10. Noites de verão

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☆ Capítulo 10 | O Canto das Estrelas ☆

Em um feriado de carnaval, Lucas passou a maior parte da tarde pintando na varanda da casa. Uma chuva fina caía das nuvens, aliviando o calor que havia feito nos últimos dias. Na cozinha, Ben cantarolava e fazia bolinhos de chuva; como prometera antes do almoço. Pedro e Luan estavam assistindo a um filme no quarto, mas Lucas estava desanimado demais para acompanhá-los. Então, como de costume, pegara suas tintas e foi para a varanda pintar um pouco. O padrasto, reparando o seu mau humor, levou uma travessa de bolinhos de chuva açucarados só para ele. O menino deveria estar feliz por ser feriado e poder ficar uma semana em casa, longe da escola — e passar o seu aniversário ali, distante dos colegas e dos professores, que começavam a ser um grande problema de novo. No entanto, apesar das perguntas de Ben sobre a escola, o menino não falava sobre o que estava acontecendo.

— O que está fazendo hoje, meu Van Lucas? — Benício se inclinou sobre o ombro do menino, roubando um bolinho. Lucas pintava um céu noturno, cheio de estrelas e uma Lua crescente. — Oh, que bonito! Sua bela obra de arte lembra-me Sonata ao Luar, de Beethoven.

Beethoven (o cachorro), que se tornara um gordo mocinho caramelo, latiu feliz aos pés de Lucas. Seu olhar pedia por bolinhos de chuva — como se não houvesse acabado de comer uma apetitosa vasilha de ração com patê.

— Acho que a Lua está feia — Lucas murmurou. — Está parecendo um pão de queijo amassado. Eu sou horrível nisso!

— Não é não! — Ben apertou carinhosamente os seus ombros. — Você é ótimo, Lucas. E quem disse que a Lua não parece um pão de queijo amassado de vez em quando? Às vezes, ela está amarela e, por não estar totalmente cheia, parece que foi mordida por um ser cósmico comilão... Como este gordo cão que está babando na varanda!

Lucas não riu da tentativa de piada do padrasto. Baixou o pincel, colocando-o dentro do copo cheio de água suja. Não conseguia parar de pensar no que havia acontecido na semana anterior, dias antes do feriado. As aulas haviam começado no início de fevereiro e muitas coisas haviam mudado. Afinal, ele agora estava na segunda etapa do ensino fundamental. A maioria dos professores eram novos. Os colegas de sempre haviam crescido e se tornaram ainda mais barulhentos.

Uma das professoras novas parecia ciente da mudez de Lucas — mas, mesmo assim, colocou-o em uma situação um tanto constrangedora. Um dia, pedindo para que os alunos abrissem a apostila de Português, parou diante de Lucas e ordenou:

— Você, comece a leitura deste parágrafo.

Pêgo de surpresa, o coração do menino começou a disparar de imediato. Paralisado, de cabeça baixa, Lucas observou o longo trecho que a professora mandou ler diante de toda a turma. Desejou que seus cabelos, já muito longos, cobrissem todo o seu rosto.

Todos olhavam para ele. Após alguns segundos de um torturante silêncio, uma das meninas disse:

— Ele não fala, professora Vânia.

Lucas viu quando a mulher levou o dedo em riste à boca, pedindo silêncio. Seus olhos diziam: Não se intrometa. A professora não agiu por ignorância. Ela sabia que o aluno não falava. Antes de ser sua professora, Lucas já a reconhecia pelos corredores do colégio; e era famosa por ser brava e fazer provas difíceis. O menino provavelmente era alvo de muitos debates nas salas dos professores; portanto, todos da escola — com exceção dos funcionários novos — sabiam sobre ele. Então, aquela professora já sabia que ele não falava e provavelmente estava louca para que ele fosse o seu aluno, forçando-o a ler alguma coisa. Afinal, Lucas tinha quase 11 anos. A adolescência se aproximava. Como dizia Alberto, ele tinha que parar com aquela bobagem de não querer falar.

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