15. Realidade interior

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☆ Capítulo 15 | O Canto das Estrelas ☆

O ensino médio chegou em um piscar de olhos. Quando se deu conta, Lucas estava apagando sua vela de quinze anos. Não mais uma criança; e sim um adolescente. No entanto, ao olhar-se no espelho, ainda podia ver seus traços infantis. Não exatamente na aparência; pois, naturalmente, o garoto estava mudando bastante. Seu interior, entretanto, mostrava-lhe ainda o menino que fora e que ainda era. Lucas sentia-se estagnado no tempo, apesar da idade dizer-lhe o contrário. O que ele mais temia estava acontecendo: seu corpo transformava-se e marchava em direção à fase adulta.

Na primeira série do ensino médio, Lucas permanecia o mesmo. Miriam não insistia mais em terapias, pois ele se recusava a ser humilhado de novo; de tentar curar algo que não havia solução. Então, Lucas passou a aceitar o seu destino — ser para sempre o garoto mudo e esquisito. Além disso, seu rosto e seu corpo tornavam-se ainda mais feios aos seus olhos. E não era só ele que achava isso. Algumas pessoas se aproximavam dele só para confirmar o que era óbvio.

Um dia, no intervalo, Lucas ficou irritado com um garoto do 9º ano que não parava de jogar a bola em sua direção. Se foi proposital ou não, a bola quase derrubou o seu suco; o que foi o suficiente para que o rapaz ficasse nervoso. Ele pegou a bola e jogou para o lado oposto, longe dos pés do garoto.

— Ei! — ele reclamou, e seu companheiro de jogo olhou feio para Lucas. — Qual é!

Lucas ignorou-o, fechando a cara. Ouviu o outro garoto dizer:

— Esse cara é o que não fala... — ele sentiu-o se aproximar. — Mano, na boa. Podia ter jogado pra cá, né? Aí, por que você não fala?

O outro garoto pegou a bola, correndo de volta para escutar a conversa. Lucas deu de ombros, fitando o chão. Aquele tipo de pergunta ainda era irritante, mas seu coração não disparava mais como antes.

— Deveria falar — ele continuou. — Nunca vai ter namorada se não falar.

O outro menino riu. Aquele era um assunto predominante da faixa etária na qual se encontravam — com os hormônios aflorando, pareciam só pensar na possibilidade de beijar meninas e desenhar objetos fálicos nas carteiras.

— Cara, que pesadelo. Nunca vai poder pegar uma mina — ele começou a fazer embaixadinhas. — E você também...hum, não é tão bonito. Sem ofensas, é claro. Seu nome é Lucas, né?

Lucas não respondeu. Apenas olhou para ele, inexpressivo, amassando a garrafinha de suco nas mãos. Era como se dissesse: Não teste minha paciência, ou eu vou furar essa bola com as minhas próprias mãos.

— Tá bom, tá bom. Bora, bro — o menino puxou o colega pela manga do uniforme. — Vamos ver se a quadra já tá liberada.

Quando os garotos se afastaram, Lucas soltou um suspiro. Não se abalou muito com aqueles comentários, o que era estranho. Talvez por ter aceitado que aquilo era uma verdade: nunca teria uma namorada; simplesmente não conseguia se imaginar em um relacionamento amoroso. Sentia-se distante de si mesmo, insensível aos acontecimentos ao redor. No entanto, aquele tipo de comentário não era facilmente esquecido.

Era um pouco assustador aceitar ofensas como uma verdade. Ele queria responder: Sou feio mesmo, eu nunca vou ter uma namorada. Agora, deixe-me tomar o meu suco em paz. Assim, Lucas criava sua própria realidade interior e o mundo só o confirmava quem ele era — ou quem ele achava que era. Era natural o rapaz se subestimar a todo momento, se sentir indigno das coisas mais banais — não merecia ganhar presentes da família, não merecia tirar uma nota boa, não merecia ter seu lanche preparado pelo padrasto, não merecia nada de bom.

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