Seu estômago doía, seus olhos ardiam e a dor de cabeça insuportável que sentiu mais cedo já tinha voltado com tudo. Foi só ali que realmente percebeu o quão esgotada estava. Seu corpo pedia ajuda depois de horas sem dormir ou comer, apenas se suprindo com o café expresso oferecido pela Saeco Lirika da sala de espera do hospital.Seu filho internado, seu relacionamento se resumindo a puro caos nos últimos dias, ainda tinham os casos pendentes amontoados em sua mesa de cabeceira que ela mesmo ficou de estudar na noite passada, para no mínimo ter uma direção e começar a agir no dia seguinte assim que chegasse no trabalho. O que achou que seria possível.
Tudo era uma completa confusão.
– A delegacia...– ela pensou alto. Mordendo o lábio inferior e fechando os olhos, lembrou que havia saído tão às pressas de São Paulo quem nem sequer avisou seu superior. Na verdade, não tinha avisado à ninguém.
Interrompendo a sua quarta caminhada da madrugada até a máquina de café, ela tirou o celular do bolso e verificou a hora.
03:10
Ela piscou os olhos, os esfregando em seguida e abriu o aplicativo de mensagem. Seus dedos rolaram pela tela até encontrar o nome de Manhães.
Com um suspiro aliviado, ela agradeceu aos céus pelo senhor coincidentemente estar online.
– "Giovanna?..." – ouviu o mais velho indagar ao atender a ligação. – "Está tudo bem?"
Ela riu sem mostrar os dentes, voltando a andar pelo corredor frio do lugar.
– "Sim, estou bem... o que faz uma hora dessas acordado?"
– "Querida, conhece bem esse velho. Sabe que adoro ler uns arquivos antigos com uma boa xícara de chá na madrugada... " – sabia sim. Afinal, ela fazia o mesmo quando sua insônia perturbadora atacava. – "E fico feliz que esteja tudo bem... bom, não quero ser rude mas então por que ligou? Digo, não é comum. Algo aconteceu, não foi?"
– "Sim... preciso muito falar com você." – ela respirou profundamente. – "Tive que vir ao Rio de Janeiro de última hora. Meu filho precisou ser internado às pressas aqui..."– Ouvindo um Manhães alvoroçado perguntando o que havia acontecido, ela explicou toda a situação.
Manhães era mais que seu mentor, era como um pai. A acolheu com todo carinho quando se deslocou para São Paulo querendo refazer sua vida. Ele a abraçou, abriu espaço em sua delegacia para ela voltar aos trilhos, puxou suas orelhas quando necessário, a aconselhou como ninguém mais poderia fazer e lhe empurrou oportunidades que foram incríveis para seu crescimento pessoal e profissional. Ele acreditou nela. Era uma das poucas pessoas que reconheceram sua capacidade e a encorajavam de se levantar depois de um momento tão difícil, sua gratidão à ele era sem fim.
– "Eu não ficaria tranquila sem ao menos vê-lo e decidi vir o mais rápido possível."
– "E fez muito bem, menina." – ele concordou prontamente. – "Eu entendo perfeitamente. Fique o tempo que for necessário aí, está bem? Não se apresse. Eu e Luís vamos segurar as pontas para você."
– "Obrigada, Manhães. Te devo mais uma..." – ela sorriu com carinho.
– "Aproveite esse tempo no Rio para pensar melhor sobre a minha proposta, sim?"
– "Manhães..." – seu pescoço se movimentou em negação e um suspiro longo saiu por seus lábios. – "Por favor, já disse que não estou pronta."

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Us Again
FanfictionToda separação é triste. Ela guarda memória de tempos felizes (ou de tempos que poderiam ter sido felizes...) e nela mora a saudade. - Rubem Alves