.
Penny desceu do ônibus e ao se alongar percebeu que nunca havia viajado sozinha e nunca havia cruzado a fronteira de Utah e o desespero enfim tomou conta dela:
- O que eu estou fazendo, meu Deus? - murmurava para si mesma enquanto andava devagar pela rodoviária com sua mochila nas costas.
Ao sair da rodoviária, entre bêbados, moradores de rua e prostitutas ela viu um grupo de três garotas, uma ruiva bem alta, e as outras duas de longos cabelos pretos vestindo como se fosse um tipo de uniforme shorts surrados minúsculos, meias calça pretas rasgadas, coturno de cano longo e, estampado em suas camisetas ali estava o rosto de Lennie Sharon!
- Meninas! Ei! -gritou Penny
As três garotas olharam para Penny confusas e uma delas disse:
- Não estamos interessadas em salvação não, moça.
As outras duas garotas riram
Foi quando Penny se deu conta que estava vestindo uma saia bege abaixo dos joelhos, camiseta da congregação, sapatos de boneca e cabelos presos em trança.
- Eu sou Penny e estou indo para o show da Sharon's Ghost
As três se entreolharam surpresas por um instante mas logo caíram na risada! Como aquela garota estranha com roupa de crente estaria indo para um show de heavy metal?
Foi quando Penny tirou os fones do seu walkman e aumentou o volume revelando o que a garota escutava.
Nesse momento as garotas pararam de rir e se aproximaram de Penny
-Garota, disse a ruiva alta - Que merda de roupa é essa?
- É a roupa que filhas de pastor usam para enganar o pai e fugir pra Denver - respondeu Penny com um sorriso
-Uma crente fujona... - riu a ruiva - gostei de você! Meu nome é Mariska, essas são Chloe e Lori disse apontando para as outras que a cumprimentaram. Nós estamos viajando a um mês atrás dos rapazes!
- Esse é meu primeiro show, mas sou fã deles a muitos anos...
-Garota, vem com a gente...Porque desse jeito você não vai andar com a gente não - disse Chloe
-Pra onde? - perguntou Penny
- Para o nosso hotel
Chloe disse isso passando seu braço no braço de Penny, em seguida Lori fez o mesmo e o quarteto rumou para um pequeno hotel a duas quadras dali.
Aquele hotel mais parecia ter saído daqueles filmes de gangsters de Los Angeles, com direito a prostitutas na calçada com seus vestidos curtos , bêbados e viciados pelas calçadas.
Elas adentraram o hotel e subiram uma pequena escada até um quarto com 3 camas.
- Quanto você calça? Perguntou Mariska
- 36 - disse Penny
- Ótimo! Calce essas botas aqui - disse atirando um
par de botas de cano médio no colo de Penny, enquanto Lori e Chloe desfaziam as tranças no cabelo de Penny.
Em menos e trinta minutos Penny parecia outra pessoa, suas tranças deram lugar a um cabelo cacheado com gel, dando um efeito molhado e seus olhos agora estavam ostentando um delineado bem forte enquanto sua boca havia sido perfeitamente pintada com um batom na cor vermelho sangue que era de Lori e a mesma entregou a Penny como um presente que ela carinhosamente guardou.
-Agora vem com a gente, rápido que já são quase 9pm !
As meninas desceram as escadas e Lori trocou algumas palavras com uma das prostitutas na porta do hotel, que sorriu para Penny e pediu que elas a seguissem
- Onde vamos? - Questionou Penny apreensiva
- Essa é Bonnie, ela tem um brechó durante o dia, talvez tenha uma roupa legal para você.
As meninas andaram alguns metros e Bonnie abriu uma pequena portinha comercial e acendeu as luzes, era um brechó com cheiro de poeira, incenso e naftalina.
- Short ou saia? -perguntou Bonnie
- Saia, eu acho...
Bonnie tirou várias saias de uma prateleira e Penny notou que uma delas parecia muito uma saia que a garota do clipe de Special usava: uma saia rodada, estilo colegial, xadrez preto e cinza que ficava um palmo acima dos joelhos.
Penny a vestiu e ela combinou perfeitamente com as botas que Mariska emprestou.
Na parte de cima, Chloe sugeriu um corpete preto que mais parecia uma lingerie
- Não posso sair por aí de lingerie - disse Penny arrancando risada das demais
-A gente joga uma jaqueta por cima! - disse Bonnie
- Sim! E caso você não se sentir confortável, na porta do show você compra uma camiseta da banda! - completou Lori.
Passado o desconforto inicial de Penny usando aquela roupa que ela jamais sonhara usar, ela olhou no espelho e viu o mulherão que existia ali e soube naquele momento que aquela era Penny de verdade.
Penny pagou a mulher e as garotas rumaram para a porta do Master Hall, a casa de eventos onde aconteceria o show.
Eram cerca de 10:00pm quando elas chegaram e o movimento ainda estava tranquilo
- Meninas, estou faminta, preciso comer algo! - disse Penny
Ela avistou uma lanchonete na frente da casa de eventos e decidiu comer alguma coisa.
As meninas ficaram conversando e bebendo com um grupo de rapazes que traziam um engradado de cervejas.
Penny entrou na lanchonete e se sentou em uma mesa, logo veio um senhor de uns 50 anos, ruivo e gordimho retirar seu pedido
-Um hamburguer e um suco de laranja, por favor!
O senhor assentiu com um sorriso e logo uma senhora da mesma idade veio lhe servir:
- Você vai ao show ali na frente? A senhora perguntou
- Sim - disse a garota mordendo o sanduíche
- Então se alimente bem! - disse a senhora com uma voz doce e maternal - esses shows acabam tarde e...
- Ahhhhhhhhhhh
A conversa foi interromida pelo grito de dor do senhor ruivo que enrolava um pano de prato em sua mão direita.
-O que houve, meu amor? - perguntou a senhora
- A máquina de café desregulou aqui e eu me queimei.
Penny se aproximou curiosa, a máquina em questão era exatamente igual a máquina de café da mercearia do Sr. Leping.
- oitocentos dólares numa máquina que nem consigo mexer direito! - esbravejava o senhor
- Eu posso ajudar, disse Penny ao casal - No meu trabalho temos uma dessas
Penny então pediu ao casal uma caixa de ferramentas, abriu a frente da máquina
- Estão vendo? Essa alavanca aqui deve ficar no meio, e essa saída de água aqui deve ficar mais inclinada. - Penny fechou a máquina - tente agora.
A máquina parecia que tinha sido trocada, estava trabalhando perfeitamente e sem barulhos
-Querida! Nem sei como te agradecer, meu nome é Ellen e esse velho turrão é meu marido Bob!
-Quer um emprego aqui menina gênio? Estamos contratando -disse Bob ainda com cara de dor pela queimadura superficial
-Seria um prazer, mas sou de Utah!
- É uma pena! Gostei muito de você - disse Ellen- o lanche é por conta da casa!
- Penny agradeceu e terminou seu lanche.
Ao voltar para a porta do Master Hall já haviam algumas pessoas na fila e as meninas estavam abraçadas aos caras da cerveja acenando para ela
- Meninos - disse Mariska visivelmente alegre - essa é Penny, Penny esses são... os... Meninos !
Penny riu e os cumprimentou
- Cerveja, gatinha? - um deles ofereceu
Penny aceitou, nunca antes bebera nada alcoólico, mas quando a garrafa de Budweiser tocou sua boca e ela provou do líquido fermentado logo se arrependera
- Isso tem um gosto horrível - Disse fazendo careta
Todos riram, nunca tinham visto alguém que nunca havia provado cerveja antes
-Acho que todos passamos por isso- disse um dos meninos passando o braço pelo ombro de Penny que segurava a garrafa - mas até o fim da noite você muda de idéia.
Penny sorriu e tentou novamente beber a cerveja e não é que o cara tinha razão? O líquido parecia menos ruim a cada gole, porém ainda longe de ser considerado bom.
Já era meia noite e as portas do Master Hall se abriram e todos entraram, Penny e a turma conseguiram lugares ótimos graças aos meninos que tinham amizade com os seguranças e Penny nunca se esqueceria daquele momento onde ela viu Lennie na sua frente cantando todos os sucessos que ela amava desde os seus 14 anos.

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