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Tenho medo de virar a maçaneta da porta de casa. Já faz uns dois minutos que eu estou com a mão nela e vontade de entrar ainda não veio.
Talvez eu deva mesmo sair do armário agora. Eu mereço isso, o Eduardo merece isso, a sanidade dos dois suplica por isso.
O que poderia acontecer? Eles me mandarem pra rua, ou me espancarem. Bobagem. Minha mãe talvez...
Posso fazer isso hoje, não, amanhã. Não sei. Minha cabeça está a mil e um por causa do Eduardo. Eu gosto mesmo dele, ele gosta muito de mim e que nos empede é... eu.
Vou entrar.

Entro.

Levo um susto.

Minha mãe sentada na poltrona bege que foi da minha avó. Ela me encara. De repente eu estou em um filme, em que o personagem é pego no flagra. Ela continua me encarando e eu sustento o seu olhar.

- Tenho que falar uma coisa.
- Pode falar, mas antes eu quero saber pra onde você foi. Liguei pra casa da Helena perguntando por você e ela disse que fazia tempo que você saiu de lá.
- Mãe, eu... eu sou... gay.
- O que... você não está falando sério está?

Olho para os meus tênis, uma sensação horrível varre minha barriga, meus olhos ardem.

- É a verdade. Eu sou. E eu estava na casa do meu... namorado, digo ex-namorado.

Solto tudo de uma vez, tenho medo que minha garganta feche e eu não faça nada além de chorar.
Ela levanta, calça o chinelo velho, não fala nada e sobe pro seu quarto, ela nem se quer solta uma lágrima, ou então corre e me dar um abraço e me diz que ta tudo bem e que ainda me ama. Não, não faz nada disso.

Ela para no meio da escada me olha indiferente.
- Em toda minha vida, você foi a minha maior decepção. Amanhã nós resolvemos esse seu problema.

Ela continua andando, e quando ela some de vista, desabo no chão e choro copiosamente. Fico em posição fetal soluçando e só vou para a cama quando o chão em que eu estou com a cabeça apoiada está encharcado.

***
- Filho?
Meu pai está sentado na minha cama, me observando, não sei à quanto tempo. Ele tem uma expressão serena. Eu errei em contar pra minha mãe primeiro, isso é claro, se ele fosse o primeiro a saber com certeza me ajudaria a acalmar o leão.

- Ela te contou?
- Sim.
Ele mantém o olhar sereno enquanto afaga meus cabelos. Meus olhos já estão molhados.
- Ela nunca vai me perdoar... não é minha culpa.
- Filho, por que você está chorando? Não tem porque se preocupar e nem se sentir culpado. Olha, eu te amo e sua mãe também, ela só está confusa, sabe como ela é. Logo logo ela vai voltar ao normal. Vai ficar tudo bem, eu prometo.

É difícil de acreditar no meu pai, as coisas estão indo de mal a pior. A única coisa que me deixa um pouco alegre agora é perceber que meu pai aceitou tudo numa boa. Ele e minha mãe são dois extremos, não compartilham de semelhança alguma. Como duas pessoas tão diferentes podem estar casadas?

- Ela também me contou que você está namorando, é verdade?
Fico rubro com a pergunta inesperada, não é normal falar esse tipo de coisa com meu pai nem quando ele pensava que eu gostava de meninas, ainda mais nessa situação.
- Bem, nunca foi um namoro na verdade, e a gente brigou feio ontem, não vai mais rolar.
- É o Eduardo?
- É, é ele sim. Ele tava forçando a barra pra que eu me assumisse pra vocês, e eu disse que não poderia, então ele simplesmente disse que não queria mais me ver. Acabou.
- Mais você já não fez isso? O que te impede de ir lá? Os pais dele sabem dele?
- Sabem. Mas eu não sei se eu devo, ele tava muito puto comigo.

Minha mãe aparece na porta o que me faz gelar, o que eu penso é que em qualquer hora ela vai me mandar embora ou coisa do tipo. Sua expressão não é muito diferente da noite anterior, a única diferença são a presença de algumas olheiras.

Crônicas de um orgasmoOnde histórias criam vida. Descubra agora