"JÁ PASSOU, MAS AINDA DÓI"

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Segundo dia sem o Malcon, até então nenhum incêndio havia sido relatado. Sophie voltava da sua terceira expedição até um restaurante, visto que a comida de Cecília continuava intragável. E por falar na loira, a sua voz e a do Sr. George podiam ser ouvidas enquanto Sophie seguia pelos corredores,  carregando os salgados para o café da tarde.

— Desembucha chefinho, por que da tristeza? — Cecília perguntou.

— Não estou triste, estou ocupado e nervoso. Tenho que cuidar das minhas terras e das do meu irmão. Estou exausto.

— E esse estresse também diz respeito a uma certa  Peres? — a moça perguntou.

— C-como você sabe disso? — George perguntou, constrangido e em choque.

— Você nunca foi bom em esconder seus sentimentos de mim.

— Em outras palavras, você é uma fofoqueira nata. — George zombou.

— Bem, eu tenho de ir levar a Sophie para dar uma volta depois das lições de qualquer forma, e ocasionalmente poderia acabar passando pela casa Peres...

— Nem pense nisso! Além do mais, acho melhor deixar a educação de Sophie nas mãos de Ofélia. — George respondeu.

— Eu sei cuidar de crianças! — Cecília protestou.

— A questão não é essa. A Sophie pode ser um tipo de criança diferente, que precisa de cuidados especiais.

— Que tipo de cuidados especiais? — a moça perguntou, confusa.

— Ofélia, bem... ela credita....acredita — George lutava para dizer aquilo em voz alta. — que ela possa ter algum nível de deficiência intelectual.

— O que? Mas ela é tão....Oh, pobrezinha.

— Não adianta se lamentar. Eu e Ofélia estamos tentando buscar a melhor forma de lidar com isso tudo, embora eu não saiba se isso pode continuar....

— Como assim? — Cecília perguntou, confusa.

— Se o que Camilly disse é verdade...Bem, talvez Ofélia tenha certas ideais sobre eu e a Srta. Peres.

— Pois resolvam isso, a Sophie precisa de ajuda!

Aquela preocupação de seus amigos apertava o coração de Sophie, não de uma forma boa, definitivamente não de uma forma boa. Era como se ela sugasse todo o ar do mundo, mas ainda assim não conseguisse respirar, apenas privando os outros de conseguirem. Era isso o que sentia, que era uma egoísta, uma parasita, alguém que estava exigindo cuidados ao invés de cumprir com suas obrigações. Ela tinha obrigações, e deveres, deveres que havia abandonado para ir trabalhar com o Sr. George e que ela não estava honrando.

Sophie se afastou da cena, temendo ser vista e gerar ainda mais aflito. Enquanto pensava sobre como estava atrapalhando mais do que ajudando, a lembrança de sua principal obrigação, a qual havia deixado para trás ao se mudar para Santa Marianna invadia sua mente. Desde que soube que viriam para o Rio ela tentou se conter para não tomar uma decisão idiota, mas agora mais do que nunca sentia vontade de retornar e cuidar da pessoa que mais precisava dela.
Já havia juntado um pouco de dinheiro e estava na hora de voltar para suas obrigações.

A criança largou a sacola com os petiscos encima de uma mesa e se pôs a caminhar até a pousada onde estava ficando com Cecília. Não queria gastar com um trem, então teria de partir o quanto antes, assim evitaria ficar nas ruas a noite.

[....]

Sophie decidiu não focar muito nas coisas ao seu redor, para se manter focada em seu objetivo. Mas era difícil não notar as grandes mansões sendo trocadas por casinhas aconchegantes, depois por bairros industriais e por fim vielas tortas.

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