Capítulo 18: Caravanas e viagens

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Quando acontece uma grande situação na vida das pessoas, sua mente se afina, como se cada problema fosse retirando um pouco de uma malha que é o pensamento. Quanto mais problemas se acumulam, mais fino se torna esse tecido, até acabar por rasgar.

Por isso, quando ocorrem muitas situações, é comum deixarmos de ver o que é importante. Deste modo, Joah, que inalava a fuligem da queimada dos corpos de seus colegas de trabalho, já estava com esse tecido de mente tão fino, que não conseguia perceber a ausência de alguém tão importante em sua vida.

Sua cabeça estava preenchida pelo horror das mortes que ele tinha que testemunhar.

O terra rodou em seu próprio eixo por 4 vezes, até que as cremações coletivas acabassem. E por isso, somente quando a chuva de fuligem finalmente cessou, e os pulmões pararam de arder, ele foi para seu quarto.

A visão do céu cinza, era cópia dos sentimentos das pessoas que sobreviveram àquela epidemia. Como surgiu, e por onde começou, ninguém sabia dizer ao certo. Apenas sentiam em suas famílias, as perdas que para sempre ficariam marcadas.

As imagens de sofrimentos, e os gritos de agonia, se repetiam na mente de Joah como flashes, aparecendo contra sua vontade. Diversas foram as pessoas queimadas vivas, pelo fato de estarem contaminadas. Seus gritos e pedidos de socorro, ficaram em sua memória tocando feito um disco riscado.

Ele estava sem comer a 4 dias, e a primeira refeição que fez, não tinha gosto algum.

Colheradas da sopa que lhe fora servida em seu quarto, entravam em sua boca, mas ele nada sentia. Nem sabia se tinha fome, e comia pelo simples hábito de comer. Depois de terminado o prato, deixou-se cair na cama, esperando o sono vir, o que demorou algumas horas.

Virou-se na cama de um lado para o outro em uma agonia sem fim. Tinha cansaço, mas não conseguia desligar seu pensamento acelerado que o forçava a ver as atrocidade que havia cometido. Os lençóis apenas se amassaram mais e mais pelo seu esforço inútil em tentar pregar os olhos.

E quando estava sentindo a sonolência invadir sua mente, vencendo-o no cansaço, ouviu alguém bater em sua porta.

As batidas foram rápidas, indicando que quem batia estava com pressa. O jovem achou estranho que alguém viesse naquele horário aos seus aposentos, pois era madrugada, e Perseu deveria estar dormindo. Foi então que ele se lembrou de Aurora, e olhou para a cama em que ela dormia.

Estava intocada, com os lençóis arrumados.

Sentiu uma pontada no peito, era sua intuição lhe dizendo que algo estava errado, e por isso, se lançou à porta e a abriu com força, escancarando a mesma de uma vez só. Porém, não encontrou quem esperava.

Não era Aurora.

À sua frente estava um homem com mais de 1,80, de meia idade. Tinha o físico forte, demarcando seu porte mesmo sob as roupas reais cheias de adornos. Sua pele era morena, porém agora estava pálida pelo aparente cansaço. Seus olhos tinham algo de penetrante, que os tornavam impossíveis de encarar por muito tempo. As pupilas vermelhas brilhavam no escuro como as de um animal selvagem.

Além disso, não possuía um braço.

Joah, assim que o viu, se prostrou, abaixando-se até que sua testa encostasse no chão, e depois esperou em silêncio.

— Levante-se. — Falou o homem com sua voz grave.

— A que devo a honra de sua presença, Vossa Senhoria? — Perguntou sem olhar diretamente para ele enquanto levantava.

— Estou à procura do príncipe Perseu... sei que você tem trabalhado próximo a ele nos últimos tempos, e não estou conseguindo encontrá-lo.

— Perseu? Ele não está nos aposentos dele?

A princesa e o Dragão: O retorno - Segundo LivroOnde histórias criam vida. Descubra agora