Ao anoitecer, as gêmeas chegaram. A casa estava completa, papai pediu pizza e jantamos juntas. Por causa das viagens, todas dormiram cedo, as coisas começariam a funcionar no dia seguinte, tinha certeza disso. Eu também precisava descansar, depois de um banho relaxante, me enrolei nos lençóis e peguei no sono.
Abri meus olhos em um local estranho e muito escuro, uma luz forte emanava de uma torre gigantesca. De alguma forma eu sabia que era a luz da lua propagada ali e as pessoas tinham um brilho violeta nos olhos, que lembrava muito os olhos de meu pai. Me sentia bem ali, como se pertencesse aquele lugar, mas senti um poder estranho invadir minhas veias, era demais, me sufocava! Acordei engolindo o ar com força, em desespero me levantei e abri a janela, inalando profundamente o ar da noite. As árvores do bosque que cobriam os fundos da casa, balançavam com o vento frio, a lua brilhava sem nuvens no céu e senti alívio ao olhar para ela.
Esses sonhos sinistros estavam se tornando frequentes. Que lugar era aquele? Não lembrava de tê-lo visto antes. O que estava acontecendo?
Deixei a janela aberta e voltei para cama, não conseguia dormir e encarar o teto era minha única opção. Reflexos roxos dançavam no teto, como se vindos de uma dimensão estranha, fechei os olhos e sacudi a cabeça, e aliviada vi que tudo voltou ao normal. Acabaria louca se aqueles sonhos continuassem.
******
O telefone tocou pela manhã, mamãe queria notícias nossas, já que esqueci de ligar quando chegamos. Ao desligar, olhei para o relógio, dez da manhã. Droga! Combinei de almoçar com Charlie e Iro e teria pouco tempo para me organizar.
Tomei um banho frio e vesti a primeira roupa que encontrei, desci as escadas e percebi que a casa uma bagunça, mas bem alegre. Podia ouvir minhas irmãs conversando em todos lugares e era estranhamente reconfortante, sentiria falta delas quando o ano acabasse, encontrei papai na cozinha lutando com as panelas para preparar o almoço para o seu batalhão, lhe dei um beijo e me encostei a bancada.
– Achei que não sairiada cama! – brincou ao beijar minha testa. – Sabe o que mais me estressa quando ficam com sua mãe é isso, deixar que fiquem acordadas até tarde, é uma dificuldade voltar ao seu horário normal.
– Estava cansada, papai, por isso perdi a hora. Se importa? Combinei de almoçar com Charlie e Iro.
– Claro que não! – ele sorriu, correndo para uma panela que começava a soltar fumaça. – Ainda vou ter nove para dar conta.
– Cuidado para não se queimar. Volto logo!
Ele não prestou atenção em mim, e sai antes que minhas irmãs quisessem me acompanhar. Tinha tempo e decidi caminhar para o encontro, gostava de sair assim às vezes. Colocava os fones de ouvido e seguia pela rua, era um passeio normal, no qual sempre cumprimentava os vizinhos, indo ou voltando, mas estranhamente para um dia de verão, a rua estava deserta e com um ar gélido. Talvez fosse uma tempestade se aproximando, mas o céu estava tão limpo que não existia tal possibilidade.
Todo o caminho estava pouco movimentado, devia ser pelo fim de semana, mas levando em conta que logo se iniciaria o ano letivo, tudo parecia calmo demais até o centro de Fontana. Cheguei à lanchonete pouco antes do horário marcado e vi pelo vidro, meus dois melhores amigos. Sempre que os via tão próximos, lembrava da viagem de verão do ano anterior. Foi um grande espanto saber que se pegaram no acampamento em que estiveram. Não teriam feito isso de novo, certo? Eu preferia acreditar que não.
– Voltei! – dei o grito assim que passei pela porta.
– Que bom te ver! – Charlie se levantou, pulando no meu pescoço para me abraçar.
– Charlie, meu pescoço, preciso dele inteiro. – ela se sentou de novo, me puxando para sentar ao seu lado.
– Como foi a viagem, não pensou em passar mais tempo com sua mãe? – Iro ironizou como sempre fazia quando eu voltava de lá.
– Não! Sabe que não posso deixar vocês dois sozinhos, sempre que faço isso, aprontam.
Iro sabia bem do que ela estava falando e Charlie sufocou o riso ao ver como ele ficava vermelho com a constatação.
– Ah! Pelo amor de Deus. Não estão animados para o nosso último ano? – Charlie pulou na cadeira, fazendo seus cabelos rosas voarem. – Vou mudar a cor do cabelo para o primeiro dia. O que acham?
– Não seria você se não o fizesse, não é mesmo? – apertei sua bochecha e ela me deu língua. – Vamos pedir logo, preciso voltar para casa cedo.
– É sério que todas as suas irmãs vão passar o ano aqui? – eu assenti para meu amigo. – O que aconteceu?
– Liliana vai trabalhar em outro país por um ano e a opção foi deixar as gêmeas com o papai, já Misty, Zora e Gwen foi algo a ver com a saúde da Siena, não sei bem.
– Não consigo nem imaginar uma casa com tantas mulheres. – ele tremeu. – Seu pai vai surtar!
Charlie e eu rimos. Realmente era assustador imaginar dez mulheres em uma mesma casa, mas esse era o sonho de papai. Ter todas as filhas sob seus cuidados por um tempo, então, para ele, estava tudo bem ficar com todas em casa.
No fim da tarde, caminhei até o ponto de ônibus, depois de deixar Charlie em casa, se fosse caminhando para casa, chegaria à noite e sei o quanto papai odiava que chegássemos tarde. O mais estranho foram as mais de dez chamadas dele para mim ao longo da tarde, tentei retornar, mas a chamada não completava, nem para ele, nem para minhas irmãs, sabia que a rede não pegava muito bem lá em casa, mas isso me deixou um pouco preocupada.
Fiquei sentada por uns vinte minutos esperando o ônibus, mesmo com o fone, prestava atenção na rua e via o movimento e foi então que o vi. Um rapaz mais alto que Iro e de pele clara, estava do outro lado da rua, seus olhos eram uma mistura de violeta e os cabelos negros e lisos. Usava um conjunto negro que deixavam à mostra algumas partes de uma tatuagem que parecia tomar grande parte de seu corpo. Ele não me viu, ou melhor, não prestou atenção em mim, estava com um grupo de mais cinco pessoas, andavam pela rua como se procurassem por algo. Não conseguia desviar, um deles olhou para trás em minha direção e senti meu coração congelar no peito, como se algo me dissesse que os veria de perto logo e não seria bom.
O ônibus chegou e subi correndo, sentei a janela na esperança de vê-los ao longo da rua, mas perdi meu tempo, desapareceram. Um senso de urgência tomou conta de mim, nunca em minha vida quis tanto chegar em casa. Quando o ônibus parou no ponto, saltei e sai correndo, parecia que ver aquelas pessoas me deixou tensa, encontrei Brida e Lia no caminho.
– Benna, espere! – Lia gritou.
– Vocês estão bem? – eu olhava para trás com medo de ver aquelas figuras sinistras novamente.
– Porque não estaríamos? Já basta papai com aquela paranoia. – Brida sorriu o que significava que eu só podia estar ficando louca, se ela não sentiu nada, provavelmente não havia nada.
Respirei fundo para me acalmar. Me impressionei com aqueles homens e devia parar de ver filmes de gangues e de terror, era nisso que dava acompanhar esse tipo de filme. Peguei as gêmeas pela mão e caminhei para casa com elas, chegaríamos lá e tudo estaria bem; papai estaria na cozinha preparando o jantar, Freda estaria no computador enquanto as outras estariam pela casa fazendo suas atividades. Uma das cenas eu acertei, Freda estava no computador, mas meu pai não estava na cozinha, ela me olhou com um ar preocupado, alguma coisa errada estava acontecendo, subi as escadas e encontrei meu pai arrumando as roupas de Brida e Lia em uma mala discreta.
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Lullaby - for Benna
Teen FictionBenna é filha de Sevio com quem vive em uma pequena cidade, sua vida é relativamente perfeita até descobrir que seu pai não é humano e que ela herdou suas características, obrigada a lidar com o povo dele e com um treinamento que não deseja, vê sua...