Capítulo 6

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Acordo e avisto a cama de Chloe vazia. Ainda são sete da manhã, em uma manhã fria de sábado. Chloe costuma dormir até tarde, por isso acho estranho ver sua cama vazia, tão cedo. Depois de sua alta do ambulatório, nós não nos falamos. Ela simplesmente sumiu, e só voltou tarde da noite para o quarto. Pensei ser melhor deixá-la quieta, considerando que sua família estivesse enfrentando algum problema. Agora me arrependo por não conversar com ela.

O clima me pega de surpresa. Ainda não estamos no inverno, mas neva lá fora. A meteorologia anda uma bagunça, não sabendo ao certo a razão do frio repentino. Brinco em minha mente que a culpa é minha.

George não retorna as minhas ligações. Concluo que esteja chateado, e, no fundo, é melhor assim. Não tenho e nunca tive intenção em alimentar sentimentos românticos, e sempre deixei claro que não estava interessada em relacionamentos no meu primeiro ano de faculdade. Eu não estou preparada para isso.

Sozinha no quarto, resolvo dar uma volta. Sinto-me sufocada, querendo gritar. De repente, tudo virou uma bagunça. Tudo mudou. Isso me deixa irritada, confusa. Procuro por George, pois me sinto na obrigação de me explicar, mesmo sabendo que a nossa amizade não será mais a mesma.

— Ele não está no quarto. Saiu bem cedo. — O seu colega de quarto. Mike, conta.

— Saiu cedo?

— Isso.

— Você sabe para onde ele foi? Ele comentou alguma coisa?

— Ele não é muito de conversar, não somos próximos, entende?

— Entendo.

Agradeço-o e me despeço. Fico me perguntando onde George pode estar em uma manhã fria de sábado. Ele costuma ir para a biblioteca pegar livros, ou vai à cafeteria de sempre. Decido procurá-lo na biblioteca primeiro.

Como eu imaginava, a biblioteca está praticamente vazia. Depois de muito procurá-lo, George não está em lugar nenhum, e ninguém sabe onde ele está. Vou à cafeteria e ao restaurante, ele não está em nenhum desses lugares também. Começo a me sentir sozinha, e percebo quão acostumada estava com a presença dele.

Caminhando pelas ruas cobertas de uma camada fina de neve, em passos lentos e pensativos, me deixo levar pelos meus pensamentos confusos, tentando pensar em um lugar onde George possa estar. Deparo-me com alguém parado no outro lado da rua, com o rosto coberto pelo capuz. Ele não me vê, está de costas, olhando para cima enquanto esquenta suas mãos nos bolsos do casaco. Parece concentrado demais para notar minha presença a alguns metros dali.

Eu me aproximo dele, que percebe e se assusta, escondendo o rosto.

— Ei... — Digo, em voz mais calma possível.

Ele simplesmente se afasta, como se estivesse com medo.

— Podemos conversar? — Pergunto.

Desvia o rosto para o outro lado e dá mais um passo para trás.

— Não se aproxime.

— Você tem medo de mim?

— Não. Você quem deveria ter, de mim.

— Por quê?

Não responde.

Ele atravessa a rua apressado, como se estivesse fugindo.

Que cara estranho!

Decido segui-lo. Vou pelo mesmo caminho, escondendo-me em tudo o lugar possível. Ele não desconfia.

Eu me encontro diante de uma casa velha e decadente, cujas paredes de tijolos foram corroídas pelo tempo e pela negligência. Uma sensação de inquietação percorre meu corpo enquanto observo a figura misteriosa desaparecer através da porta de madeira rangente. Movida por uma curiosidade insaciável, decido seguir os passos dele, ignorando qualquer aviso interior que me pede para recuar.

A cada passo que dou, o ar ao meu redor se torna mais denso e carregado de um silêncio perturbador. O interior da casa é mergulhado em trevas, apenas um feixe tênue de luz solar filtrando-se pelas janelas empoeiradas. O cheiro de mofo e abandono impregna minhas narinas, fazendo-me estremecer involuntariamente.

Adentro cautelosamente, meus pés afundando no tapete desbotado e desgastado pelas intempéries. Os móveis parecem remanescentes de um passado esquecido, com camadas de poeira e teias de aranha envolvendo cada superfície. Uma atmosfera de melancolia e nostalgia permeia o lugar.

Um ranger súbito me faz dar um salto, enquanto a porta se fecha atrás de mim com um estrondo inesperado. Meu coração dispara, meu corpo tenso, mas sigo em frente. É como se algo invisível me atraísse para o desconhecido, uma força que eu não consigo resistir.

Caminho por corredores escuros e labirínticos, minhas pegadas ecoando pelas paredes descascadas. As sombras dançam ao meu redor, como se a própria casa estivesse viva, observando-me com olhos invisíveis. A sensação de estar sendo observada arrepia minha espinha, mas eu não consigo voltar atrás.

Finalmente, chego em uma sala, cujos móveis esquecidos retratam uma época passada de glória. No centro, uma figura estática espera, iluminada apenas pela fraca luz que penetra por meio de uma janela quebrada. A pessoa, que tem mexido tanto com a minha curiosidade nos últimos dias, me encara.

Enquanto me aproximo, seus traços se tornam parcialmente visíveis. Um rosto pálido e enigmático, olhos profundos e penetrantes. Um sorriso fechado brinca com seus lábios enquanto ele estende a mão em minha direção. A energia do lugar é opressiva, como se estivesse sugando a minha própria.

Num momento de hesitação, as dúvidas e medos inundam minha mente. O que estou fazendo aqui? Por que me arrisquei tanto para chegar até aqui? Mas a curiosidade prevalece sobre o medo, e estendo minha mão, encontrando a dele num aperto gélido.

— Quem é você? — Pergunto, com a voz rouca.

Ele se encolhe, colocando a mão no bolso.

— Não me siga mais. — Diz. — Posso ser... perigoso para você.

— Não, você não é.

— Não venha mais atrás de mim, ou de qualquer outra pessoa que não conheça. Não ande sozinha por aí.

Antes que eu pudesse responder alguma coisa, ele se vira e sai pela porta, deixando para trás o silêncio de sempre, recusando qualquer aproximação minha. E quanto mais ele se afastava, mais eu me sentia atraída. Eu queria saber mais sobre ele. E mais eu tinha certeza de que ele não era perigoso.

Corro atrás, procurando-o pela casa, e pela janela, eu o vejo atravessando a rua. Saio da casa e vou atrás, seguindo o mesmo caminho que ele, mas o perco de vista há alguns metros da avenida principal. Ele simplesmente desaparece, como fumaça que se dissipa no ar. É como se não tivesse estado ali e fosse minha imaginação ganhando vida. 

Até você chegarOnde histórias criam vida. Descubra agora